sábado, 7 de fevereiro de 2015

Ministra diz que custa ver "pai fundador" do PS dizer a um juiz que "se cuide" / ENTREVISTA Jornal I EM BAIXO: Paula Teixeira da Cruz. “Temo o controlo político da investigação criminal pelo PS”

Ministra diz que custa ver "pai fundador" do PS dizer a um juiz que "se cuide"
PÚBLICO 07/02/2015 -
Ministra referiu-se às declarações de Mário Soares para explicar por que teme pela separação de poderes se o PS ganhar as eleições.

Numa entrevista ao diário i, publicada neste sábado, a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, comenta as declarações de Mário Soares a propósito do caso José Sócrates afirmando que lhe “custa” ver “o pai fundador [do PS] dizer a um juiz que tenha cuidado” e que teme "pela separação de poderes", "se o PS ganhar as eleições”.

“Quando se permite fazer aquilo a que vou chamar, a benefício de muita contenção, um aviso a um juiz, quando se fala na polícia única, na junção de ministérios, é óbvio que temo, porque essas declarações revelam que não se interiorizou a separação de poderes”, diz Paula Teixeira da Cruz, na entrevista.

A posição da ministra a propósito do artigo de opinião de Soares no Diário de Notícias já tinha sido divulgada pelo jornal i antes da publicação da entrevista na íntegra, o que levou a ministra a explicar-se, em declarações aos jornalistas, nesta sexta-feira, de forma menos contida.

No artigo, Soares referiu-se à prisão preventiva aplicada a José Sócrates e questionou os motivos da detenção do ex-primeiro-ministro, criticando as decisões do juiz de instrução criminal e escrevendo: “O juiz Carlos Alexandre que se cuide”. No final de um debate na Assembleia da República, nesta sexta-feira, a ministra comentou o artigo afirmando ter assistido “a declarações do fundador do Partido Socialista condicionando claramente o magistrado” Carlos Alexandre. E acrescentou: “Com várias declarações que todos temos ouvido de vários responsáveis do Partido Socialista sobre concretos casos, eu penso que é de facto de recear uma limitação da separação de poderes”.

No mesmo dia, o deputado do PS Jorge Lacão lamentou as afirmações da ministra, que, disse, “tem obrigação de saber que o PS é um partido estruturante da ordem constitucional portuguesa, que corresponde a um Estado de Direito democrático”. “O doutor Mário Soares não faz hoje nem faz há muitos anos parte dos órgãos dirigentes do PS, portanto, as afirmações do doutor Mário Soares comprometem o doutor Mário Soares”, disse.

Na quarta-feira passada, também a associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) comentou as declarações do ex-Presidente da República sobre o juiz Carlos Alexandre, considerando que se tratou de uma “ameaça” ao magistrado que ordenou a prisão preventiva de José Sócrates. “Os juízes portugueses não podem silenciar a ameaça hoje [terça-feira] proferida ao juiz Carlos Alexandre”, escreveu a direcção da associação, num comunicado. Questionado pelo PÚBLICO, o presidente da ASJP, Mouraz Lopes, disse que, “como é lógico e evidente lendo a lei”, as declarações de Soares poderão eventualmente configurar um crime de coacção sobre um titular de um órgão de soberania.

Paula Teixeira da Cruz. “Temo o controlo político da investigação criminal pelo PS”
Por Luís Rosa e Pedro Rainho
publicado em 7 Fev 2015 - in (Jornal) i online

O “aviso” de Mário Soares ao juiz Carlos Alexandre e as ideias do PS para a justiça inquietam a ministra

Paula Teixeira da Cruz recebeu o i na passada quarta-feira para falar sobre os desafios que os atentados de Paris trouxeram à Europa e a Portugal, da justiça à política. A ministra defende “um combate sem tréguas” aos autores de actos de terrorismo, mas sem nunca perder de vista a garantia dos direitos fundamentais. Em ano de eleições, a corrida às legislativas não ficou fora da conversa, mas foi o processo Sócrates a merecer as críticas mais duras ao PS.

Passaram 30 dias sobre o atentado contra o “Charlie Hebdo”. O que mudou na Europa?

