OVOODOCORVO dedicou hoje já muita atenção a esta
importantíssima questão que pode alterar profundamente a liberdade de
utilização , de opinião , a criatividade e espontâneadade da partilha na
Internet, e constituir um atentado aos direitos fundamentais e à liberdade de
expressão dos cidadãos Europeus
“Há dezenas de investigadores europeus e associações de
defesa digitais preocupados com essa possibilidade, com campanhas a pedir para
“salvar a Internet” a circular nas redes sociais. Entre os maiores problemas
apontados está o artigo 13, que propõe que os prestadores de serviços online
utilizem “tecnologias efectivas de reconhecimento” para barrar conteúdo
pirateado. Funcionam com base em mecanismos que detectam porções de um ficheiro
de áudio, texto, ou vídeo que estão protegidos por direitos de autor.”
Eurodeputados avançam com directiva para criar filtros
online
Proposta tem suscitado críticas por parte de alguns
parlamentares, de académicos e de associações de direitos dos consumidores.
KARLA PEQUENINO 20 de Junho de 2018, 16:00
Os eurodeputados deram nesta quarta-feira um passo
importante para mudar as regras dos direitos de autor na era da Internet, ao
aprovar uma controversa proposta de alteração à directiva sobre direitos
digitais. Se entrar em vigor, poderá vir a criar filtros para impedir a
publicação de conteúdos protegidos em plataformas como o YouTube, o Facebook, o
Tinder e muitas outras.
A missão é acabar com a pirataria online na União Europeia e
proteger os direitos das pessoas cujo trabalho circula na Internet sem
autorização, mas alguns artigos da directiva actualizada levantam preocupações
sobre a liberdade de expressão, criatividade e a liberdade de publicar
informação online.
"Esta votação assinala o primeiro passo dos
procedimentos parlamentares para adoptar leis de direitos de autor adequadas a
ir ao encontro dos desafios da Internet. As últimas leis sobre direitos de
autor na sociedade de informação já têm 17 anos e a Internet mudou muito",
afirmou o relator da proposta de revisão das regras, Axel Voss. "Editores
de notícias e artistas, especialmente os mais pequenos, não estão a ser pagos o
suficiente devido a práticas poderosas no mundo online por parte de plataformas
de partilha de conteúdo e agregadores de notícias. Isto está errado, e a nossa
visão é corrigir isso."
O Comité dos Assuntos Legais do Parlamento Europeu aprovou –
com 14 votos a favor, nove contra e duas abstenções – a proposta para novas
regras, que começarão a ser negociadas entre o Conselho Europeu, o Parlamento e
a Comissão Europeia. O Governo português apoia as mudanças e o único
eurodeputado naquele comité, António Marinho e Pinto, votou a favor. O
objectivo é que o processo de adopção formal esteja concluído em 2021.
Há dezenas de investigadores europeus e associações de
defesa digitais preocupados com essa possibilidade, com campanhas a pedir para
“salvar a Internet” a circular nas redes sociais. Entre os maiores problemas
apontados está o artigo 13, que propõe que os prestadores de serviços online
utilizem “tecnologias efectivas de reconhecimento” para barrar conteúdo
pirateado. Funcionam com base em mecanismos que detectam porções de um ficheiro
de áudio, texto, ou vídeo que estão protegidos por direitos de autor.
“Não é assim tão simples. Se isto vai para a frente, vai ser
difícil distinguir correctamente todo o conteúdo que chega às plataformas. Há
casos em que se usa conteúdo baseado no de outro autor sem o infringir”,
explica ao PÚBLICO a investigadora Ana Ramalho, que lecciona sobre propriedade
intelectual na universidade de Maastricht, na Holanda. É uma das académicas a
assinar cartas abertas enviadas ao Parlamento contra alguns pontos da
directiva. “A paródia ou crítica social, o uso privado, e a autorização do uso
por pessoas com deficiências são usos legítimos. Não conheço um filtro capaz de
detectar correctamente todas estas subtilezas.”
A tecnologia para filtrar vídeos, fotografias e textos
requer também um grande investimento de tempo e dinheiro para desenvolver, o
que daria vantagem a empresas que já usam esta tecnologia, como o YouTube e o
Facebook, referem os críticos da proposta. “O problema do artigo 13 é querer
ser uma solução universal. A definição de plataformas inclui imensos tipos de
sites e nem todos têm sistemas de filtros ou dinheiro para os criar”, diz
Ramalho.
Os vídeos carregados para sites que já têm filtros, como o
YouTube, são automaticamente comparados com uma extensa base de dados de
ficheiros enviados por proprietários de conteúdo para garantir que não há
conteúdo protegido por direitos de autor a circular sem autorização no site.
