Sem rede de segurança |
Alemanha prefere que Portugal
saia do resgate sem rede de segurança europeia
Pedro Passos Coelho vai estar reunido hoje com Angela Merkel. O pós- estará
na agenda. A chanceler não tem garantias de que um programa cautelar possa ser
aprovado na Alemanha
Isabel Arriaga e
Cunha, Bruxelas / 18 mar 2014 / PÚBLICO
Oficialmente, é
Portugal que terá de decidir de que forma conta sair do resgate da zona euro e
do FMI. Na prática, porém, o país tem de ter em conta a posição dos restantes
países da zona euro, sobretudo se decidir que precisa de uma rede de segurança
europeia, sob a forma de um “programa cautelar”, para apoiar o seu regresso
progressivo ao mercado da dívida. Entre os 18 países da zona euro, nem todos
estão neste momento confortáveis com essa eventualidade.
Entre os 18, a posição da Alemanha — a
maior economia europeia, que assegura mais de um quarto dos programas de ajuda
aos parceiros em dificuldades — é decisiva para qualquer decisão de Lisboa. O
que justifica que Passos Coelho tenha o cuidado de abordar a questão
directamente com a chanceler alemã, Angela Merkel, como fará certamente no seu
encontro bilateral hoje.
Nas últimas
semanas, o Governo tem dado sinais de pender para uma saída dita “limpa” do
resgate, o que significará o seu regresso puro e simples ao mercado da dívida
para se financiar — mesmo se as necessidades de financiamento do país estão
actualmente asseguradas até ao início de 2015. Isto significa que Portugal
estará nos próximos tempos relativamente resguardado de eventuais perturbações
no mercado.
Se Passos optar
por uma saída “limpa”, o país só precisará, de facto, do apoio e encorajamento
públicos dos parceiros do euro enquanto sinal aos mercados da confiança
depositada no segundo país a sair de um resgate — depois da Irlanda — e na sua
capacidade para manter a trajectória da consolidação orçamental e das reformas
estruturais iniciada com o resgate. Neste contexto, aliás, o debate nacional
sobre uma possível reestruturação da dívida pública — que em “europês”
significa um incumprimento puro e simples sobre parte dos compromissos
assumidos com os credores — não podia ter caído em pior altura.
Se, em
contrapartida, Passos optar por pedir à zona euro um programa cautelar — uma
linha de crédito aberta pelo mecanismo de socorro (ESM), a que o país será
livre de recorrer, ou não, para o financiamento do Estado ou para a compra de
dívida na emissão pelo Governo (mercado primário) para baixar os juros —, as
coisas complicam-se para alguns países. A Alemanha, mas não só, terá de obter a
aprovação do seu Parlamento (Bundestag), como imposto pelo Tribunal
Constitucional federal para todas as decisões que envolvam fundos públicos
nacionais.
O problema de
Merkel é que, neste momento, não tem qualquer garantia de obter essa aprovação,
o que a leva a adoptar uma postura de prudência relativamente a um possível
programa cautelar para Portugal. As dúvidas sobre a posição do Bundestag têm
sobretudo que ver com o facto de os programas cautelares abrirem a porta à
possibilidade de o Banco Central Europeu (BCE) activar o seu novo programa de
compra de dívida no mercado secundário (onde os títulos são transaccionados
entre privados) — mais conhecido pela sigla inglesa OMT —, igualmente para
baixar os juros.
Ora, na Alemanha,
o OMT, cuja existência está por enquanto limitada à promessa de Mario Draghi,
presidente do BCE, de fazer tudo o que for preciso para preservar o euro (da
especulação financeira), é particularmente controverso, e contestado pelas duas
instituições mais respeitadas, o Bundestag e o Bundesbank ( banco central
alemão). As duas instituições consideram-no uma forma de financiamento
encapotado do BCE aos Estados, o que, argumentam, é proibido pelo Tratado da
União Europeia (UE).
O Tribunal
Constitucional tem aliás pendente um processo contra o OMT apresentado por
alguns milhares de cidadãos alemães, que remeteu para o Tribunal de Justiça da
UE pedindo a avaliação da sua compatibilidade com os tratados europeus, não sem
antes decretar que de todos os modos o programa é ilegal à luz da Constituição
alemã. Pelo menos enquanto estes dois processos não estiverem clarificados,
Berlim prefere não ter de enfrentar novos programas de ajuda, mesmo que sejam
só “cautelares”.
O risco de uma
rebelião no Bundestag é tanto maior quanto Merkel tem conseguido “vender”
internamente os controversos programas de ajuda à Grécia, Portugal, Irlanda e
Chipre com o argumento de que se tratava do “último recurso” para salvar o euro
contra a especulação.
Do ponto de vista
alemão, e europeu, porém, Portugal não está de modo algum em situação de ter de
ser salvo in extremis, tanto mais que o país tem vindo a ser profusamente
elogiado pelos parceiros pelos progressos conseguidos em termos de consolidação
orçamental e reformas estruturais.
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