Moradores de Lisboa já estão a transformar lixo doméstico em
adubo com ajuda de compostores
Sofia Cristino
Texto
5 Junho, 2018
Os moradores que vão receber um compostor da Câmara
Municipal de Lisboa (CML) já começaram a ter acções de formação para aprenderem
a usar o equipamento de reciclagem. Dos 4 mil que a autarquia está a oferecer,
1288 já têm dono, sendo a freguesia de Alvalade a que mostrou mais interesse,
com 159 inscritos. Vários moradores estão entusiasmados com a ideia de poderem
dar uma nova utilidade ao seu lixo orgânico, mas o processo de compostagem tem
várias regras que, se não forem cumpridas à risca, podem pôr em causa o
procedimento. “Tenho receio de não fazer bem o acompanhamento”, confessa uma
moradora. Mas uma formadora descomplica. “A compostagem é usarmos os nossos
resíduos de cozinha, que estão a ser colocados em contentores indiferenciados,
e transformá-los em adubo. Isto é uma sopa juliana. É muito simples”, diz. Com
a iniciativa “Lisboa a Compostar” a autarquia quer reduzir as 600 toneladas de
lixo produzidas por dia na cidade e diminuir em 10% o volume de resíduos até
2020.
“O processo de
compostagem é muito simples. Quando começarem a pôr as mãos na massa, ainda vai
ser mais fácil”, explica Catarina Rebelo, formadora, a vinte moradores da
freguesia de Alvalade que, na manhã de 31 de Maio, se reuniram para aprenderem
a utilizar os compostores que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) está a
oferecer. Ao todo, o município vai disponibilizar 4 mil compostores domésticos
a habitantes que vivam em moradias com jardim, de forma a recuperarem resíduos
orgânicos para fazer adubos. Até agora, 1288 pessoas – maioritariamente com
idades entre os 31 e os 50 anos – mostraram interesse em adquirir o
equipamento, sendo a freguesia de Alvalade a que teve um maior número de
inscrições (159), seguida de Penha de França (119), Arroios (102), Belém (93) e
Olivais (87). Segundo o coordenador deste projecto, Vítor Vieira, a elevada
adesão da freguesia de Alvalade não está directamente relacionada com “uma
maior consciencialização ecológica” destes habitantes, mas antes com a
tipologia do edificado deste bairro. Com este programa municipal, a Câmara de
Lisboa quer reduzir em 10% a quantidade de lixo produzida até 2020.
As acções de formação começaram em Alvalade, no passado mês
de Maio, com turmas de vinte pessoas, de forma a facilitar o processo de
aprendizagem. Ao longo dos próximos meses, vão decorrer cerca de três formações
por semana, consoante a disponibilidade dos moradores. No final de cada
iniciativa, se mantiverem o interesse, levam um compostor para casa, cada um
identificado com um código numerário na tampa, e preenchem um termo de
responsabilidade com esse mesmo número, de forma a que a CML possa acompanhar o
processo de reciclagem de cada um. “Quando começarem a utilizar o compostor,
vão ter dúvidas, mas vão vê-las rapidamente esclarecidas com a nossa ajuda,
através de um guião que vamos entregar, do site da câmara, ou mesmo por
telefone. Se quiserem, também fazemos visitas personalizadas para vermos como
está a correr a experiência”, informa Catarina Rebelo.
Numa primeira
explicação, o processo de compostagem não parece complicado, mas há várias
regras que, se não forem cumpridas, podem deitar por água abaixo todo o
trabalho realizado durante meses. Não basta colocar os resíduos dentro deste
equipamento, é necessário avaliar a temperatura, a humidade e até o cheiro do
entulho. O estado de drenagem e permeabilidade do solo são outras das condições
fundamentais para que se consigam os resultados pretendidos. “Inscrevi-me neste
programa municipal porque acho que temos de ter uma maior preocupação
ecológica, mas agora vamos ver como funciona, na prática. Tenho receio de não
fazer bem o acompanhamento, ou de não conseguir medir a temperatura do lixo”,
diz Teresa Andrade, 52 anos, que vai pôr o compostor no quintal partilhado do
prédio onde vive. “Mesmo que os meus vizinhos não o façam, ao menos faço eu”,
acrescenta.
