terça-feira, 5 de junho de 2018

Moradores de Lisboa já estão a transformar lixo doméstico em adubo com ajuda de compostores



Moradores de Lisboa já estão a transformar lixo doméstico em adubo com ajuda de compostores

Sofia Cristino
Texto
5 Junho, 2018

Os moradores que vão receber um compostor da Câmara Municipal de Lisboa (CML) já começaram a ter acções de formação para aprenderem a usar o equipamento de reciclagem. Dos 4 mil que a autarquia está a oferecer, 1288 já têm dono, sendo a freguesia de Alvalade a que mostrou mais interesse, com 159 inscritos. Vários moradores estão entusiasmados com a ideia de poderem dar uma nova utilidade ao seu lixo orgânico, mas o processo de compostagem tem várias regras que, se não forem cumpridas à risca, podem pôr em causa o procedimento. “Tenho receio de não fazer bem o acompanhamento”, confessa uma moradora. Mas uma formadora descomplica. “A compostagem é usarmos os nossos resíduos de cozinha, que estão a ser colocados em contentores indiferenciados, e transformá-los em adubo. Isto é uma sopa juliana. É muito simples”, diz. Com a iniciativa “Lisboa a Compostar” a autarquia quer reduzir as 600 toneladas de lixo produzidas por dia na cidade e diminuir em 10% o volume de resíduos até 2020.

 “O processo de compostagem é muito simples. Quando começarem a pôr as mãos na massa, ainda vai ser mais fácil”, explica Catarina Rebelo, formadora, a vinte moradores da freguesia de Alvalade que, na manhã de 31 de Maio, se reuniram para aprenderem a utilizar os compostores que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) está a oferecer. Ao todo, o município vai disponibilizar 4 mil compostores domésticos a habitantes que vivam em moradias com jardim, de forma a recuperarem resíduos orgânicos para fazer adubos. Até agora, 1288 pessoas – maioritariamente com idades entre os 31 e os 50 anos – mostraram interesse em adquirir o equipamento, sendo a freguesia de Alvalade a que teve um maior número de inscrições (159), seguida de Penha de França (119), Arroios (102), Belém (93) e Olivais (87). Segundo o coordenador deste projecto, Vítor Vieira, a elevada adesão da freguesia de Alvalade não está directamente relacionada com “uma maior consciencialização ecológica” destes habitantes, mas antes com a tipologia do edificado deste bairro. Com este programa municipal, a Câmara de Lisboa quer reduzir em 10% a quantidade de lixo produzida até 2020.

As acções de formação começaram em Alvalade, no passado mês de Maio, com turmas de vinte pessoas, de forma a facilitar o processo de aprendizagem. Ao longo dos próximos meses, vão decorrer cerca de três formações por semana, consoante a disponibilidade dos moradores. No final de cada iniciativa, se mantiverem o interesse, levam um compostor para casa, cada um identificado com um código numerário na tampa, e preenchem um termo de responsabilidade com esse mesmo número, de forma a que a CML possa acompanhar o processo de reciclagem de cada um. “Quando começarem a utilizar o compostor, vão ter dúvidas, mas vão vê-las rapidamente esclarecidas com a nossa ajuda, através de um guião que vamos entregar, do site da câmara, ou mesmo por telefone. Se quiserem, também fazemos visitas personalizadas para vermos como está a correr a experiência”, informa Catarina Rebelo.

 Numa primeira explicação, o processo de compostagem não parece complicado, mas há várias regras que, se não forem cumpridas, podem deitar por água abaixo todo o trabalho realizado durante meses. Não basta colocar os resíduos dentro deste equipamento, é necessário avaliar a temperatura, a humidade e até o cheiro do entulho. O estado de drenagem e permeabilidade do solo são outras das condições fundamentais para que se consigam os resultados pretendidos. “Inscrevi-me neste programa municipal porque acho que temos de ter uma maior preocupação ecológica, mas agora vamos ver como funciona, na prática. Tenho receio de não fazer bem o acompanhamento, ou de não conseguir medir a temperatura do lixo”, diz Teresa Andrade, 52 anos, que vai pôr o compostor no quintal partilhado do prédio onde vive. “Mesmo que os meus vizinhos não o façam, ao menos faço eu”, acrescenta.

