Tribunal suspende construção do Museu
Judaico em Alfama
Associação de moradores e comerciantes interpôs acção judicial por
considerar que o projecto de arquitectura "corta com a tradição do
bairro" e "descaracteriza o Largo de São Miguel". Câmara está a
analisar a decisão judicial.
JOÃO PEDRO PINCHA 15 de Junho de 2018, 8:30
Foi suspensa a construção do Museu Judaico de Lisboa, em
Alfama. O Tribunal Central Administrativo do Sul aceitou a providência cautelar
interposta por uma associação de moradores e comerciantes daquele bairro, que
contesta o projecto de arquitectura e o local escolhido para o museu.
O tribunal suspendeu a eficácia das decisões tomadas pela
Câmara Municipal de Lisboa que viabilizaram a construção do museu no Largo de
São Miguel. O projecto da arquitecta Graça Bachmann, em colaboração com Luís
Neuparth e Pedro Cunha, é um edifício com duas fachadas distintas: uma delas
tem uma Estrela de David em baixo relevo e pedra lioz.
Lurdes Pinheiro, presidente da Associação do Património e
População de Alfama (APPA), diz que esta arquitectura “corta com a tradição do
bairro” e “descaracteriza o Largo de São Miguel”, um dos principais espaços
públicos de Alfama. A associação queixa-se, sobretudo, da altura e da
volumetria previstas no projecto, que considera serem excessivas para o largo e
para a Igreja de São Miguel, na esquina oposta.
O facto de a igreja ser considerada Imóvel de Interesse
Público e de o Núcleo Histórico de Alfama e Colina do Castelo ter um plano de
urbanização (cujo primeiro objectivo é “conservar e valorizar o conjunto
histórico e tradicional”) foram alguns dos argumentos usados pela APPA na acção
judicial que interpôs em Setembro do ano passado.
Em primeira instância, a câmara ganhou. Pouco depois
iniciaram-se os trabalhos no local, com a demolição das casas ali existentes.
Agora, o tribunal deu razão à associação, ordenando a paragem das obras e
condenando a autarquia a pagar as custas judiciais de ambas as instâncias.
“Claro que estamos satisfeitos”, diz Lurdes Pinheiro. “Já
começaram a demolir, o que é preocupante, porque mostra que fizeram tudo a
correr para ser um facto consumado”, afirma a dirigente da APPA, que não
acredita que a câmara desista já do projecto. “Nós vamos até ao fim para
impedir aquela arquitectura no largo, que o vai descaracterizar completamente.
Nós não estamos contra o museu, estamos é contra aquele projecto”, diz Lurdes
Pinheiro.
A APPA, assim como o Fórum Cidadania Lx, propõem que o museu
seja instalado antes na Rua do Jardim do Tabaco, onde há actualmente vários
edifícios devolutos. Ao PÚBLICO, fonte oficial da autarquia confirmou que
recebeu a notificação judicial esta quinta-feira ao fim da tarde e que o
departamento jurídico está já a analisar o que fazer de seguida.
A construção do Museu Judaico é uma iniciativa da câmara, da
Associação de Turismo de Lisboa e da Comunidade Israelita de Lisboa. A escolha
do Largo de São Miguel deveu-se ao facto de ele ser um “local simbólico” para o
judaísmo português, já que ali perto existiu a Judiaria de Alfama. O museu foi
anunciado publicamente em Setembro de 2016, com uma cerimónia no Largo de São
Miguel em que Fernando Medina garantiu a abertura do museu para dali a um ano.
No entanto, o processo tem sido marcado por muita
contestação, primeiro da APPA, depois do Fórum Cidadania Lx e, por fim, da
própria Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, que no ano passado veio
defender a escolha de outro local do bairro para a instalação do museu.
Perante as críticas de moradores, comerciantes e associações
de defesa do património, em Abril do ano passado criou-se uma comissão de
acompanhamento do museu, que apenas se reuniu pela primeira vez em Julho. Nesse
encontro ficou claro que a localização era um ponto inegociável, mas que o
projecto podia ser alterado. Decidiu-se inclusivamente que os lisboetas podiam
enviar sugestões de alteração. Na altura, o PÚBLICO tentou perceber como é que
se podiam apresentar propostas, quem é que as podia fazer e como é que elas
seriam ponderadas. Nunca houve resposta da câmara.
tp.ocilbup@ahcnip.oaoj
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