Somos
a próxima Grécia
(Nicolau Santos, in
Expresso, 11/07/2015)
Não vai acontecer
já amanhã, mesmo que a Grécia venha a sair do euro. Nem é
responsabilidade específica do atual Governo ou dos anteriores,
apesar dos erros próprios e da má fortuna. A verdade nua e crua é
que o euro, da forma como está construído, leva inevitavelmente ou
ao enorme endividamento dos países periféricos, colocando-os numa
situação insustentável, ou só se pode permanecer nele pagando
durante décadas com elevadas taxas de desemprego, reduções
drásticas dos custos de trabalho e empobrecimento das famílias,
venda de ativos, esmagamento do Estado social e forte emigração dos
quadros qualificados.
A Grécia pode ser
salva in extremis, mas não tem salvação. Portugal só se manterá
no euro se continuar mansamente a definhar económica, social e
culturalmente, vendo degradar inexoravelmente os seus índices de
bem-estar. E Espanha e Itália também sentirão enormes problemas
para se manterem na Eurolândia.
E tudo isto porque
as condições essenciais para a existência de uma moeda comum
implicavam a livre circulação de trabalhadores e capitais, a
flexibilidade de preços e salários, a coordenação dos ciclos
económicos e um mecanismo federal que compensasse os choques
assimétricos. Contudo, nunca o pensamento dominante na Europa
admitiu alguma vez a existência de fundos que permitissem compensar
os tais choques assimétricos. Pelo contrário, a Alemanha e os que
alinham com Angela Merkel e Wolfgang Schäuble sempre entenderam isso
como uma forma de premiar os Estados gastadores do sul, sendo a
alternativa aplicar-lhes programas punitivos de austeridade. Esta
visão não é compatível com uma zona económica integrada, onde há
diferentes estruturas produtivas e onde os choques externos têm
consequências completamente diferentes que ou são compensadas por
via de transferências ou agravam cada vez mais as desigualdades no
interior da União.
Este euro só pode
produzir, para os países do sul, ou a expulsão da moeda única ou
um lento mas inexorável definhamento
Acresce que o
pensamento neoliberal que domina a Europa é extremamente generoso
para os movimentos de capitais. Daí que tenha sistematicamente
fechado os olhos à existência de paraísos fiscais no interior da
zona euro, permitindo a Estados-membros fazerem concorrência desleal
por via fiscal. O resultado disto vê-se, por exemplo, no facto de a
quase totalidade das empresas do PSI-20, as maiores de Portugal,
terem a sua sede noutros países, onde pagam os impostos resultantes
de lucros que obtiveram no nosso país — o que fragiliza ainda
mais, agora do ponto de vista fiscal, os países periféricos.
Estas falhas,
involuntárias ou intencionais, na construção do euro, têm outras
consequências. Um país com menos receitas tem de reduzir os apoios
sociais e as verbas para a investigação e desenvolvimento. Para ser
competitivo tem de baixar os custos salariais, através do aumento do
desemprego e do enfraquecimento da contratação coletiva. Salários
mais baixos significam que os melhores quadros, cientistas e
investigadores emigram para onde tenham melhores condições. E tem
de vender as suas melhores empresas porque o capital interno
escasseia. Este euro, sem novos mecanismos, só pode produzir, para
os países do sul, ou a inevitável expulsão da moeda única ou um
lento mas inexorável definhamento.
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