Europa disposta a dar “um murro”
à Rússia que pode doer a todos
ALEXANDRE MARTINS
21/03/2014 - PÚBLICO
Bruxelas avançou com um novo pacote de sanções contra Moscovo mas voltou a
não atacar os oligarcas próximos de Putin
A imagem é do
primeiro-ministro britânico, David Cameron, e foi usada como uma espécie de
despertador para acordar os países da União Europeia mais renitentes em
endurecer as sanções contra a Rússia: “Quando damos um murro, podemos aleijar a
mão.”Os líderes das União Europeia, reunidos em Bruxelas, deram início à
preparação de sanções económicas a aplicar à Rússia e incluíram mais 12 nomes
na lista de pessoas que consideram responsáveis pela crise na Crimeia.
A frase,
proferida durante o jantar de trabalho dos chefes de Estado e de Governo da UE,
na noite de quinta-feira, em Bruxelas, não se reflectiu nas decisões tomadas
durante a reunião, que se arrastou até às primeiras horas de sexta-feira, mas a
mensagem é clara: se a UE quiser realmente apertar a Rússia, tem de se preparar
para ficar também com algumas nódoas negras.
O resultado
dessas cautelas, motivadas pelos vários níveis de dependência do gás russo, por
exemplo, ficou plasmado no documento final sobre a resposta a dar a Moscovo na
sequência da integração do território da Crimeia na Federação Russa. Cinco dias
depois de terem publicado uma lista com 21 nomes de responsáveis políticos
russos e ucranianos, que a UE considera terem sido decisivos para o
desenvolvimento do conflito, os líderes europeus decidiram na sexta-feira
alargar o círculo de sanções individuais a mais 12 pessoas, elevando o total
para 33.
Sem consenso para
discutirem a aplicação de sanções a alguns dos mais destacados empresários da
Rússia, os chefes de Estado e de Governo da UE voltaram a marcar políticos e
militares próximos do Presidente Vladimir Putin, com destaque para o
vice-primeiro-ministro, Dmitri Rogozin, cujo nome já constava da lista que os
Estados Unidos anunciaram no início da semana.
Tal como tinha
feito no dia em que recebeu a notícia de que estava proibido de viajar para os
Estados Unidos, Rogozin foi para o Twitter comentar as sanções de que acabara
de ser alvo por parte da União Europeia. Se, na segunda-feira, o
vice-primeiro-ministo russo perguntou ao Presidente norte-americano, Barack
Obama, o que iria ele fazer aos que “não têm contas nem bens no estrangeiro”,
nesta sexta-feira optou por um comentário sem ironia, mas carregado de fervor
patriótico: “Estas sanções não valem um grão de areia do território da Crimeia
que regressou à Rússia.”
Para além de
Dmitri Rogozin, o congelamento de bens e a proibição de entrar em países da
União Europeia foram também alargados aos líderes das duas câmaras do
Parlamento russo, Valentina Matvienko e Sergei Narichkin. De fora ficou Sergei
Ivanov, antigo ministro da Defesa e actual chefe do gabinete presidencial de
Vladimir Putin, que não teve a mesma sorte no momento em que os Estados Unidos
decidiram alargar a sua própria lista, na quinta-feira.
Mais importante
do que saber quem pode continuar a viajar para os Estados Unidos ou para os
países da União Europeia, foi a decisão dos líderes europeus de se
comprometerem a aprovar sanções económicas com “consequências abrangentes”, à
semelhança do que foi anunciado também pelo Presidente dos Estados Unidos.
“Deixámos claro
que um eventual falhanço em resolver a crise de forma pacífica, e quaisquer
passos da Rússia para desestabilizar a Ucrânia terão consequências de longo
alcance. E, quando dizemos isto, estamos a falar de consequências nas relações
num vasto leque de áreas económicas”, disse o presidente do Conselho Europeu,
Herman Van Rompuy.
Na conferência de
imprensa conjunta com o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, no
final da reunião do primeiro dia da cimeira de chefes de Estado e de Governo da
UE, Rompuy avançou que essas sanções poderão vir a passar pelo embargo da venda
de armas à Rússia.
Outra das medidas
com efeitos imediatos acordada pelos líderes europeus foi o cancelamento da
cimeira UE-Rússia (marcada para Junho, também na Rússia, em S. Petersburgo) e
das reuniões bilaterais entre os governos dos vários Estados-membros e o
governo de Moscovo.
As divisões no
seio da UE quanto à dureza das sanções a aplicar à Rússia têm sido
contrabalançadas em público com o tom cada vez mais assertivo da Alemanha. A
chanceler Angela Merkel, que até há poucas semanas demonstrara alguma cautela
sempre que se pronunciava sobre a resposta a dar ao conflito na Crimeia,
assumiu o volante da UE nos avisos à Rússia, ainda que o sector empresarial do
seu país manifeste todos os dias receios sobre a eventual aplicação de sanções
económicas duras, devido às fortes ligações comerciais entre os dois países.
Antes de partir
para Bruxelas, Merkel passou pelo Parlamento alemão, onde declarou que os
líderes europeus devem “assumir consequências para as relações políticas entre
a UE e a Rússia e para as relações entre o G7 e a Rússia”. Por isso, a
existência de um grupo dos países mais desenvolvidos do mundo que inclua a
Rússia deixou de fazer sentido, frisou Angela Merkel: “O G8 já não existe, nem
a cimeira, nem o seu formato”, disse a chanceler alemã, referindo-se ao
cancelamento da reunião anual do grupo, que estava marcada para Junho, na
cidade russa de Sochi.
