A trapalhada na
Cultura. Quem está a mentir?
A promessa do
primeiro-ministro de elevar a cultura à categoria de Ministério foi, como se
tem vindo a provar, uma mera operação de marketing.
05/04/2018
Ana Sá Lopes
Política
https://ionline.sapo.pt/606899?source=social
O que se está a
passar com o subfinanciamento – ou ausência de financiamento – às artes não
podia acontecer com um governo PS que existe porque tem o apoio parlamentar do
PCP e do Bloco de Esquerda. A promessa do primeiro-ministro de elevar a cultura
à categoria de Ministério foi, como se tem vindo a provar, uma mera operação de
marketing. O #somostodosCenteno – a palavra de ordem do governo, segundo o
ministro da Saúde – também mora aqui. O governo parece não entender aquela
frase, que deveria ser matricial entre os socialistas e que um dia foi
atribuída a Jorge Sampaio: “Há mais vida para além do défice”. [Sampaio negou
ter pronunciado a frase, disse que tinha defendido existir “mais vida para além
do Orçamento”]. Tanto a frase que ficou lendária como a frase que foi
efetivamente dita parecem esquecidas por estes dias em que um governo apoiado
pela esquerda é submisso à absurda ortodoxia europeia.
A verdade é que quando António Costa viu a maré contra o
governo a subir fez o possível para travar uma contestação – informou ter
ficado “surpreendido” com os resultado do concurso – e chamando o ministro da
Cultura Luís Filipe Castro Mendes e o secretário de Estado Miguel Honrado para
uma reunião em São Bento. Acontece que na conferência de imprensa que se seguiu,
o secretário de Estado negou existirem quaisquer razões para a “surpresa” de
António Costa – afinal, segundo o governante, o primeiro-ministro estava a par
de todo o processo.
Ora, aqui não há
duas hipóteses: um dos protagonistas está a mentir. A “surpresa” de Costa bate
certo com um rápido anúncio de controle de danos, que em outras ocasiões falhou
e com a notícia de que vem aí mais dinheiro para apoiar os agentes culturais. Mas
então por que diabo o secretário de Estado co-responsabilizou o primeiro-ministro
pelo processo? Alguma coisa aqui não bate certo e, sendo assim, a permanência
de Miguel Honrado no governo tornou-se mais difícil.
O papel de Costa
na farsa dos apoios à Cultura
Filomena Martins
OBSERVADOR / 5-4-2018
A relação de
Costa com a Cultura começou com uma opereta de interesses recíprocos, passou
por uma cena queirosiana falhada e está a ter o final previsível: o
primeiro-ministro a desresponsabilizar-se.
Não há almoços
grátis. O problema é quando além de pagar ainda se escolhe o chef errado.
António Costa quis mostrar-se uma pessoa grata. Depois da Cultura ter apostado
nele para primeiro-ministro, ele fez da Cultura uma das suas apostas mal
conseguiu chegar ao Governo. Com direito a ministério e tudo.
Só que esta
espécie de troca começou mal e parece que vai acabar ainda pior. Depois daquele
manifesto de tanta gente culta e intelectual que apareceu ao seu lado em Lisboa
para o incentivar primeiro a roubar o PS a Seguro e depois a ganhar o Governo a
Passos, Costa errou na primeira tentativa de agradecimento. A escolha-surpresa
de João Soares para ministro não resistiu mais que quatro meses. Nem o
primeiro-ministro nem a tal elite cultural entenderam a ameaça virtual de um
par de bofetadas a dois colunistas como uma tentativa falhada de imitar as
literárias bengaladas de Eça. E houve remodelação.
Dois anos
passados, o mais certo é voltar a haver mexidas no mesmo ministério. As cenas
da última terça-feira são o exemplo perfeito daquilo que um Governo não pode
fazer. Pelo menos em público. Após uma escalada de tensão, de pressões várias,
de críticas de todos os partidos e de agendamentos de protestos, aconteceu a
desautorização. Mal o secretário de Estado anunciou uma Conferência de Imprensa
para explicar a mudança de apoios às Artes, Costa chamou-o a ele e ao ministro
a S. Bento e disse-se surpreendido com a situação e a contestação. Só que,
pouco depois, viu Miguel Honrado dizer que não percebia “a surpresa” porque o
primeiro-ministro “estava a par de tudo”.
