Pedidos de ajuda
por despejo obrigam câmara de Lisboa a criar gabinete de apoio
Autarquia vai ter uma linha
telefónica através da qual vai identificar e encaminhar os casos.
JOÃO PEDRO PINCHA
31 de Março de 2018, 7:38 actualizado a 31 de Março de 2018, 12:45
São tantos os
relatos de pressões exercidas por senhorios e investidores sobre inquilinos que
a Câmara Municipal de Lisboa decidiu montar uma “unidade de intervenção
integrada” para ajudar os habitantes a defenderem-se. Esse gabinete de apoio
deve estar a funcionar “no início de Maio”, segundo a vereadora da Habitação.
Paula Marques diz
que, por um lado, a autarquia tem um grande desconhecimento formal destas
situações porque os visados procuram respostas diversas (nas juntas, na
Associação de Inquilinos Lisbonenses ou noutras entidades) e que, muitas vezes,
os casos não chegam à câmara. Isso faz com que, por exemplo, a autarquia não
exerça o direito de preferência sobre os imóveis em venda – um direito que lhe
assiste numa parte considerável da cidade.
O Bloco de
Esquerda propôs recentemente a criação de uma linha telefónica SOS Despejo,
através da qual os munícipes poderão contactar directamente a câmara para
relatar situações de despejo e bullying imobiliário. A recomendação foi
aprovada por unanimidade e a vereadora considera que a linha vai permitir
colmatar o desconhecimento actual.
Mas que isso não
chega, refere Paula Marques. Assim, a “unidade de intervenção integrada” vai
servir para atender as chamadas de quem se sinta assediado a deixar a sua casa
e, ao mesmo tempo, para reencaminhar essas pessoas para as entidades que melhor
lhes sirvam. “A câmara não pode e não deve dar apoio jurídico directo aos
munícipes, mas deve concentrar informação e ser accionadora das parcerias
possíveis para dar solução”, diz Paula Marques. As juntas de freguesia que já
prestam ajuda jurídica vão ser fundamentais neste trabalho, sublinha a
vereadora, mas é provável que seja preciso encontrar mais advogados para fazer
face ao volume de solicitações. Na freguesia de Santa Maria Maior, só nos
primeiros nove meses do ano passado houve pelo menos 200 pessoas a requerer
apoio jurídico. E a percepção da junta é que este ano o número está a aumentar.
É também no
princípio de Maio que fecham as candidaturas ao concurso extraordinário de
habitação no centro histórico, lançado pela câmara especificamente para as
pessoas que estejam “em comprovado risco de perder a habitação no prazo de um
ano ou tenham perdido a habitação no ano anterior”. Até agora, e passado
sensivelmente um mês desde a abertura do processo, candidataram-se 30 pessoas
ou famílias.
A câmara destinou
100 casas a este concurso, ao qual apenas se podem candidatar as pessoas que
residam nas freguesias de Santa Maria Maior, Misericórdia, São Vicente e Santo
António há mais de dez anos. A maioria dos pedidos recebidos até agora é de
moradores de Santa Maria Maior. A 5 de Maio, fechadas as inscrições, “teremos o
resultado final e saberemos se os 100 fogos postos à disposição são ou não
suficientes”, explicou Paula Marques na terça-feira, durante a reunião da
assembleia municipal. A vereadora disse ainda que “se por acaso a 5 de Maio não
houver candidaturas suficientes”, abrirá nova ronda de concurso.
Mas, a julgar
pela quantidade de queixas que se ouvem diariamente, parece improvável que não
apareça gente suficiente à procura de casa. O perigo, aliás, é o contrário: o
de haver muitos mais candidatos do que casas para atribuir. A meio de
Fevereiro, Paula Marques disse ao PÚBLICO que a câmara estava a analisar se
podia, caso necessário, incluir mais casas do centro histórico neste lote. No
entanto, alertou logo que o património imobiliário da autarquia já vai
escasseando – também porque, até recentemente, a câmara vendeu dezenas de
edifícios em toda a cidade para incentivar a reabilitação privada e melhorar a
situação financeira do município. “Não temos muito mais”, afirmou então.
É também por isso
que a vereadora tem insistido na necessidade de fazer alterações mais profundas
ao Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), vulgo Lei das Rendas, que tem
sido identificada pelos partidos de esquerda como a fonte de muitos males
actuais. PSD e CDS, que aprovaram a lei em 2012, discordam e acusam as outras
bancadas de quererem voltar ao período de congelamento das rendas, durante o
qual os senhorios poucas ou nenhumas obras fizeram nos seus prédios.
“A câmara de
Lisboa está a fazer o seu trabalho, com os instrumentos que tem à sua
disposição. Era muito importante que os grupos políticos que têm assento na
Assembleia da República fizessem o seu”, disse Paula Marques ainda na
terça-feira.
O Parlamento já
fez pequenas alterações ao NRAU. Uma delas tornou mais difícil despejar
inquilinos por motivo de obras profundas nos edifícios, outra aumentou o
período de transição (do antigo para o novo regime) para 10 anos. Ainda assim,
à esquerda, a intenção é mexer mais na lei. Uma das medidas previstas por PCP e
BE é a extinção do Balcão Nacional de Arrendamento, que ambos os partidos
consideram que funciona como um balcão facilitador de despejos. Outros pontos
da lei em que se vai mexer dizem respeito ao valor das rendas, a que agora se
quer colocar um tecto, e ao prazo dos contratos, cujo máximo deverá ser
alargado para lá dos actuais cinco anos.
Sem comentários:
Enviar um comentário