quinta-feira, 9 de julho de 2015

Grécia aceita mais medidas, Europa abre a porta a alívio da dívida

EDITORIAL / PÚBLICO
Uma porta por onde saem todos a ganhar
DIRECÇÃO EDITORIAL 09/07/2015 - 20:03

A reestruturação da dívida grega poderá ser o factor que fará aproximar a Grécia dos credores
Até agora tem sido pedido à Grécia mais austeridade e reformas em troco de financiamento adicional. Dinheiro quanto baste para que o país se mantenha à tona. Dinheiro quanto baste para que o país possa devolver o dinheiro que esses mesmos credores emprestaram no passado recente. Dinheiro suficiente para que o país não entrasse em bancarrota e pudesse passar mais uma temporada arredado dos mercados de dívida. Mas o fardo da dívida grega, uns dramáticos 170% do PIB, tornou-se incomportável. O país teria de gerar excedentes primários, de uma forma continuada, durante várias décadas para poder honrar o compromisso da dívida. E dinheiro que vai para o serviço da dívida é dinheiro que não vai para economia, para as famílias e empresas.

O problema da dívida grega é estrutural e são cada vez mais os apelos para que os países do euro tentem descortinar uma fórmula para aliviar a dívida, seja através de um perdão parcial, seja através de uma reestruturação que alongue maturidades. A pressão começou a vir do de Washington; primeiro foi o FMI e depois foi o secretário do Tesouro norte-americano, Jack Lew. E agora, deste lado do Atlântico, foi a vez de Donald Tusk se juntar ao coro. O presidente do Conselho Europeu diz que se o governo grego apresentar uma proposta de reformas realista, então “precisa de ter como resposta uma proposta igualmente realista em relação à sustentabilidade da dívida por parte dos seus credores”. Só assim haverá uma situação em que todos ganham.

Para os credores, perdoar parte da dívida grega nada mais é do que garantir que no futuro irão receber a outra parte em falta. Colocar um garrote à Grécia é contribuir para um mais do que anunciado incumprimento. Claro que do lado grego espera-se em contrapartida propostas sérias e que ajudem a equilibrar as contas públicas para que o país possa ter condições de honrar, nem que seja parcialmente, a sua dívida.

Grécia aceita mais medidas, Europa abre a porta a alívio da dívida
SÉRGIO ANÍBAL 09/07/2015 - PÚBLICO

Grécia enviou nova proposta aos credores esta quinta-feira e deve votá-la no parlamento na sexta-feira. O objectivo é obter um acordo já este fim-de-semana que inclua alguma forma de reestruturação de dívida.

O governo grego aceita mais austeridade. Em contrapartida, os outros executivos europeus aceitam uma nova reestruturação de dívida. Apesar de os detalhes da negociação ainda não serem conhecidos, esta parece ser para já a receita encontrada para tentar garantir que até ao próximo domingo se conseguirá chegar a um acordo que evite a saída da Grécia na zona euro.

Em Atenas, o governo liderado por Alexis Tsipras enviou esta quinta-feira à noite para Bruxelas uma proposta que, de acordo com os meios de comunicação social gregos, avança para um pacote de austeridade entre os 12 e os 13 mil milhões de euros, para obter em troca um empréstimo de 50 mil milhões de euros a três anos e uma promessa dos parceiros europeus de alívio dos encargos com a dívida.

A Grécia parece agora disponível para alterar algumas das propostas feitas ao nível do IVA e da Segurança Social, numa tentativa de aproximação às exigências feitas pelas instituições da troika antes da marcação do referendo. O anterior plano, que era para aplicar até ao final de 2016, incluía oito mil milhões de euros de austeridade.

De acordo com o jornal grego E Kathimerini, Alexis Tsipras enfrentou oposição dentro do próprio Executivo para a definição da proposta, nomeadamente por parte de Panagiotis Lafazanis, ministro da Energia e figura de proa da ala mais à esquerda do Syriza.

Ainda assim, o primeiro-ministro grego tem a intenção de levar o documento a votos no parlamento já na manhã desta sexta-feira, numa tentativa de dar garantias aos parceiros europeus de que as medidas propostas são mesmo para cumprir. Tsipras convocou ainda para as primeiras horas da manhã os líderes políticos dos partidos gregos que apoiaram o “sim” no referendo para uma reunião, não só para garantir uma maioria mais segura no voto parlamentar, como também para apresentar uma frente unida grega nas negociações com os credores.

Para se defender das críticas provenientes dentro do seu próprio partido e para explicar à população porque é que teve de realizar cedências poucos dias depois da vitória do “não” no referendo, Tsipras conta poder apresentar como trunfo uma eventual cedência dos outros países da zona euro na concretização de algum tipo de alívio dos encargos da dívida exigidos ao Estado grego.