Não temos ainda um quadro muito substantivo de alterações. Mas há alguns sinais a que temos de estar muito atentos. Simbolizaria aquilo que aconteceu numa pessoa. É muçulmano, estava ilegalizado [em França] e salvou um conjunto de pessoas no supermercado judaico de Paris que também foi atacado. Quando olhamos para o fenómeno do terrorismo e para a demanda da Europa por parte de alguns povos, como também já demandámos outros, temos de fazê-lo de uma forma muito cuidadosa e não ser precipitados.

Precipitados em quê?

Não corrermos para uma lógica de securitarismo. Assistimos a um empobrecimento da Europa e à ausência de uma lógica de integração. É preciso fazer primeiro a radiografia da Europa que temos para depois irmos às soluções. O combate ao terrorismo não deve merecer tréguas num quadro de direitos, liberdades e garantias – e não de securitarismo.

Rejeita restrições de circulação no Espaço Schengen? Não podemos ceder na nossa liberdade para combater o terrorismo?

É exactamente isso. Se cedermos na nossa liberdade, estaremos a fazer aquilo que pretendem. Uma sociedade com medo é uma sociedade prestes a ser aprisionada. É isso que devemos evitar. Não quer dizer que não se seja temerário. Mas quando se tem medo de alguma coisa já se perdeu metade da força.

Os atentados de Madrid foram há quase 11 anos. A Europa não perdeu demasiado tempo a fazer a sua radiografia?

Não penso que tenhamos perdido muito tempo porque houve decisões da União Europeia. Precisam de ser revisitadas mas não diria que precisam de ser profundamente alteradas. Temos de nos preparar para um combate sem cedências à nossa bandeira dos direitos humanos, liberdades e garantias. Não é apostar numa lógica securitária que leve a julgamentos sem defesa ou a prisões que não sejam antecedidas do exercício de direitos, liberdades e garantias como resultado do Patriot Act.

Que soluções podemos adoptar para combater este fenómeno?

O ensino de um conjunto de valores, que começa na própria educação, a prevenção de situações de exclusão e, por outro lado, voltar a hastear bandeiras de valores que temos como adquiridos mas que não estão, seria muito importante. Além de soluções militares que, na minha óptica, se impõem em absoluto.

Em Portugal, os serviços de informação não podem fazer escutas. Defende essa solução?

Não sou adepta da proliferação de escutas. Por ora não parece justificar-se. Embora, num quadro democrático, e pendendo de uma autorização jurisdicional, num agudizar de cenário não me repudiaria veementemente.

Devem ser agravadas as penas para actividades terroristas?

Aí estou de acordo. Do alargamento da tipificação daquilo que são actos terroristas à criminalização de actos que hoje não são considerados terroristas, mas que são preparatórios. Contactos, ida a sites que promovem a difusão do jihadismo, viagens, propaganda, apologia, tudo isso deve estar claramente enquadrado criminalmente e sem margem para uma dúvida.

Em Espanha foi aprovada a prisão perpétua reversível. Devemos equacionar esse cenário?

Não, não. Pode parecer muito aliciante, mas não tenho essa opinião. Pense num rapaz ou numa rapariga de 17 anos que aderiu à jihad islâmica e que cometeu um conjunto de actos. Essa é a solução? Penso que não.

Portugal está preparado para evitar situações graves?

Portugal está tão preparado quanto é possível estar para o terrorismo. O terrorismo é um crime profundamente cobarde. Sendo um crime cobarde e traiçoeiro, objectivamente há uma desigualdade de armas. Tudo temos feito e temo-nos preparado para essa luta.

Não há garantias de que estamos seguros?

Contra um acto de terrorismo, isso seria absolutamente inconsciente. Ninguém pode garantir em lado nenhum do mundo que não se possa cometer um acto terrorista. O que se pode garantir é que a prevenção esta lá e que a investigação está lá.

Os tribunais estão preparados para os métodos pró-activos de investigação que estes crimes podem exigir?

Estamos todos despertos para este fenómeno, o que não quer dizer que não possa ocorrer um erro ou outro. Mas, em termos gerais, é evidente que, tanto quanto é possível, estamos preparados.

As escutas telefónicas podiam ter aqui um papel importante?

E têm, dentro de um quadro de legalidade. A mim não me preocupam as escutas legais. É muito fácil, hoje em dia, fazer uma escuta ilegal. O próprio terrorismo as utiliza como nós sabemos. Temos cada vez mais que adoptar medidas preventivas e perceber que se tecnologia nos ajuda também nos pode prejudicar. Há sempre que olhar para as coisas no seu devido enquadramento. Não sou nem nunca fui uma pessoa de extremos a não ser numa única questão: liberdade e responsabilidade. Aí, sou absolutamente extremista e não vejo hipótese nenhuma de qualquer cedência.

