segunda-feira, 11 de junho de 2018

Obras do elevador da Sé de Lisboa paradas há um ano e meio e sem data prevista de recomeço



Obras do elevador da Sé de Lisboa paradas há um ano e meio e sem data prevista de recomeço

Sofia Cristino
Texto
11 Junho, 2018

O elevador que vai ligar o Campo das Cebolas à Sé de Lisboa deveria ter sido concluído no Verão de 2017, mas a obra parou cinco meses depois de começar. Os estabelecimentos de restauração do início da Rua Cruzes da Sé, onde se encontra o estaleiro, sentem-se muito prejudicados pelo interregno – que dura há um ano e meio – e exigem que alguém se responsabilize pelos danos. Já voaram chapas metálicas, quando chove aparecem ratos nas esplanadas e as zonas junto aos tapumes tornaram-se num “urinol público”. “A EMEL faz o que quer, acho que é a entidade com mais poder nesta cidade”, queixa-se um funcionário do restaurante mais afectado. A empresa dona da obra justifica a paragem com um pedido de impugnação judicial de uma das empresas de construção civil concorrentes à segunda fase do projecto. Enquanto o processo judicial não estiver concluído, a EMEL diz que não consegue comunicar uma data para conclusão da obra.

Quando chove há imensas ratazanas, a calçada já abateu mais do que uma vez, além da tareia financeira que estamos a levar”, diz, indignado, João Igrejas, funcionário do restaurante Ao Pé da Sé. Este estabelecimento de restauração tem sido o mais afectado pela paragem da obra da construção do elevador da EMEL que vai ligar a Sé de Lisboa ao Campo das Cebolas. A inauguração da nova acessibilidade estava prevista para o Verão de 2017, mas, devido a um pedido de impugnação judicial por parte de uma das empresas de construção civil concorrentes à segunda fase da obra, a empreitada está parada há um ano e meio.

 A obra iniciou-se em Junho de 2016 e, após cinco meses consecutivos de trabalhos e concluída a primeira parte da mesma, cessou sem aviso prévio e ainda não foi retomada. O estaleiro continua montado e inactivo há um ano e meio e, com a degradação dos materiais, começaram-se a sentir mais os danos causados pelo interregno. Já voaram chapas metálicas, tendo uma delas partido um telhado de uma casa, entretanto remendado com placas de plástico. Por vezes, surgem ratos oriundos das obras e há pessoas que começaram a fazer as suas necessidades junto aos tapumes.

Quando a data de conclusão foi anunciada, em 2016, a directora de relações institucionais e cidadania da entidade dona da obra, a Empresa de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa (EMEL), Helena Carvalho, dizia ao jornal Público que, “atendendo a que esta obra decorrerá numa zona muito rica em termos arqueológicos”, a primeira fase da empreitada visava “apenas escavar o poço onde será posteriormente instalado o elevador”. Acrescentava, ainda, que, “dependendo das vicissitudes dos trabalhos arqueológicos a realizar, espera-se que o elevador esteja operacional no Verão de 2017”.

 Os achados arqueológicos foram retirados e identificados, mas o buraco ficou escavado e é de lá que provêm os ratos, explica João Igrejas, o funcionário do restaurante. “Ninguém imagina a quantidade de ratos que circula aqui. Um dia passou uma ratazana no meio dos clientes, ficamos em pânico. Fizeram um urinol público, faziam cocó e xixi, e tivemos de colocar esta placa de madeira a tapar esta parte para não virem. Também já tapamos o ralo do esgoto, que escorria por aqui”, diz, apontando para o antigo ralo agora cimentado e a zona onde encontrou muitas vezes necessidades fisiológicas.

Além destes remendos, os donos do estabelecimento já compuseram mais que uma vez a calçada em frente à porta de entrada do restaurante, que, segundo João Igrejas, abateu devido à degradação causada pela obra. Por este motivo, o restaurante já gastou dois mil euros em arranjos. “Encontraram esqueletos, numa altura eram mais arqueólogos que operários da construção a trabalhar lá e, depois, parou. É uma falta de respeito, a EMEL faz o que quer, acho que é a entidade com mais poder nesta cidade e nós temos de engolir em seco”, comenta, especulando ainda que a obra poderá ter parado devido aos achados arqueológicos.

