Hollande
tenta travar a intransigência alemã
Teresa de Sousa /
13-7-2015 / PÚBLICO
1.O ministro dos
Negócios Estrangeiros do Luxemburgo, Jean Asselborn, avisava ontem a
Alemanha de que um eventual Grexit poderia abrir “um conflito
profundo com a França”, o que seria muito mau para a União
Europeia. Pode não ser um exagero. É um dos cenários possíveis
para esta crise europeia que já leva cinco anos e que volta a
encontrar uma curva apertada no seu caminho, arriscando uma
derrapagem. Até agora, François Hollande e Angela Merkel
conseguiram manter um bom entendimento na gestão da crise do euro,
na sua última versão grega. Mas isso custou ao Presidente francês
um relativo apagamento face à chanceler, que apenas conseguiu romper
quando dos atentados terroristas de Paris. Agora, a questão grega
abriulhe outra oportunidade. Não se distanciou da chanceler ao longo
das atribuladas negociações da troika com o novo Governo grego do
Syriza. Foi tão “surpreendido” quanto ela quando Alexis Tsipras
decidiu romper as negociações e anunciar um referendo. Agora, face
a nova reviravolta do primeiro-ministro grego, está perante uma nova
oportunidade de reestabelecer o lugar da França no xadrez político
europeu. Não vai hostilizar a chanceler nem recorrer ao tom mais
desafiador do primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, que ontem
dizia “já basta”. Mas não vai abdicar de defender posições
distintas, aliás fáceis de compreender.
2. François
Hollande marcou o terreno praticamente desde o dia seguinte ao
referendo, quando recebeu Merkel no Eliseu para discutirem o que era
preciso fazer. Nas declarações à imprensa, o Presidente francês
avisou logo que não ia deixar cair a Grécia, mesmo que a Grécia
tivesse ela própria de fazer a sua parte. Insistiu em que a
credibilidade da Europa estava em causa. Merkel não o contradisse
mas também não o apoiou. A chanceler, segundo a imprensa alemã,
não apreciou o facto de Hollande ter enviado a Atenas um alto
funcionário para ajudar o Governo a elaborar a proposta certa. Mas,
com a nota positiva que as três instituições da troika (BCE,
Comissão e Eurogrupo) deram à nova proposta grega, tinha as
condições reunidas para apresentar uma alternativa. Tanto mais
necessária quanto a intransigência do ministro das Finanças
alemão, Wolfgang Schäuble, acabou por criar no próprio Eurogrupo
um clima de confronto que levou à interrupção abrupta da reunião
de sábado à noite. Mario Draghi falou dos riscos sistémicos, mas
nada disso conseguiu abalar a determinação do ministro alemão, que
nem sequer disfarça sua vontade de empurrar a Grécia para fora do
euro. A já famosa proposta de um Grexit temporário (cinco anos) foi
imediatamente rejeitada como um Grexit disfarçado. “Não há
Grexit temporário (...). Há a Grécia na zona euro ou não há
Grécia na zona euro”, disse o Presidente francês.
O que quer, afinal,
o ministro alemão? Provavelmente, garantir que os Syrizas e os
Podemos não terão vida fácil na união monetária. É uma aposta
arriscada e pouco eficaz, que vai claramente longe demais. O
problema, aliás, não está só em Atenas. Basta ver como os
Verdadeiros Finlandeses, que partilham o governo de Helsínquia,
conseguem ameaçar a Europa com um veto a um terceiro resgate. E
também não é preciso grande imaginação para antever o que
aconteceria à Grécia se saísse do euro e da União Europeia.
Ficaria à deriva, escancarando as portas para o avanço de forças
políticas muito mais assustadoras, como a Aurora Dourada.
Hollande percebe as
razões pelas quais a chanceler desconfia do governo de Atenas. São
perfeitamente legítimas, dado o historial dos últimos cinco meses.
“Perdeu-se a moeda mais importante, que é a confiança”, disse
Merkel antes de entrar na cimeira. É preciso reconquistála. A
diferença está em que o Presidente se distancia dos prazos
irrealistas dados a Alexis Tsipras para provar que é confiável.
Hollande esteve ontem reunido com os seus principais parceiros
socialistas antes da cimeira da zona euro, incluindo o próprio
Sigmar Gabriel, “número dois” de Merkel no governo de grande
coligação que, aparentemente, se quer redimir da dureza com que
tratou a Grécia. A proposta que os socialistas aprovaram dá aos
gregos 10 dias, e não dois, para apresentarem algumas das suas
reformas no Parlamento, e defende a criação de um Fundo gerido em
conjunto por Atenas e pela Comissão (e não apenas por Bruxelas como
queria Schäuble) com os activos a privatizar e a correspondente
dívida a pagar. São exigências pesadas mas muito mais realistas.
3. Ontem as decisões
passaram para as mãos dos líderes da zona euro. Sem Schäuble e com
Merkel, que provavelmente continua a preferir uma solução com a
Grécia dentro, mesmo sabendo como vai ser difícil a batalha no
Bundestag para conseguir a aprovação de um terceiro resgate.
Hollande sabe também que merece o aplauso dos grandes parceiros da
Europa, que olham com horror para o risco de um Grexit e do seu
impacte nos Balcãs Ocidentais e no Médio Oriente, onde a Rússia
joga as suas pedras. Se há coisa em que o Presidente francês tem
razão é a imagem de incapacidade que a Europa daria de si própria,
deixando à deriva um país europeu com uma posição estratégica
fundamental. A chanceler sabe que uma decisão a favor da Grécia
afectará a sua popularidade. Mas sabe também que a Alemanha precisa
da França para liderar a Europa, num momento em que a segurança
subiu na lista das prioridades europeias. A melhor solução seria um
entendimento político entre ambos num momento em que a Europa joga o
seu destino. Só hoje saberemos se foi possível. Entretanto, ninguém
se lembrou que Tsipras vai ter de regressar a casa e que pode passar
rapidamente de herói a traidor.
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