Também o
primeiro-ministro britânico, David Cameron, tem surgido como uma das vozes
defensoras do endurecimento das sanções à Rússia. “Tem sido um trabalho duro,
mas temos feito progressos reais", afirmou Cameron, frisando que os
líderes europeus têm de deixar “uma mensagem clara, forte e consistente".
Tal como o Presidente
dos Estados Unidos, Barack Obama, admitiu na quinta-feira, quando disse que uma
eventual “fase três” das sanções a aplicar à Rússia “pode também ser disruptiva
para a economia global”, os Estados-membros da UE sabem que o endurecimento da
resposta poderá ter algumas consequências.
“A Rússia pode
perder imenso com isto. Eles são muito mais dependentes da economia europeia do
que nós da deles”, disse à BBC o analista Paul Ivan, do think tank European
Policy Centre, com sede em Bruxelas. “Mas as economias estão interligadas, por
isso, não há dúvidas de que as economias também seriam afectadas”, salientou
Paul Ivan. Elizabeth Stephens, responsável do grupo Jardine Lloyd Thompson,
sublinhou que “as instituições europeias iriam ser atingidas numa altura em que
os bancos europeus ainda estão frágeis”.
Mas pelo menos
nos discursos, vários líderes europeus parecem estar dispostos a pagar o preço,
a julgar pelas palavras do Presidente francês, François Hollande, durante a
reunião da noite de quinta para sexta-feira em Bruxelas: “Para que as sanções
sejam eficazes, têm de doer a quem elas se dirigem e a quem as impõe.”
European Union prepares for trade war with Russia over Crimea
Ian Traynor
in Brussels
The
Guardian, Friday 21 March 2014 / http://www.theguardian.com/world/2014/mar/21/eu-mobilises-trade-war-russia-crimea-ukraine
Europe
began to prepare for a possible trade war with Russia
over Ukraine on Friday, with
the EU executive in Brussels ordered to draft
plans for much more substantive sanctions against Moscow if Vladimir Putin presses ahead with
Russian territorial expansion.
But the
bigger EU countries – Germany ,
France and Britain , all with major but very different
interests at stake in Russia
– split over the tactics of a new campaign with fears that a trade war would be
highly risky and potentially ruinous.
A two-day
summit of EU leaders dominated by the Crimea crisis ended with 12 Russian
politicians and military figures being added to a list of 21 so far subjected
to travel bans and asset freezes.
Unlike Washington , which on
Thursday blacklisted senior Kremlin figures and oligarchs, the EU list avoided
Putin's immediate entourage, instead targeting figures such as Sergei Glazyev,
an economic adviser to Putin, Dmitry Rogozin, a deputy prime minister, and the
heads of both houses of parliament. "The persons are not so
important," said a senior EU official. "It's the climate we're
creating." He denied any differences with the Americans. "It's not a
beauty contest."
The summit
debate, participants and witnesses said, focused on what is known as
"stage 3" of a sanctions regime, meaning broader trade and economic
sanctions against Russia if the Kremlin escalates operations to seize more
territory in Ukraine beyond the Black Sea peninsula of Crimea, whose annexation
was formally concluded on Friday in Moscow.
David
Cameron reserved strong language for the Kremlin move. "A sham and illegal
referendum has taken place at the barrel of a Kalashnikov," he said. "Russia has sought to annex Crimea ,
a flagrant breach of international law and something we will never
recognise."
Cameron
pointed out that while the EU depended on Russia
for a quarter of its gas supplies, the Russian gas monopoly Gazprom relied on Europe for half of its exports. "Russia needs Europe more than Europe needs Russia ,"
he said.
The
European commission in Brussels
was told to draw up plans for sanctions "in a broad range of economic
areas".
Such
language masked differences between Britain
and France on the one hand
and Germany
on the other. Following the summit, Germany 's chancellor, Angela
Merkel, failed to mention the next phase of much more serious penalties, while
Cameron emphasised them.
On
Thursday, the White House named metallurgy, energy, trade and other areas as
possible targets for action. London and Paris wanted to echo
this. "The Russians have to see where they will hurt," said one
diplomat. Germany , by far Russia 's
biggest trade partner in the EU and the biggest buyer of Russian gas, has
resisted attempts to specify what the sanctions targets might be.
Apart from
its energy dependency, the Germans say they have more than 6,000 firms
operating in Russia and that
300,000 jobs in Germany
depend on trade with Russia .
Cameron was
much more explicit on the issue and British officials admitted there were
divisions. He mentioned "finance, military, energy" as areas being
considered. "There's nothing left out."
That
suggested equal pain for the three big countries since Britain has most to lose from financial
sanctions, France has
billion of euros at stake in defence contracts with Russia ,
while Germany
suffers most from sanctions in the energy sector.
It is not
clear when the European commission will deliver its battle plan for expanded
sanctions but there is an acute feeling among commission officials that Brussels has been handed
a poison chalice. They said as soon as the plans are published or leaked, the
Russians will know what to expect or fear and will get their retaliation in
pre-emptively, triggering a much bigger crisis between Europe and Russia .
The senior
EU official, though, said it would be "really stupid" for the EU to
reveal its hand. "The commission is keeping its cards close to its chest. We
will not do this in full transparency. It will not be transparent at all."
While the
Americans have been much more open in spelling out their plans, the Europeans
complain that it is easier for Washington
because it has much less to lose, with US-Russian trade volumes barely
one-twelfth of that between the EU and Russia .
The senior
official said the blacklist was not coordinated with Washington . "We are following our own
course. The US
is far away."
The EU and
the interim Ukrainian government have now signed part of a political and trade
pact, the issue that led to the crisis last November that ultimately triggered
a revolution in Kiev and Russian intervention in
Crimea .
The EU
summit agreed to race ahead with similar pacts with Moldova
and Georgia ,
concluding them by June.
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