Como se recebe um jihadista que regresse da Síria e que tenha participado em acções terroristas ?

Julgando-a, condenando-a, levando-a a cumprir a pena. Deve ser um processo de reabilitação.

Acredita na reabilitação social dos jihadistas?

Há situações em que isso muito dificilmente será possível. Mas não podemos desistir disso, porque nesse dia estamos a semi-render-nos. Se desistirmos da lógica de reabilitação para os vários tipos de crime, o que vai acontecer é a impossibilidade de reparação e a persistência nesse tipo de actividade.

Estas pessoas partiram com a convicção de que iam morrer por uma causa. Não ultrapassaram a linha de não retorno?

Na vida só há uma coisa irreversível. No resto, penso que temos meios para as combater.

Defende acções militarizadas em zonas de recrutamento?

Em campos de treino e acampamentos militares, claramente. Em locais onde exista população civil, penso que se a tecnologia serve para tanta coisa e se existem armas tão inteligentes há possibilidade de direccionar. Também não me parece que massacrar populações civis em nome de um bem maior seja uma solução. Tudo isto deve ser feito no enquadramento de grande persistência e determinação mas também de valores. Não podemos, em circunstância alguma, aproximarmo-nos deles nem parecermo-nos com eles.

É preciso uma reeducação de valores dos terroristas?

A começar pela nossa. A Europa engordou, acomodou-se durante muito tempo numa lógica de que estavam adquiridos aqueles direitos e não havia retrocesso. Sempre escrevi que a democracia e os valores nunca estavam garantidos, era uma luta diária. Não acredito na reintegração dos jihadistas em geral, mas acredito na reintegração de cada homem. Se isso não for possível haverá as sanções que o direito dita.

Falta legitimidade democrática na integração europeia?

Claro que há alguma falta de legitimidade democrática, que os cidadãos sentem. A União Europeia tem que se reaproximar dos seus cidadãos através de processos de escrutínio e de proximidade. Que é o que não tem acontecido. Temos vindo a assistir à extensão de uma enorme burocracia, muitas vezes distante da realidade dos próprios cidadãos.

A eleição da Comissão Europeia permitiria aprofundar essa legitimidade?

Por exemplo. Embora isso tenha de ser ponderado, sob pena de os Estados mais pequenos saírem prejudicados.

Grécia e Grã-Bretanha podem vir a sair da UE. Como é que se sai da UE?

Face aos tratados que existem, diria que não se sai da UE. O problema é esse.

Isso não é perigoso?

É.

Devia ser rectificado?

Devia ser revisitado. Não sendo desejável que nenhum país abandone a UE, sobretudo estando nós a atravessar a fase que estamos, em que todos somos de menos, o meu caminho nunca é o de coarctar liberdades.

O aprofundamento do projecto federalista foi um logro, tendo em conta as expectativas criadas pela classe política?

Não sou propriamente a favor de um Estado federal. Todavia, uma das questões que há a corrigir neste momento é alguma desigualdade entre Estados. Mas o projecto europeu, em si, não é um logro. Permitiu o período mais duradouro de paz na Europa. Incorreu em alguns erros, mas vamos muito a tempo de corrigi-los e as alturas difíceis servem como janelas de oportunidade.

Fala-se num pacto anti-terrorista entre o governo e o PS. É provável que ele aconteça?

Não só esse acordo é desejável como é desejável um acordo mais alargado. Não me cingiria ao PS e ao PSD. Seria desejável que todos os partidos com assento parlamentar se unissem em torno dessas propostas de combate ao terrorismo.

Admite que os serviços secretos possam fazer escutas?

Num cenário de agravamento e de garantia de direitos e liberdades.

Esse cenário já deve estar explícito na lei?

Por ora, na altura em que estamos a conversar, a qualquer momento pode começar a fazer sentido. Assistimos ao assassinato, de uma forma ignóbil, do piloto jordano e assistimos subsequentemente a enforcamentos.

São tempos especiais que exigem medidas especiais?

Não é isso que quero. Temos, no quadro democrático, outras respostas a dar.

Quando é que essas alterações à lei devem estar concluídas?

Há calendários que não controlamos. As medidas que terão de ser amplamente debatidas no parlamento. O quadro parlamentar ao Parlamento pertence.