Durante esta quinta-feira, foram dados diversos sinais de que os líderes europeus estão disponíveis a dar esse trunfo ao primeiro-ministro grego.

O sinal mais claro veio do presidente do Conselho Europeu. Donald Tusk afirmou esta quinta-feira que se a Grécia apresentar uma proposta realista, então “precisa de ter como resposta uma proposta igualmente realista em relação à sustentabilidade da dívida por parte dos seus credores”. Só assim haverá uma situação em que todos ganham, defendeu.

“Caso contrário, iremos continuar a dança letárgica que temos vindo a dançar durante os últimos cinco meses”, afirmou Tusk, que revelou ter estado em contacto esta quinta-feira com o primeiro ministro grego, Alexis Tsipras, mostrando-se esperançado que serão enviadas de Atenas propostas concretas e realistas.

Esta abertura do presidente do Conselho Europeu a medidas que representem um alívio da dívida parece mostrar que os novos apelos realizados na quarta-feira pelo FMI e pela Administração Obama estão a ser ouvidos na Europa. Christine Lagarde reafirmou que tanto as reformas como uma reestruturação da dívida eram necessárias para evitar uma situação de crise aguda. E o secretário do Tesouro norte-americano, Jack Lew, desejou que “a Grécia tome as medidas que precise de tomar para que a Europa reestruture a dívida de uma forma que é mais sustentável”.

Até agora a possibilidade de uma reestruturação da dívida grega, que é detida na sua maioria pelos outros Estados da zona euro, tem sido recebida com muitas reticências pelos responsáveis de grande parte dos governos, que sentem dificuldades em vender às suas próprias opiniões públicas um cenário desse tipo.

Um dos países mais hesitantes é a Alemanha. Esta quinta-feira, tanto a líder do Governo como o ministro das Finanças da Alemanha repetiram a sua oposição a um corte do valor nominal da dívida pública grega, assinalando que tal iria contra os tratados europeus.

No entanto, deixaram uma porta aberta. Quando se referiu ao assunto, Angela Merkel falou da recusa a “uma restruturação da dívida clássica”, referindo-se explicitamente a um corte nominal da dívida. No entanto, neste conceito não estão incluídos outros tipos de reestruturação, como a redução dos juros ou o alargamento do prazo dado para a amortização da dívida. Merkel assinalou mesmo que, em 2012, a Alemanha já tinha aceite prolongar as maturidades da dívida grega, dando a entender que agora poderia acontecer o mesmo.

Wolfgang Schäuble, por seu lado, o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, que participava numa conferência do banco central alemão em Frankfurt, clarificou a posição alemã, declarando que "os tratados europeus excluem um perdão de dívida", mas que o Governo alemão está pronto "a discutir o espaço para uma reestruturação da dívida". Acrescentou, no entanto, que "a margem para uma reestruturação da dívida grega é muito pequena".

Do lado da outra grande potência da zona euro, a França, a abertura para um entendimento deste tipo deve ser ainda maior. A participação das autoridades francesas no esforço de obtenção de um acordo até domingo tem sido muito notada. Uma equipa técnica do executivo francês esteve em Atenas esta quinta-feira para ajudar a limar os detalhes da proposta grega.

Para se chegar a um acordo final, ainda há contudo um percurso longo a percorrer, e de forma rápida. Depois de entregue a proposta grega em Bruxelas, as instituições da troika irão avaliá-la e propor alterações. O objectivo de ambas as partes será o de que se chegue a um texto comum até às 14h de Bruxelas (13h em Lisboa) no sábado, a hora agendada para o início da reunião extraordinária do Eurogrupo.

No encontro dos ministros das Finanças da zona euro, os Governos terão a oportunidade de mostrar a sua opinião sobre um eventual acordo, que será depois exposta na cimeira de líderes da zona euro que está marcada para o próximo domingo às 16h de Bruxelas (15h em Lisboa). Duas horas depois, inicia-se um conselho europeu extraordinário com todos os líderes da União Europeia.


Embora esses encontros sejam vistos como a última oportunidade da Grécia para evitar uma saída da Grécia do euro, o processo não fica ainda concluído aí. Em diversos países, qualquer eventual acordo para a concessão de um novo empréstimo a três anos à Grécia tem de passar pelos respectivos parlamentos. Dada a urgência da situação financeira grega, essas deliberações parlamentares terão de ser feitas nos primeiros dias da próxima semana. Alemanha, Finlândia e países bálticos são aqueles em que se prevê possa haver mais obstáculos à aprovação do resgate.

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