Este recipiente sem
fundo só funciona se for colocado sobre a terra, uma condição que exclui quem
só tem varandas ou jardins de pequena dimensão. De forma a existir uma “camada
de ar entre o solo e os resíduos”, os paus de madeira são os primeiros materiais
a entrar no compostor. Só depois, por cima desta camada, é que se colocam as
cascas de vegetais crus e não temperados, que devem ser intercaladas com
materiais secos, nomeadamente folhas, erva seca, ervas daninhas sem sementes, e
até papel e cartão – “sem tinta” e em pequenas quantidades. “Se só colocarem
papel este vai empapar com a água e não vai permitir que entre o ar suficiente
para o processo de degradação dos resíduos. Também podem colocar aparas de
madeira e serradura ou cascas de ovos”, vai explicando a formadora.
Nesta última fase do processo de compostagem, é preciso,
ainda, vigiar as condições de humidade, temperatura e o próprio cheiro dos
resíduos. Com a ajuda de uma pá de jardinagem de cabo curto faz-se um buraco
até chegar ao meio da pilha de entulho e, com luvas de jardinagem, agarram-se
os resíduos numa mão e espremem-se. “Se não sair água, é porque está muito seco
e tem de se regar. Se cair uma ou duas gotas, mas não escorrer, não precisam de
acrescentar água. Se escorrer, tem água a mais e aí pode-se colocar mais
elementos secos”, explica a formadora. A temperatura deve ser verificada com
uma vareta de ferro e é aconselhável que se vá cheirando o lixo para perceber o
estado do composto.
“Se cheirar a podre, é porque tem água a mais e se cheirar a
amónia, aquele cheiro de uma couve fechada num saco de plástico no Verão, é
porque tem verdes a mais. Para ver a temperatura, espetamos a vareta e vemos se
está fria, morna ou a escaldar. Esta pilha não pode atingir temperaturas acima
dos 75 graus, porque o azoto evapora e perdemos a fertilidade do composto”,
esclarece. Por este motivo, o compostor deve ainda ser colocado à sombra de uma
árvore ou de uma parede e, na falta destas, a formadora aconselha à compra de
um chapéu de sol.
No final, é só
“misturar tudo” com uma forqueta, uma ferramenta que permite trazer o lixo para
cima, e manter o compostor aberto para arejar. “A compostagem não é mais do que
usarmos os nossos resíduos de cozinha, que actualmente estão a ser colocados em
contentores indiferenciados, e transformá-los em adubo. Quanto mais pequenos
forem os resíduos, mais rápido é o processo. Isto é uma sopa juliana”, diz
Catarina Rebelo, em tom de brincadeira.
De forma a evitar pragas de insectos ou de ratos, basta não
pôr comida temperada, carne ou lacticínios, “produtos proibidos na
compostagem”. Não é também aconselhável colocar-se citrinos – porque levam
muito tempo a decompor-se -, medicamentos e produtos químicos, excrementos de
animais, e beatas de cigarro ou cinzas, que com a adição de água fermentam e
formam uma camada impermeável.
O compostor é
constituído por uma tampa e quatro placas de plástico, sendo que cada uma das
placas tem duas portas mais pequenas, facilitando a retirada do adubo por
baixo. A estrutura maleável é de montagem fácil, mas, no final da acção de
formação, houve quem não ficasse convencido com a eficácia do aparelho. “Isso é
assim tão grande? Não sei se o quero levar. É feio e inestético”, comentava uma
moradora, que sugeriu à Câmara de Lisboa que fizesse compostores com um design
mais apelativo e em menores dimensões.
Qualquer pessoa que tenha um logradouro, um quintal ou um
jardim, em Lisboa, pode inscrever-se para receber um compostor através do site
da autarquia. Após a inscrição, a Câmara de Lisboa entra em contacto com os
habitantes para agendar uma acção de formação.
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