Confesso que a
unanimidade é uma coisa que me assusta. Causa absoluto pânico. Assim que vi
tanta gente de acordo e a atacar o Governo fiquei entre o terrivelmente
preocupada e o bastante curiosa. Sei bem diferenciar o que é a elite
cultural-caviar que sempre viveu da subsidiodependência e produz espetáculos,
exposições e instalações para a meia dúzia de amigos, entre lobbies,
agremiações e o corporativismo de que fujo a sete pés. E a cultura a que alguns
só podem ter acesso com o apoio do Estado, via Governo ou câmaras locais, num
País que pouco lê, raramente vai ao teatro e só ouve música clássica via banda
filarmónica lá da terra por falta de outra oferta. E fui tentar perceber o
problema.
Logo às primeiras
leituras, dei com a receita do costume: o ministro a recuar nos cortes face à
pressão global. E a atirar mais dinheiro para cima do problema, subindo as
dotações à medida que a contestação aumentava. É um mau princípio. Ou não
estava convicto do que decidiu. Ou decidiu mal. Ou decidiu com base na hashtag “somos
todos Centeno”, entre o cortar, cativar
e desviar verbas para apresentar aqueles números absolutamente
fantásticos que dão os grandes sound bytes.
Mas esta
tragicomédia já levava vários actos. Começou com o atraso nos concursos.
Complicou-se com a burocracia das candidaturas. E por fim revelou-se uma farsa
com a alteração dos critérios previamente negociados. Pequenas subtilezas,
nuances ou armadilhas, como alguém já lhe chamou, que mudaram tudo o que
inicialmente até parecia justo: fazer depender os apoios a 20% de receitas
próprias, mas retirando depois desta definição as receitas de bilheteira e
vendas dos espetáculos. Foi assim que duas das companhias de teatro mais
antigas do País ficaram sem financiamento entre tantas outras relevantes. E que
as estruturas mais pequenas, aquelas com peso local, foram incapazes de
corresponder às novas regras unilateralmente criadas. E o problema é que agora
quem falar mais alto e mais voz tiver junto dos media ou de Costa, mais
receberá. E o debate que realmente interessa, aquele sobre quem deve e merece
mesmo ter mais apoio, jamais se fará. Que desses nunca virão manifestos que
lhes valham. Nem pressões que comovam a nunca confirmada austeridade
centenoriana.
A relação de
Costa com a Cultura começou pois com uma opereta de interesses recíprocos,
passou por invocação queirosiana falhada e está a ter o final previsível deste
Governo: a do primeiro-ministro a sair de cena, desculpabilizando-se e
desresponsabilizando-se. O drama é que desta vez tirou o tapete a um secretário
de Estado que lhe deu resposta. O enredo adensou-se e só criou expectativa para
os próximos capítulos desta novela. Que não podia ser de pior qualidade.
Só mais duas ou
três coisas
Há cinco
administradores do grupo de colégios privados GPS acusados de desviar para fins
pessoais 34 dos 300 milhões recebidos dos contratos de Associação. Serão
julgados pelo crime que terão praticado. Mas há quem tenha aproveitado logo
para meter no mesmo saco de criminosos todos os colégios que, sacrilégio,
recebem estes apoios do Estado. Os tais que protestaram vestindo de amarelo
quando os perderam. É o mesmo que dizer que todas as IPSS são como era a
Raríssimas e têm à frente pessoas como Paula Brito e Costa, a amiga de Vieira
da Silva e Manuel Delgado. Ou que todos os bancos foram geridos por Oliveira
Costas e Salgados. Ou que só houve Varas na Caixa (aqui nunca saberemos bem,
mas enfim). Ou que todos os ministros de Passos eram iguais a Relvas. E
por aí fora…
Há dois anos que
o Governo e os parceiros da extrema esquerda que o suportam discutem um novo
sistema de controlo público dos políticos e de quem ocupe cargos no Estado. Até
agora ainda não se entenderam. A Comissão da Transparência tem propostas do
Bloco e contrapropostas do PS. Mas Ana Catarina Mendes já veio avisar que
“impor polícias aos políticos é uma mau princípio”, porque levanta suspeitas
sobre todos. Podemos pois continuar a esperar sentados por estas medidas de
escrutínio. Mais altos valores se levantam.