Para já, a decisão de eliminar este conteúdo não é automática e cabe aos
detentores de direitos de autor (por exemplo, um estúdio de cinema ou uma
editora de música).
Em Abril, várias associações de defesas dos direitos digitais
em Portugal – como a associação portuguesa D3 (Defesa dos Direitos Digitais) e
o departamento português da Internet Society – também escreveram uma carta
aberta a Marinho e Pinto, notando que a mudança é uma “restrição
desproporcional” à liberdade de expressão, ao “submeter todos os conteúdos
enviados pelos utilizadores a uma monitorização prévia”.
"Taxa do link"
Outra parte da directiva que tem recebido muita atenção
negativa são as novas protecções das publicações de imprensa, descrita pelos
opositores como “taxa do link”.
“Permitirá às publicações de imprensa impedir a partilha de
excertos de notícias ou obrigar as plataformas a negociarem uma licença para
essa partilha ser permitida”, lê-se na carta aberta das associações
portuguesas. “A partilha dos chamados snippets (conjunto de título, excerto da
notícia e/ou nome da publicação) terá sempre de ser objecto de uma licença para
ser permitida”.
Com isto, quer-se impedir que sites agregadores de notícias
(como o Google News) lucrem à custa dos sites de notícias online. “O novo
direito responde a uma falha substancial no mercado”, defende Thomas Höppner,
professor em propriedade intelectual na universidade de Wildau, na Alemanha, na
introdução de um estudo sobre a directiva para o Parlamento Europeu. “As
notícias online podem ser copiadas e distribuídas globalmente em várias
plataformas num piscar de olhos. Há agregadores de notícias que reúnem,
combinam e recolhem notícias automaticamente", acrescenta Höppner que diz
que os "efeitos desta exploração são negativas para as publicações
online".
Medidas com propostas semelhantes à da directiva já foram
postas em vigor em alguns países europeus, sem sucesso. Na Espanha, onde as
publicações não podiam abdicar do direito de cobrar uma taxa pela utilização de
partes dos seusa artigos, o Google News fechou operações quase imediatamente. A
empresa disse que a sua plataforma é um serviço gratuito e, portanto, obrigar
ao pagamento de uma taxa para os sites de notícias não era uma prática
sustentável (o Google News não tem anúncios, embora as notícias também apareçam
no motor de busca, que é rentabilizado com publicidade). Um ano depois da
medida entrar em vigor, um estudo encomendado pelos editores de media espanhóis
mostra que foram os sites de notícias a sair prejudicados, com uma queda de 6%
no tráfego.
Na Alemanha, como o tráfego dos sites de notícias caiu a
pique quando o Google News deixou de publicar excertos das notícias, as
plataformas alemãs negociaram uma licença gratuita com o gigante
norte-americano dando-lhe vantagem face a outros agregadores. Para a associação
portuguesa D3, o exemplo mostra como as novas leis europeias podem “reforçar a
posição monopolista” de grandes empresas.
A investigadora Ana Ramalho acrescenta que não faz sequer
sentido o excerto de uma notícia estar protegido pelo direito de autor. “Não se
pode ter direito sobre as primeiras duas frases de uma notícia, ou o título.
Dizer que ‘O Cristiano Ronaldo marcou o primeiro golo” não é uma criação
literária. É um facto”, diz Ramalho. “Esta é só a minha interpretação da
directiva. O facto de ser vaga é outro problema. É o resultado de vários
compromissos políticos, mas leva a que cada Estado possa interpretá-la
consoante a sua própria cultura jurídica.”
Contrariamente ao novo Regulamento para a Protecção de Dados
que tem de ser aplicado na íntegra em todos os países da União Europeia, uma
directiva define um objectivo que todos os Estados-membros devem atingir.
“Dificulta a circulação de informação entre países porque não temos um direito
de autor europeu”, diz Ana Ramalho. “Isto obriga cada país a introduzir um novo
direito nacional, mas tem de ser adaptado às leis vigentes por isso não estamos
a introduzir um só direito, estamos a introduzir 28”.
Ainda há um longo caminho a percorrer até a directiva ser
oficialmente aprovada. Os próximos passos são a negociação de um mandato para
definir um acordo final entre o Parlamento Europeu, o Conselho, e a Comissão
Europeia.
“Ainda podemos mudar
a história”, frisa Julia Reda, eurodeputada eleita pelo Partido Pirata Alemão,
numa publicação do Twitter. Nos últimos anos, Reda, cujo programa assenta em
questões relacionadas com a sociedade da informação, tem feito campanha contra a
directiva comparando-a com uma “máquina de censura”.
A decisão para começar as negociações será anunciada no
começo da sessão plenária do Parlamento Europeu no dia 2 de Julho. Nesta
altura, os eurodeputados podem ainda contestar a decisão e exigir que a
directiva seja discutida e aprovada no Parlamento.
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