França mais à direita, no voto e
no Governo
DIRECÇÃO
EDITORIAL 01/04/2014 / PÚBLICO
A forma como
François Hollande tem regido os destinos da França, tão errática quanto
demagógica, valeu-lhe uma estrondosa derrota nas eleições municipais do passado
domingo. Se em 2008 os maires de esquerda eram 509 contra 433 de direita, agora
os pratos da balança inverteram-se com forte penalização da esquerda, que
desceu para 349 enquanto a direita subiu para 572 (11 de extrema-direita).
Deste resultado, previsível, tirou o primeiro-ministro Jean-Marc Ayrault as
devidas consequências e demitiu-se. No seu lugar, surge o actual ministro da
Defesa, Manuel Valls, o “socialista de direita” que é mais popular entre os
agora vitoriosos do que nas fileiras do PS francês. Há uma razão para a escolha
de Valls: ele é o ministro mais popular do Governo e 31% dos franceses
gostariam de o ver o lugar que agora ocupará. E Hollande precisa de
popularidade a todo o custo. Mesmo que isso lhe valha, como a prazo valerá, ser
varrido da ribalta.
Manuel Valls, um "socialista
de direita" para governar França
CLARA BARATA 31/03/2014
- PÚBLICO
Hollande nomeou um novo primeiro-ministro para um novo "governo de
combate", após resultados desastrosos nas eleições municipais.
O Presidente
francês, François Hollande, nomeou um novo primeiro-ministro, para "abrir
uma nova fase" na governação, após a pesada derrota nas eleições
municipais. Trata-se de Manuel Valls, até agora ministro do Interior, um
político mais popular entre a direita do que entre os próprios socialistas. O
que se espera, agora, é “um governo de combate”.
"Confiei a
Manuel Valls a missão de conduzir o Governo de França, com uma equipa mais
compacta", explicou o Presidente. A missão imediata é conduzir a bom porto
o Pacto de Responsabilidade, que é a luz orientadora do caminho de França para
os próximos anos.
Este programa
prevê um alívio nos impostos cobrados às empresas e aos trabalhadores
independentes no valor de 30 mil milhões de euros, para incentivar o emprego e
a produção, e economias de 50 mil milhões de euros na despesa pública até 2017
– para satisfazer Bruxelas e reformar o Estado. Em meados de Abril, este pacto
tem de ser apresentado à Comissão Europeia e Paris tem de começar a trabalhar
nele.
O pacto é ponto
assente para Hollande e para o Governo. Mas incomoda as correntes mais à
esquerda do PS francês, que logo na noite eleitoral vieram dizer que este pacto
foi um dos factores que envenenaram os resultados das eleições municipais – em
que os socialistas perderam 151 câmaras, em cidades com mais de 10 mil
habitantes, e viram passar para a direita várias metrópoles com mais de 100 mil
habitantes, incluindo alguns bastiões do PS.
Para compensar,
Hollande falou num novo “pacto de solidariedade”, para que haja mais justiça
social, assente em três pilares: a educação, a segurança social e o aumento do
poder de compra. Isto traduzir-se-ia em mais investimentos na educação e na
saúde e também num plano de redução dos impostos pagos pelas famílias com menos
recursos que poderá vir a ser apresentado no fim de Abril.
A subida de
Manuel Valls ao poder não é o que desejavam, apesar de ele ser o ministro mais
popular do Governo: 31% dos franceses gostaria de o ver como primeiro-ministro,
numa sondagem realizada antes da segunda volta das eleições municipais de
domingo. Jean-Marc Ayrault, que a meio da tarde anunciou ter apresentado a sua
demissão, apenas agradava a 11% dos cidadãos.
A questão é que
Valls é até mais popular à direita do que à esquerda.
A imagem e as
ideias de Valls, um político de 51 anos são, é bastante diferente de Ayrault, e
até mesmo de Hollande. Nascido em Barcelona e naturalizado francês aos 20 anos,
partidário de um socialismo à maneira de Tony Blair, Valls está habituado a
entrar em conflito com o seu próprio partido. Chamam-lhe
o “socialista de direita”.
No Governo de
Ayrault, ganhou notoriedade pela forma intransigente como tem lidado com as
questões da imigração – relativamente ao desmantelamento de acampamentos
ciganos e à deportação de ciganos provenientes de países da União Europeia que
imigram ilegalmente.
Isso deu-lhe
credibilidade junto da direita, mas tornou-o problemático junto da
esquerda.“Escolhe-se o homem mais à direita para responder ao povo de
esquerda?”, espantou-se a senadora Marie-Noëlle Lienemann, representante da ala
esquerda do PS, em declarações ao Le Monde.
Os dois ministros
da Europa Ecologia/Os Verdes, que faz coligação governamental com o PS no
Governo, anunciaram já que não participarão num executivo liderado por Valls.
"Este homem é perigoso"
As
características que o tornam popular junto da direita fazem com que Marine Le
Pen, a líder do partido de extrema-direita e anti-imigração Frente Nacional, o
tema. “Este homem é perigoso. Há que temer o seu domínio. É um homem de
autoridade nas palavras. Valls é um homem da comunicação”, comentou Le Pen, a
outra triunfadora das eleições municipais, além da UMP, o maior partido de
centro-direita.
Após expressar os
seus receios face ao novo primeiro-ministro socialista, denegriu o seu trabalho
no Ministério do Interior – aquilo que o tornou popular entre os eleitores da
direita: “O balanço do trabalho de Valls contra a insegurança é deplorável. Não
obteve resultado nenhum.” O que Hollande está a fazer, considerou, é a
“carbonizar Valls, para lhe esgotar as suas ambições”, disse Le Pen.
Porque se há
traço de carácter que é apontado a Manuel Valls é a ambição – e a ambição
última de um político francês é o Eliseu. Ele não o esconde, e aliás foi um dos
candidatos nas primárias socialistas, ganhas por François Hollande. Mas depois
foi seu director de campanha. No entanto, ao promovê-lo a primeiro-ministro,
Hollande corre o risco de promover um mais do que potencial rival.
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