O meu Partido é
Lisboa
Que temos nós que
ver, se não pertencemos nem a um Partido Político nem nos movimentamos nas
brumas das Sociedades Secretas, com os problemas internos de um Partido
Político na escolha de um líder?
ANTÓNIO SÉRGIO
ROSA DE CARVALHO
6 de Agosto de
2014, 1:30
As indispensáveis
características daqueles que buscam e questionam mentalmente e que
transformaram essa tendência natural em actividade principal, os
“Intelectuais”, são sem dúvida a Independência e a Autonomia.
É a salvaguarda
destas fronteiras que permite garantir a não conspurcação da fonte essencial do
discernimento crítico, e assim a capacidade, quando necessário de divergir, de
provocar, enfim, de exercer a dissidência sem inibição e com autenticidade.
Sócrates, com o
exercício permanente da sua dialéctica através do discurso/diálogo directo,
ilustra na História das Ideias a busca permanente desta Verdade, talvez
inatingível, mas obrigatória.
Ora, nós sabemos
através dos testemunhos de Platão, diálogos estes sim compostos
“intelectualmente” através da retórica escrita, como esta Independência acabou.
No seu confronto
com a Democracia Ateniense, Sócrates foi considerado pelo Estado subversivo e
perigoso na sua actividade. Capaz de corromper a juventude através do seu
método e ensinamentos.
Sócrates tinha de
desaparecer. Tinha de ser eliminado. De forma “limpa”, mas efectiva.
É no seguimento
da obra de Platão, seu discípulo e de Aristóteles por sua vez discípulo de
Platão, que o “triângulo sagrado” se constitui, onde as referências
fundamentais do Pensamento Ocidental se desenvolvem. Hoje, os “Akademus” e os
“Lycaeum” onde os “Intelectuais” meditam e leccionam estão na herança directa
deste legado.
Tudo isto vem a
propósito de um dos acontecimentos mais deprimentes e fortuitos que tivemos
oportunidade de presenciar. Um acto de vassalagem de toda uma geração de
centenas de “Intelectuais” perante as promessas vagas, murmuradas matreiramente
em operação charmosa, de futuras “multiplicações de pães”.
J. D. Quintela,
felinamente habituado a estes “fedores”, classificou a promessa como “prato de
lentilhas”, eu chamei-lhe de “sopa dos pobres” para manter o simbolismo dentro
do novo contexto gastronómico da Ribeira.
Que temos nós que
ver, se não pertencemos nem a um Partido Político nem nos movimentamos nas
brumas das Sociedades Secretas, com os problemas internos de um Partido
Político na escolha de um líder?
Este é um
problema que devia ser resolvido internamente, independentemente se um líder é
Tó-Tó ou o outro é esperto, ou se um é matreiro e o outro é sério. Tirem as
vossas conclusões internamente, e só depois, apresentem publicamente os
resultados na forma de um Programa Político com Líder definido.
A única coisa que
eu tive oportunidade de verificar (ver "Corpo Presente, Mente
Ausente", da minha autoria, já em 26/08/2012, aqui no PÚBLICO) é que este
“Caminho” de António Costa estava, há muito tempo, mais que “aberto” e a sua
predefinição foi preparada minuciosamente ao milímetro, mesmo antes da
candidatura ao presente mandato.
Portanto, houve
uma deserção premeditada do seu compromisso com Lisboa, e só consigo reconhecer
acrobacias em trampolim num projecto pessoal de ambição política.
E é precisamente
esta “personalização” com o álibi de reforma política, arrastando a opinião
pública e obrigando-nos a pronunciarmo-nos com o argumento de participação na
liberdade de escolha, que eu rejeito como falacioso e enganador.
António Costa foi
eleito para presidir aos destinos de Lisboa. Nesse sentido, a “personalização”
que eu pretendia ver em Costa até ao fim do seu mandato era: O Meu Partido É
Lisboa.
Que vão fazer os
ditos “Intelectuais” no Futuro? Quando se sentirem enganados e utilizados,
porque comeram a “sopa” e não leram o “Menu”? Envenenar-se com uns
“empregozitos”?
Historiador de Arquitectura
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