sábado, 11 de maio de 2013

Dia i. Chegou a altura de desbravar o Intendente.


Dia i. Chegou a altura de desbravar o Intendente.

Por Clara Silva
publicado em 11 Maio 2013 in (jornal) i online

A partir das três da tarde e até às duas da manhã, nove bares do Intendente vão abrir portas com uma programação que vai desde DJs a workshops de Bollywood ou de desenho erótico. O objectivo é pôr a zona no mapa da noite lisboeta

Lembra-se de quando a Fabiana do Viking ainda era um segredo bem guardado do Cais do Sodré? De quando a rua não estava pintada de cor-de-rosa e de quando se podia dar ao luxo de ser servido na pista de dança por uma senhora de bata que o tratava por bebé? Longe vão esses tempos da decadência cool do Cais do Sodré, ou Caos do Sodré, como preferir, e da fauna que o costumava frequentar. Se é um desses saudosos da noite alternativa de Lisboa, fique sabendo que ainda há esperança para as próximas noites de copos fora dos circuitos da moda: há todo um Intendente por desbravar.

A câmara tem-se esforçado para que a zona se liberte da má fama que ganhou ao longo dos anos, com polícia, obras no Largo do Intendente e novos bares e associações, mas pôr o Intendente na rota da noite lisboeta ainda pode demorar algum tempo. Aliás, basta passar pela Rua dos Anjos para perceber isso.

À porta do New Times, um bar que abriu há um ano no lugar de outro chamado Fórmula J, está um homem estendido no chão e um casal a injectar-se. “É crack”, explica alguém que passa. Não é o melhor cartão-de-visita para um bar e talvez por isso o New Times só tenha uma pessoa ao balcão. “Tenho música, tenho jogos, tenho setas, tenho internet… Só não tenho é clientes”, diz Carlos Santos, 41 anos, o dono do bar que durante o dia também funciona como snack-bar. “É óbvio, quem passa aqui e vê drogados à porta deve pensar que dentro do bar ainda é pior. Se a câmara não fizer nada para tirar os drogados daqui ainda fazemos disto uma sala de chuto.”

Algumas portas ao lado, Manuel Mendes, 60 anos, dono do Trinitá, um bar “mais à base de gente africana”, queixa-se do mesmo. “Isso é que era bom que acabasse, certos e determinados indivíduos a drogarem-se aqui na rua. Porque prostituição aqui já é muito pouca.” Em 45 anos de Intendente – antes de ter o bar trabalhou na cervejaria Ramiro – garante que nunca teve problemas na zona. “Nem nunca levei uma chapada. Pára aqui gente boa. O mal disto foi ter vindo para aqui a droga do Casal Ventoso.”

Domingos Oliveira, dono do bar Securas, que existe na rua desde 1993, diz que “a droga começou a aparecer em 1999”. Também nunca teve problemas, a não ser com o negócio. “Isto hoje está muito mais calmo do que já foi. É preciso trazer mais pessoas e mais sossego para a rua.”

As paredes do bar estão forradas com imagens de mulheres nuas, mas Domingos diz que “o ambiente nunca foi erótico”. “Nunca tive cá essa coisa, nem pouco mais ou menos. Tenho algumas imagens, isso sim, de um calendário que uns amigos meus trouxeram de França.”

Do outro lado da rua há mais gente e ouve-se música africana mesmo fora das portas do Ferro Velho, um dos bares mais concorridos. “Quando vim para aqui, em 1987, isto era um ferro velho e por isso ficou com este nome”, conta o dono, Carlos Rocha, de 56 anos. “Os meus pais vivem aqui em cima no primeiro andar e surgiu a oportunidade de tomar conta deste negócio.” No bar a música varia consoante os clientes, explica Carlos. “Passo house, techno, reggae, mas geralmente passo música da Guiné que até as pessoas de etnia branca gostam.” Na porta ao lado, no AnjosBar, com um ano de vida, também se ouve kizomba. Aos sábados é um dos pontos de encontro para karaoke, mas a dona, Isabel, ainda está à espera de noites melhores: “Espero que isto vire o Bairro Alto, o Cais do Sodré, ou ainda melhor.”

DIA I
Foi a pensar nisso, em dar uma nova vida aos bares da zona, que um grupo de amigos, conhecidos, trabalhadores e moradores decidiu criar o “dia i”. “Não invente, venha ao Intendente” é o nome do evento que durante o dia de hoje quer desbravar nove bares pouco ou nada conhecidos dos lisboetas com uma programação que vai desde workshops de Bollywood a desenho erótico. Além do New Times, do Securas, do Trinitá, do Ferro Velho e do AnjosBar, estão na lista outros espaços com nomes tão sugestivos como o Palma, o Sarriá, o Cantinho do Bemformoso e o Tominho.

“Assistimos ao processo de transformação do território e queremos dar a conhecer o espaço ao público em geral”, conta Marta Silva, uma das organizadoras do evento. “Esta zona tinha uma fama e muita história destes bares está associada a esta fama, mas as pessoas nem sequer conhecem os espaços por dentro. Como os donos destes bares não costumam fazer comunicação, decidimos organizar com eles uma programação.”

O programa das festas, que começa às três da tarde e se prolonga até às duas da manhã, até inclui um workshop de cupcakes, além de DJs, torneio de setas e matraquilhos e “bola na TV”. A Rua dos Anjos e a Rua do Benformoso vão estar enfeitadas com estendais de roupa que se acumulou durante sete anos na lavandaria de Rosa, uma moradora do Intendente.

Programação completa em:

diaintendente.files.wordpress.com

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