segunda-feira, 6 de maio de 2013

Município admite que os esgotos da Lx Factory estão a desaguar directamente no Tejo.

Autarquia diz que os esgotos se diluem nas águas tratadas que correm no caneiro

Município admite que os esgotos da Lx Factory estão a desaguar directamente no Tejo.

Por João Pedro Pincha in Público
07/05/2013

Câmara diz que não é possível tratar todos os esgotos, apesar de em 2011 a ministra ter anunciado que eles já não vão para o rio.
Parte das águas residuais da Lx Factory, em Alcântara, vai parar ao rio Tejo sem qualquer tratamento. Quem o admite é o gabinete do vereador dos espaços públicos da Câmara Municipal de Lisboa, Manuel Salgado, em resposta a indagações que lhe vêm sendo dirigidas por um munícipe desde Outubro.
"Existe a probabilidade de uma parte do esgoto não ser tratada e ser encaminhada directamente para o rio Tejo", lê-se na resposta de Salgado. Também a Simtejo, a empresa responsável pelo saneamento nos rios Tejo e Trancão, garantiu ao queixoso que o colector pluvial da Lx Factory é um afluente do caneiro de Alcântara, que, por sua vez, desagua no rio junto à doca de Santo Amaro, não excluindo que aí sejam despejados os esgotos daquele antigo recinto industrial, agora em grande parte ocupado por empresas e actividades de tipo cultural.
O caneiro de Alcântara é o principal colector de águas residuais e pluviais de Lisboa, estendendo-se da Damaia até Alcântara. Cerca de dois quilómetros antes do desaguamento, na Av. de Ceuta, está instalada a estação de tratamento de águas residuais (ETAR), re-inaugurada em 2011 e responsável pelo tratamento dos esgotos de cerca de 800 mil habitantes da região.
No mesmo ano, foram também concluídos os trabalhos que permitiram o encaminhamento de esgotos da zona ribeirinha - abrangendo cerca de 100 mil pessoas - para a ETAR de Alcântara. "Sem exagero, isto é só a obra mais importante que foi feita em Lisboa nas últimas décadas", disse na altura António Costa, presidente da câmara. "Com esta ligação, temos todo o estuário livre de águas residuais não tratadas", declarou na mesma ocasião Dulce Pássaro, então ministra do Ambiente de José Sócrates.
Contudo, as águas residuais da Lx Factory não entram no circuito de tratamento. Segundo o gabinete de Manuel Salgado, "não há registo das ligações dos edifícios existentes na Lx Factory, visto tratar-se de edifícios do século XIX", ou seja, "os processos de obra não dispõem de qualquer informação relativa às redes prediais de esgotos ou aos ramais de ligação à rede pública de saneamento".
Ainda de acordo com a resposta enviada ao munícipe, "o reduzido volume dos esgotos não-tratados da Lx Factory face ao volume do caudal de água tratada no caneiro de Alcântara garante uma taxa de diluição bastante significativa", sem impacto na qualidade das águas do Tejo.
Para Miguel Cary, o munícipe que se queixou junto da câmara sobre o assunto, a resposta dos serviços municipais é "um crime". E comenta: "Quer isto dizer que eu posso construir um prédio na zona ribeirinha de Lisboa e enviar os esgotos domésticos directamente para o Tejo?" Segundo garante, a maioria das ligações ao caneiro foi feita nos últimos cinco anos. O gabinete do vereador alega que, "tendo em atenção a idade e as características da rede de saneamento de Lisboa, seria tecnicamente impossível tratar 100% dos esgotos da cidade".
A Lx Factory é "uma ilha criativa" - como a define o seu site - criada nas antigas instalações da Companhia de Fiação e Tecidos Lisbonense, em Alcântara. Lá estão instaladas cerca de 150 empresas, entre restaurantes, agências de publicidade, ateliers de moda, editoras, galerias de arte e discotecas.
A propriedade do espaço é do grupo Mainside, constituído por cinco empresas investidoras no ramo imobiliário e administrado por José Carlos Queirós Carvalho, que é também responsável por outros espaços emblemáticos da noite lisboeta, como a Pensão Amor, na Rua Nova do Carvalho, ao Cais do Sodré.
Miguel Cary tem denunciado numerosas situações que considera irregulares na Lx Factory desde Outubro de 2012 junto de diversos serviços municipais, entre os quais o gabinete do vereador Manuel Salgado e o de António Costa, afirmando que a resposta de Salgado foi a única que obteve. O munícipe, um engenheiro civil que trabalhou na Lx Factory, aponta, nomeadamente, diversas desconformidades no que respeita ao licenciamento de obras e de actividades, tanto naquele equipamento como na Pensão Amor.
O PÚBLICO vem pedindo esclarecimentos à Câmara de Lisboa relativamente a estes assuntos desde 14 de Março, mas não obteve até ao momento qualquer resposta. A Lx Factory, por seu lado, nega todas as acusações que lhe são dirigidas.

Denúncias são "vingança"


José Carlos Queirós Carvalho, responsável pela Lx Factory, fala em "vingança" para definir as denúncias que Miguel Cary tem vindo a fazer nos últimos meses. "Anda ressabiado", diz, explicando que "a situação entre a Lx Factory e a câmara está regularizada". O empresário afirma que "há cerca de dois anos" que Miguel Cary se afastou da Lx Factory, estando presentemente no Brasil a estudar, e que já foi movido contra ele um processo-crime por difamação. José Queirós Carvalho afirma não perceber quais os objectivos das denúncias do seu antigo empregado. Quanto ao desaguamento de esgotos directamente no Tejo, o administrador da Mainside diz desconhecer a situação, mas admite que, "tratando-se de uma construção antiga, se torna difícil" conhecer a realidade com exactidão.






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