EDITORIAL/ PÚBLICO
Vai
a Europa conseguir reinventar-se?
DIRECÇÃO EDITORIAL
05/07/2015 - 23:58
Tsipras
está eufórico, mas vai bater num muro real chamado Bruxelas. Para
já, não há sinais de mudança
O Governo grego está
eufórico e tem boas razões para isso. Mais de 60% dos gregos
votaram “não” às exigências da troika, ignorando as ameaças
de fim de mundo repetidas nos últimos dias. A força do “não”
surpreendeu tudo e todos. Foi um “não” de quem já não tem nada
a perder, embora saiba que abre a porta a riscos desconhecidos. Foi
um “não” sofrido depois de dias inimagináveis na Europa
moderna: bancos fechados, lojas e multibancos vazios, farmácias sem
medicamentos, uma economia a viver do dinheiro vivo que resta, velhos
a chorar na rua.
A euforia de Alexis
Tsipras esbarra no entanto num muro real. Tsipras não controla o
processo europeu que é colectivo e tem, para além disso,
desequilíbrios de poder. A União Europeia não é uma federação
na qual cada país tem um voto. Funciona com consensos e, em grande
parte, de acordo com as vontades da Alemanha. Não é justo, mas é a
Europa que temos.
O primeiro balde de
água fria que caiu em cima de Tsipras chegou logo no domingo à
tarde, quando o “não” foi dado como vencedor. Angela Merkel
anunciou que na segunda-feira vai a Paris jantar com François
Hollande. O tema a servir à mesa foi anunciado oficialmente por
Berlim: fazer uma “avaliação comum” da situação europeia
pós-referendo.
Isto significa duas
coisas: que o eixo franco-alemão está a funcionar e que na ressaca
do voto grego nada de politicamente significativo deverá acontecer
antes do jantar no Eliseu. Merkel, para quem o “não” não pode
deixar de ser visto como uma derrota, definiu assim, com um
comunicado de um parágrafo, o tempo europeu. Está prevista uma
cimeira do Eurogrupo na terça-feira, à qual Merkel e Hollande
chegarão provavelmente alinhados para revelar as suas linhas
vermelhas. Não é óbvio o que vão dizer – e sobretudo fazer –
nas próximas horas. Contra a posição da Grécia está o Leste, que
diz ser mais pobre do que a Grécia; o Sul, que teve brutais
programas de austeridade; alguns nórdicos, como a Finlândia.
Tsipras vai chegar eufórico a Bruxelas, mas não será em 24h que
vai fechar um novo acordo. Nem em 48h. É enorme a pressão para se
encontrar uma solução – de analistas, observadores, povos
inteiros, do ex-director do FMI e de Barack Obama. O “não” grego
deveria forçar a Europa a reinventar-se, mas não é certo que isso
aconteça.
Até agora, os
gregos tinham dito que queriam continuar no euro (70%) e que apoiavam
a intransigência de Tsipras (60%). Pareciam vontades inconciliáveis.
Este domingo, votaram “não” à austeridade, reforçando a
quadratura do círculo. O voto foi forte, mas não sem hesitação.
Muitos dos que votaram “sim” disseram “sim” à união com a
Europa, sabendo que estavam a dizer “sim” à austeridade que os
esmaga. Muitos dos que votaram “não” disseram “não” à
troika, sabendo que correm o risco de sair do euro que os esmagará
talvez ainda mais. Passados 150 dias, as perguntas continuam todas em
aberto: Bruxelas vai aceitar uma extensão das maturidades e uma
redução maciça da dívida? Vai ser evitada uma reacção em
cadeia? Vai a Grécia conseguir reformar e modernizar o seu Estado?
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