E o calendário eleitoral pode influir nessa discussão?

Espero que o bom senso prevaleça e que se compreenda que esta questão não se compadece com calendários eleitorais.

O PS tem sido responsável na forma como tem lidado com o caso de José Sócrates?

Não falarei no processo em concreto. Porque nunca falo no processo em concreto e porque todos os processos devem ser tratados de forma igual. Nós somos, face à nossa Constituição, iguais perante a lei.

A pergunta é sobre a forma como o partido está a lidar com um processo envolve um seu ex-alto dirigente.

Não me vou referir à forma como o PS gere a questão do ex-primeiro-ministro. Vou referir-me às ideias que o partido tem apresentado e que tocam à Justiça. Confesso que custa profundamente ver um partido com as responsabilidades do PS dizer que fará a polícia única, que juntará o ministério da Justiça e o ministério da Administração Interna, que questiona sistematicamente actuações concretas de magistrados. E, por outro lado, ver o seu pai fundador dizer a um juiz que tenha cuidado.

Tendo em conta o que aconteceu com o caso Casa Pia, em que houve alterações do Processo Penal que tiveram inspiração nalgumas das situações que ocorreram, nomeadamente em termos de escutas telefónicas, receia que o PS possa utilizar este caso para, por exemplo, recuperar o foro especial para políticos?

Não vou referir-me ao caso Casa Pia, mas vou dizer que temo profundamente, neste momento, por aquelas que são as ideias relativamente ao sistema judicial. Os comentários de alguns responsáveis do PS que têm vindo a público são num sentido preocupante. Os comentários de que devem existir determinados tratamentos…

Privilégios.

Se quiser.

Parece que, na perspectiva de algumas pessoas do PS, há cidadãos de primeira e cidadãos de segunda. Teme pela separação de poderes?

Face àquilo que tenho ouvido, temo, naturalmente, se o PS ganhar as eleições. Quando se permite fazer aquilo a que vou chamar, a benefício de muita contenção, um aviso a um juiz, quando se fala na policia única, na junção de ministérios, é óbvio que temo porque essas declarações revelam que não se interiorizou a separação de poderes

Teme o controlo político da investigação criminal?

Naturalmente.

Alguns socialistas fazem essa acusação ao governo quando falam em processo é político.

Nunca houve um empenho tão grande de um governo em reforçar a independência da magistratura judicial, a autonomia do Ministério Público e tanto respeito para com as respectivas estruturas. Estamos a rever os estatutos no sentido de reforçar a autonomia e a independência. Processos políticos em Portugal não existem com este governo. E espero que não existam com mais nenhum governo porque se foi criando uma cultura de não retrocesso. Da mesma forma que não gosto da conversa da politização da Justiça, também não gosto da conversa da judicialização da política que vem sempre ao de cima quando alguém tem determinada projecção. E não estou a referir-me a nenhum caso em concreto.

A revisão dos estatutos está em curso, entre os quais o dos Advogados. A Ordem diz que não teve tempo para se pronunciar.

Estamos a discutir o estatuto da Ordem dos Advogados desde 11 de Fevereiro de 2013. O diálogo começou nesse dia com o envio de um novo estatuto para a Ordem. Em 23 de Abril de 2014, a senhora bastonária, que dizia desconhecer os estatutos e não ter sido consultada, até envia sugestões de redacção da Ordem. Realizaram-se reuniões aqui nos dias 16 e 24 de Abril do ano passado. Não estamos obviamente a falar num prazo de dez dias. Houve uma altura em que houve que pôr termo, senão não concluíamos processo nenhum. Não há a menor veracidade naquilo que foi dito.

Na proposta, acrescentou-se a incompatibilidade com a função de vereador municipal.

Há dois regimes: incompatibilidades e impedimentos. O que é absolutamente incompatível? A titularidade de cargos executivos a tempo integral. Os vereadores a tempo integral não podem exercer.

Mas essa nuance não consta da proposta.

Não é exactamente assim. Admito que possam ter existido várias leituras. Agora, as propostas são evolutivas. Mesmo esta proposta vai passar pelo Parlamento, não sairá como está.

Esta não seria uma boa oportunidade para que o exercício da advocacia fosse incompatível com o mandato de deputado?

