sábado, 4 de maio de 2013

Espanhóis têm muito pouca confiança na Casa Real.

O aniversário da república, em Abril, teve mais mensagens antimonarquia do que o habitual.

Espanhóis têm muito pouca confiança na Casa Real.

Por Ana Gomes Ferreira in Público
05/05/2013

Juan Carlos contra-atacou. Quer relançar a instituição, que diz ser representada por ele e pelo filho, e não abdica

Na semana passada, a rainha Sofia de Espanha visitou a filha Cristina e os netos em Barcelona. As revistas cor-de-rosa descobriram a viagem. Há muitos meses que Cristina é uma espécie de pária, pelo menos publicamente, na Casa Real. O seu marido, Iñaki Urdangarín, é a personagem central de um escândalo de corrupção conhecido por Caso Nóos, o nome de uma organização que não deveria ter fins lucrativos mas pelo meio da qual quis enriquecer.
O processo Nóos arrasta-se há meses e, em Abril, Cristina foi citada como testemunha. Escreveu-se que tratá-la como a qualquer outro cidadão iria credibilizar esta monarquia - ainda não foi ouvida, mas é cada vez mais claro que conhecia os negócios do marido.
Foi nesse mês que 2482 espanhóis foram entrevistados pelo Centro de Investigação Sociológica sobre a confiança nas instituições. A Casa Real saiu muito mal do inquérito, recebendo meros 3,68 valores numa escala de avaliação de 1 a 10.
Olhando-se para a totalidade da tabela, a Casa Real aparece a meio, à frente dos partidos, do Governo e dos sindicatos, por esta ordem. Mas está atrás das Forças Armadas (5,71), da polícia (5,65), do defensor do Povo e dos media (que revelaram os escândalos Nóos e Bárcenas, que diz respeito a uma rede de corrupção no Partido Popular, no Governo).
"Relançamento da coroa"

Pela primeira vez, a Casa Real também surge (ainda que em último lugar) na lista do que preocupa os espanhóis, atrás da saúde, da educação... O rei quis reagir imediatamente. Sabe que a confiança, uma vez perdida, é difícil de recuperar. E sabe que não pode perder mais terreno junto dos cidadãos - em 1995, os espanhóis davam à Casa Real quase 8 valores, em 2010 apenas 5,6 e há um ano pouco mais do que 4. Por isso, fez chegar ontem à TVE uma ambiciosa declaração de princípios em que diz pretender dedicar-se de "corpo e a alma" ao "relançamento da coroa" através da "transparência, da submissão à lei e ao Estado de Direito, da estabilidade e da continuidade baseada na figura do príncipe das Astúrias".
O El País sublinha que, com esta frase, o rei pôs de lado qualquer ideia de abdicação.
Juan Carlos Alfonso Víctor María de Borbón y Borbón-Dos Sicilias é rei de Espanha desde Outubro de 1975, quando o ditador Francisco Franco, que o nomeou sucessor político, morreu. O jovem monarca desrespeitou Franco, Espanha tornou-se uma monarquia constitucional e os espanhóis aclamaram o rei.
Os Borbón, porém, degeneraram, como os partidos ou os governos. O próprio rei ajudou à decadência da ideia da monarquia com um comportamento considerado pouco próprio (foi caçar elefantes quando a crise chegou a Espanha e os emails do processo Nóos mostram o seu facilitismo perante as ilegalidades de Iñaki).
Agora, neste "momento especialmente difícil" para o país, tem a intenção de recuperar o protagonismo político inicial ao querer ser o mediador de "um grande pacto entre as instituições contra o desemprego" que já está em 27,1%. Disse à TVE - que mostrou imagens do rei no Palácio da Zarzuela a trabalhar, depois de meses afastado devido a uma cirurgia - que reúne semanalmente com o chefe do Governo, Mariano Rajoy, e com o líder da oposição, o socialista Alfredo Rubalcaba. Pouco depois, o Palácio viu-se obrigado a esclarecer: não há qualquer pacto, o rei quis dizer que pode haver, no futuro.
O rei já tomara decisões para evitar maior erosão de popularidade e as possíveis consequências. Decidiu que todas as contas da sua Casa serão tornadas públicas. E antes tinha proclamado que a família real é apenas ele e Sofia, os herdeiros Felipe e Letícia e as filhas destes, as infantas Leonor e Sofia. Tem cumprido. Elena, a filha mais velha, ainda é respeitada e na semana passada saiu de uma praça de touros debaixo de uma ovação. Cristina, essa, desapareceu de cena e a mãe visita-a meio às escondidas.

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