Pessimistas com o futuro,
desconfiados com o poder
TELMA ALVES
26/03/2014 - PÚBLICO
Relatório sobre situação social dos jovens na Europa revela que juventude
portuguesa é das menos optimistas e das mais desconfiadas em relação ao Governo.
Ana Pinheiro de
Massamá, Sintra, tem 55 anos e está reformada por invalidez. Conquistou a sua
autonomia financeira quando tinha 21. Mais cedo do que a filha e o filho. Ela,
com 23 anos e ele com 27, estão desempregados e vivem com a mãe. Apesar de
terem um elevado grau de formação – licenciatura e mestrado – não conseguem ser
independentes.
Ana Garcia Santos
é mãe de quatro filhas, entre os 19 e os 24 anos e, ao contrário de Ana
Pinheiro, tem razões para estar optimista. A filha mais velha continua a viver
com a restante família por opção. “É licenciada em Economia e está a trabalhar
como consultora, não tem tempo sequer para arrumar o quarto, quanto mais gerir
uma família”, conta Ana Santos.
Esta e outras
situações são as duas faces de uma mesma moeda e, embora por razões diferentes,
encaixam na perfeição no retrato tirado pela agência Eurofound no relatório
ontem apresentado sobre a situação social dos jovens na Europa.
O documento
revela que, entre 2007 e 2011 (último ano com dados disponíveis), aumentou na
Europa o número de jovens (18-29 anos) que continuam a viver em casa dos pais. Portugal
até contrariou essa tendência, tendo registado uma diminuição de quatro pontos
percentuais.
Filipe Fernandes,
quase nos 30 anos, está empregado como assessor da Câmara Municipal de Caminha,
apesar de a sua formação superior ser em Arquitectura Paisagista. Ainda não
conseguiu deixar a casa dos pais por duas razões: "Financeiramente ainda é
complicado viver sozinho, continuo a precisar da ajuda dos meus pais. Por outro
lado, ajudo-os a pagar as contas, por isso, eles também precisam de mim. É uma
dependência de parte a parte.” Apesar disso está confiante, ou seja, em
Portugal, faz parte de uma minoria, segundo os dados do estudo (ver
infografia).
Renata Gouveia
Martins, 24 anos, de Lisboa, é licenciada em Direito. Diz-se satisfeita por ter
conseguido arranjar trabalho na sua área, mas isso não lhe dá margem para
deixar a casa dos pais. “É impossível. Trabalho em full time, mas só recebo 300
euros por mês”. Tal como a maioria, segundo o estudo, está pessimista e
desconfia dos governos. “Não confio neles, são uns insensíveis, não têm noção
na realidade." Também tem dificuldade em lidar com promessas que não se
cumprem no local de trabalho. “Entreguei a minha tese de mestrado o mês passado
e nada mudou. Prometeram-me uma coisa no início e depois não foi bem assim”,
lamenta.
Marta Mateus vive
em Odivelas e, com 26 anos, trabalha em part time como educadora social. Os 530
euros que recebe por mês não chegam para uma vida autónoma. “A maior parte dos
meus amigos ainda nem sequer conseguiu o primeiro emprego. Já me disseram para
ir para fora, mas isso é muito triste. Quero trabalhar no meu país e contribuir
para o meu Estado.”
As expectativas
goradas, o investimento sem retorno e a falta de oportunidades são razões que
justificam, sem surpresa, os dados que apontam Portugal como o segundo país
onde há mais jovens pessimistas em relação ao futuro.
Ana Pinheiro não
vê alternativa à emigração. “Eles estão a pensar nisso seriamente e eu, como
mãe, também os incentivo a irem e a lutarem pelos sonhos deles.”
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