Já se paga 12 meses à cabeça para
conseguir arrendar casa
Ana Margarida Pinheiro 20.04.2018 / 08:00
Escassez de casas no mercado já gera 70 ofertas por dia e
por apartamento.
Cativar o proprietário requer imaginação
Os fiadores eram a salvaguarda e as cauções a almofada para
alguma eventualidade, mas o congestionamento do mercado veio mudar tudo. Aos
candidatos a arrendamento já não basta mostrar que têm capacidade financeira
para pagar o valor pedido pelo proprietário; hoje em dia é preciso apelar à
imaginação. O objetivo é simples: cativar o dono da casa e ultrapassar dezenas de
interessados em arrendar o mesmo imóvel. “As propostas são cada vez mais
floreadas porque os candidatos a arrendamento sentem que não basta oferecer o
que é pedido, é necessário reforçar a proposta”, conta Nuno Gomes, da Remax
Prestige, ao Dinheiro Vivo. “Enquanto no mercado de compra e venda, quando
mediado por um profissional, o comprador não passa necessariamente pela escolha
do dono da casa, no arrendamento o proprietário tem uma escolha a fazer, que
sabemos que tanto se pode basear em questões raciais, nacionalidade, duração do
contrato, como também com os plus oferecidos”, realça. A grande tendência,
conta Marta C., mediadora na área de Lisboa, Cascais, Sintra e Oeiras, é
adiantar rendas. E longe vão os tempos em que dois ou três meses bastavam. “Cada
vez mais são oferecidos valores à cabeça que variam entre meio ano e um ano de
renda”, conta a comercial, acrescentando que “fazem-no portugueses e
estrangeiros para passar a concorrência, mas também para mostrar a sua
disponibilidade para ocupar o imóvel por vários meses, e atestar uma idoneidade
financeira que, no caso dos estrangeiros, é fundamental quando não existe um
histórico contributivo em Portugal”. Não é só. “Também juntam aos contratos,
por exemplo, opções de compra do imóvel após fim do contrato para mostrarem que
estão comprometidos com o imóvel”, acrescenta Nuno Gomes, detalhando que esta
necessidade de obter vantagem face a outros é nova e começa a ganhar contornos
quase divertidos por escassez de casas para arrendar. “Neste momento posso dizer
que tenho uma base de clientes em espera tão grande que basta libertar um
imóvel para arrendamento de manhã, que à tarde já tem ocupante”, reforça o
comercial, admitindo que num único dia chegam a chover mais de 70 propostas.
Marta, que trabalha com outra agência imobiliária, confirma o fenómeno. “No
momento em que disponibilizamos um imóvel tenho de avisar a minha secretária
para estar preparada. O telefone explode durante aquele dia e já se torna
impensável marcar visitas diárias aos apartamentos, temos de fazer casas
abertas.” Abrir a casa para visitas é uma prática habitual na compra e venda,
mas só agora começa a ganhar força para o arrendamento. “A porta está aberta,
faz-se a visita e depois envia-se a proposta. No dia em que fui, estava relativamente
calmo, mas percebi que as visitas iriam continuar por dois dias antes de se
analisarem as propostas”, conta Sara M., que escolheu a casa para arrendar
através desta modalidade de visita. Conseguiu o imóvel T2, há pouco mais de um
ano, sem uma proposta com embrulho bonito, mas assume que “com os valores
praticados hoje em dia são poucos os que conseguem oferecer sequer as três
rendas pedidas pelos proprietários, quanto mais avançar um ano à cabeça”. Marta
C. lembra que no campeonato das ofertas “com lacinhos”, os brasileiros e
franceses são os estrangeiros mais aguerridos. Os primeiros para “arrendar uma
boa casa, até encontrarem o imóvel que vão comprar para viver permanentemente
em Portugal”; os segundos “para testar o ambiente do país e mudarem-se, depois,
com as suas famílias para um imóvel que adquirem”. Ambos optam por zonas
centrais. As associações de proprietários não negam a escassez de casas para
arrendar, especialmente nos grandes centros urbanos e assume que há muitos
proprietários a preferir ter imóveis desocupados a arriscar o arrendamento.
“Não há falta de casas em Portugal, mas há muitas casas desocupadas que, por
diversas razões, não estão a entrar no mercado”, considera António Frias
Marques, da Associação Nacional de Proprietários (ANP).
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