 Este recipiente sem fundo só funciona se for colocado sobre a terra, uma condição que exclui quem só tem varandas ou jardins de pequena dimensão. De forma a existir uma “camada de ar entre o solo e os resíduos”, os paus de madeira são os primeiros materiais a entrar no compostor. Só depois, por cima desta camada, é que se colocam as cascas de vegetais crus e não temperados, que devem ser intercaladas com materiais secos, nomeadamente folhas, erva seca, ervas daninhas sem sementes, e até papel e cartão – “sem tinta” e em pequenas quantidades. “Se só colocarem papel este vai empapar com a água e não vai permitir que entre o ar suficiente para o processo de degradação dos resíduos. Também podem colocar aparas de madeira e serradura ou cascas de ovos”, vai explicando a formadora.

Nesta última fase do processo de compostagem, é preciso, ainda, vigiar as condições de humidade, temperatura e o próprio cheiro dos resíduos. Com a ajuda de uma pá de jardinagem de cabo curto faz-se um buraco até chegar ao meio da pilha de entulho e, com luvas de jardinagem, agarram-se os resíduos numa mão e espremem-se. “Se não sair água, é porque está muito seco e tem de se regar. Se cair uma ou duas gotas, mas não escorrer, não precisam de acrescentar água. Se escorrer, tem água a mais e aí pode-se colocar mais elementos secos”, explica a formadora. A temperatura deve ser verificada com uma vareta de ferro e é aconselhável que se vá cheirando o lixo para perceber o estado do composto.

“Se cheirar a podre, é porque tem água a mais e se cheirar a amónia, aquele cheiro de uma couve fechada num saco de plástico no Verão, é porque tem verdes a mais. Para ver a temperatura, espetamos a vareta e vemos se está fria, morna ou a escaldar. Esta pilha não pode atingir temperaturas acima dos 75 graus, porque o azoto evapora e perdemos a fertilidade do composto”, esclarece. Por este motivo, o compostor deve ainda ser colocado à sombra de uma árvore ou de uma parede e, na falta destas, a formadora aconselha à compra de um chapéu de sol.

 No final, é só “misturar tudo” com uma forqueta, uma ferramenta que permite trazer o lixo para cima, e manter o compostor aberto para arejar. “A compostagem não é mais do que usarmos os nossos resíduos de cozinha, que actualmente estão a ser colocados em contentores indiferenciados, e transformá-los em adubo. Quanto mais pequenos forem os resíduos, mais rápido é o processo. Isto é uma sopa juliana”, diz Catarina Rebelo, em tom de brincadeira.

De forma a evitar pragas de insectos ou de ratos, basta não pôr comida temperada, carne ou lacticínios, “produtos proibidos na compostagem”. Não é também aconselhável colocar-se citrinos – porque levam muito tempo a decompor-se -, medicamentos e produtos químicos, excrementos de animais, e beatas de cigarro ou cinzas, que com a adição de água fermentam e formam uma camada impermeável.

 O compostor é constituído por uma tampa e quatro placas de plástico, sendo que cada uma das placas tem duas portas mais pequenas, facilitando a retirada do adubo por baixo. A estrutura maleável é de montagem fácil, mas, no final da acção de formação, houve quem não ficasse convencido com a eficácia do aparelho. “Isso é assim tão grande? Não sei se o quero levar. É feio e inestético”, comentava uma moradora, que sugeriu à Câmara de Lisboa que fizesse compostores com um design mais apelativo e em menores dimensões.

Qualquer pessoa que tenha um logradouro, um quintal ou um jardim, em Lisboa, pode inscrever-se para receber um compostor através do site da autarquia. Após a inscrição, a Câmara de Lisboa entra em contacto com os habitantes para agendar uma acção de formação.

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