Penso que isso seria um empobrecimento. O que não quer dizer, e é o que está na proposta, que os deputados não tenham impedimentos. O deputado não tem poder executivo, mas faz leis. Por exemplo: eu defendo empresas transportadoras, estou a fazer uma lei sobre transportes. Faço parte da comissão de Obras Públicas, vou votar ou até sou relatora do projecto. Aí, deve existir um impedimento e a nossa proposta vai nesse sentido. Coisa que não existe agora. Não é incompatibilidade da advocacia com a função de deputado. Sou muito mais defensora do sistema de impedimentos.

Isso obriga a Ordem a uma grande fiscalização.

Naturalmente. De um ponto de vista do exercício de profissões, é transversal, devia reforçar-se os impedimentos, não empobrecer as instituições.

Qual foi o momento mais difícil deste mandato?

Foi, talvez, o mais gratificante, também. Foi quando conseguimos que o memorando fosse adaptado a uma visão sistémica do regime e quando transformámos as nossas reuniões com a troika, que foram inicialmente muito complicadas, em reuniões de equipas de trabalho. Com envolvência e reconhecimento final da própria comissão de acompanhamento da troika. _Mas compreendo onde quer chegar...

A relatora da ONU disse no parlamento que o colapso do Citius foi reflexo da “excessiva pressa” em fazer a reforma judicial. Não houve pressa?

Não, esta reforma foi discutida durante dois anos com a envolvência de todos os parceiros judiciários à volta desta mesa. Aliás, houve alterações em função dos contributos desses parceiros, incluindo a Ordem dos Advogados. Esteve em discussão nove meses no Parlamento. Em Portugal, houve muitas pessoas contra a reforma e até ao fim muitos acreditaram que conseguiriam travar a reforma.

Ponderou a demissão?

Por causa do Citius? Não. Se tivesse falhado algum dos objectivos estruturais daquilo a que me propus, com certeza. Uma plataforma electrónica não está sob responsabilidade de um membro do governo e todos os indicadores fornecidos ao grupo de trabalho iam em sentido contrário. Foi garantido nesta sala que estava tudo pronto para avançar.

Durante o mandato, em algum momento ponderou a saída?

Estive aqui reunida esta semana com todos os embaixadores da União Europeia mais Turquia e Sérvia sob presidência da Letónia. Foi-nos pedido que expuséssemos as nossas reformas. Já a comissária europeia tinha dito que as reformas em Portugal eram referenciais e eram para seguir. O “Finantial Times” elogiou um procedimento que criámos e que permite a um credor apurar se deve ou não intentar uma acção, através de consultas de bases, que é absolutamente inovador. É isso que, quando me for embora daqui, levarei: a sensação de um trabalho feito.

O que lhe falta fazer?

Concluir o estatuto dos tribunais administrativos e fiscais, o código processo dos tribunais administrativos, a lista dos pedófilos e crimes sexuais contra crianças, o estatuto das magistraturas, o estatuto da vítima. Saio daqui de consciência muito, muito, muito leve. E com a plena noção de que foram três anos e meio de clausura permanente para atingir os objectivos. Penso que cumpri o meu dever. Reformar, em Portugal, é terrível. A lógica é a inércia, há demasiados interesses que o inibem.

Acredita na renovação da maioria em Outubro?

A maioria merece essa renovação. Quando iniciei funções, a primeira notícia foi a de que não havia dinheiro para pagar salários. A nossa situação é muito diferente. Já não somos lixo para algumas agências.

O desgaste da maioria permite a renovação?

Acredito que merece. É muito mais fácil ser eleitoralista.

O PS continua a defender que o investimento público é a solução para a crise.

Tal como o meu receio no sistema judicial, receio que, do ponto de vista económico, a consolidarem-se as teses do PS, dentro de algum tempo teríamos novamente uma situação económica muito difícil. Não sei até que ponto teríamos a capacidade de sacrifício extraordinário que toda a população portuguesa demonstrou. Com revolta, naturalmente.

A Europa não está a mudar, permitindo o acesso a investimento para fomentar o crescimento?

O senhor Mário Draghi anunciou uma política, mas também disse que é para quem cumprir as suas obrigações. Foi um anúncio muito impressivo.

Defende um governo de Bloco Central?


Defendo um bloco transversal – mais que um bloco central. Se, no âmbito dos acordos a que chegarem, alguém sentir que há uma violentação de consciência tem toda a liberdade de sair. Mas há obrigação de fazer esse esforço.

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