Segundo Duarte Ferreira, gerente do estabelecimento de restauração, o chefe de obra chegou a comunicar-lhe que terminaria a mesma em três meses, mas “não só não o fez como não quis falar sobre as razões que levaram à suspensão da mesma”. “Já enviei imensos emails para a EMEL e dizem sempre que não sabem quando está concluída. É vergonhoso e prejudica muito o nosso trabalho, tivemos quebras muito grandes, na ordem dos 30%. Agora somos um contentor, as pessoas olham e acham que também estamos em obras”, explica, enquanto mostra como os tapumes tapam a vista de quem passeia por uma das zonas mais movimentadas e icónicas de Lisboa. Duarte Ferreira queixa-se ainda de terem fechado a rua sem aviso prévio. “De repente, estão três obras a decorrer e ninguém nos dá justificações”, diz, referindo-se às obras de intervenção e requalificação da Sé.

Ana Beirão, sócia gerente do restaurante Ao Pé da Sé, também já enviou uma carta à EMEL a pedir justificações sobre o estado da obra e a questionar se já existe data para a conclusão da mesma, tendo a empresa que gere a empreitada respondido que “não tem previsão para o reinício da obra e consequentemente para a finalização desta”. A resposta foi publicada no passado 30 de Maio no sítio do Fórum Cidadania Lisboa.

 Um pouco mais abaixo, Rita Pereira, funcionária do restaurante Cruzes Credo, queixa-se da visibilidade que o estaleiro tira aos carros e da falta de segurança das obras da Sé. “Há pouco tempo, caiu uma pedra na cabeça de uma mulher. Há homens a trabalharem sem capacete. As pessoas sentem-se mal com o pó”, comenta. Vânia Ferreira, gerente do restaurante A Tapas da Sé, o estabelecimento mais recente da Rua Cruzes da Sé, diz que apesar de não ter “termo de comparação”, uma vez que está ali há três meses, espera que a construção do elevador acabe rápido.

Contactada por O Corvo, a EMEL diz que já foi realizado um concurso para a segunda fase da obra, mas que esta se encontra parada devido “a um pedido de impugnação judicial por parte de um dos concorrentes que, até que haja uma conclusão, paralisou o processo”. “Teríamos um construtor a terminar a obra, se ela não tivesse sido alvo de um pedido de impugnação que nos é alheio. Por isso, também não comunicámos datas para reinício ou conclusão, porque é um processo que está a decorrer”, explica a empresa municipal em depoimento escrito, garantindo esperar encontrar uma solução rapidamente que permita um recomeço célere.

 Quanto aos achados arqueológicos ali encontrados, a EMEL informa que são maioritariamente esqueletos, estelas funerárias, bijuteria, entre outros pequenos artefactos, salientando que olha para os mesmos com “grande respeito e atenção” e rodeando-se dos “recursos técnicos que melhor lidam com esta temática”.

Relativamente aos danos causados nos estabelecimentos de restauração da Rua Cruzes da Sé, devido à paragem da obra, a EMEL pede que os comerciantes contactem a empresa municipal a informar detalhadamente quais os estragos provocados. “Existem seguros de responsabilidade civil que cobrem o risco de um eventual acidente”, explica a empresa, adiantando não ter recebido reclamações sobre danos eventualmente causados pela obra. Ainda assim, pede que os interessados a contactem e expliquem cada situação “com toda a informação e detalhe que exista”.

Contactada por o Corvo, a Câmara Municipal de Lisboa (CML) remeteu o assunto para a Direcção-Geral do Património e Cultura (DGPC), que, apesar da insistência, não respondeu até ao momento da publicação deste artigo. Também contactado por O Corvo, o Patriarcado da Sé diz que a obra é da responsabilidade da CML, descartando-se de responsabilidades.

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