O destino de
Lisboa
Fernando Sobral
05 de abril de
2018 às 20:36
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Lisboa já foi
"menina e moça", quando José Carlos Ary dos Santos escreveu esse
poema em que falava ainda de uma cidade onde os bairros eram os seus pulmões,
cercando um Terreiro do Paço poderoso.
Pode parecer um
exercício de saudade, mas é mais de realismo. Lisboa era uma cidade típica, sem
ser moderna. Décadas depois, ainda não conseguiu ser moderna, e arrisca-se a
deixar de ser típica. Lisboa desinvestiu dos bairros e não investiu numa
estratégia visionária que a fizesse moderna sem achincalhar o passado alfacinha
e sem ignorar a riqueza cultural que a emigração lhe trouxe. A questão é que
Lisboa continua sem ter direito a uma visão criativa por parte de alguém que a
tente transformar naquilo que deve ser: uma cidade cosmopolita, mas agradável
para viver, trabalhar e passear. Duas décadas depois da Expo'98 Lisboa definha,
porque está a perder a sua alma, que o número de turistas não substitui.
A pressão
imobiliária está a transformar Lisboa numa cidade sem habitantes que lhe dêem
espírito. Todos os dias agentes de fundos imobiliários e de agências tocam às
campainhas de casas e fotografam prédios, causando uma pressão inimaginável
sobre os que resistem e ainda tentam habitar na zona mais central da capital.
Face a isto, que faz a CML? Olha, impávida e serena, porque no fundo foi essa a
estratégia de Manuel Salgado desde que chegou à CML. Há hoje uma Lisboa
desertificada no seu centro, onde as pessoas deixaram de viver. Os serviços
públicos foram saindo do centro para edifícios gigantescos e, com isso,
enterrou-se todo o pequeno comércio que dele dependia e a vida própria que eles
garantiam. Foram as decisões políticas que arruinaram de vez a Baixa. Sem a
vida de pessoas novas, com empregos criativos, será difícil que o centro de
Lisboa atraia mais turistas e gere riqueza. Riqueza intelectual, cultural e
económica. Só isso permitirá uma Lisboa diferenciada e não falsa, pejada apenas
de cadeias internacionais semelhantes a todas as cidades. Elas são desejáveis,
mas deve haver um equilíbrio.
Lisboa precisa de
ser autêntica, na sua fascinante diversidade. Não pode fingir que é
cosmopolita, correndo com os sem-abrigo da Baixa, para que os turistas os não
vejam. E isso tem sido feito, de forma silenciosa, fazendo com que eles vão
"subindo" para outras áreas de Lisboa. Não se resolve o problema:
esconde-se, tal como se faz quanto ao imobiliário, às "lojas
históricas" e aos idosos corridos a pontapé das suas casas por gente sem
escrúpulos. Sobre isto, a CML diz nada.
Há muito para discutir sobre Lisboa. Mas,
sobretudo, a discussão deveria deixar de se centrar na Lisboa menina e moça e
passar a fazer-se sobre a Lisboa adulta, culturalmente diversificada, e que é
fruto de um país de serviços e não de criação de riqueza como é Portugal.
Lisboa tem de ser criativa e não apenas ficar hipnotizada pela riqueza rápida
que o turismo trouxe. Lisboa é o maior postal ilustrado de Portugal, basta
aterrar de avião aqui, olhando a cidade banhada pelo sol, para perceber isso. Deveria
ser magnífica
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