Do
livro à selfie, a Livraria Lello cria “acessos pagos”
RITA NEVES COSTA
15/07/2015 - PÚBLICO
A
conhecida Livraria Lello vai passar a controlar as entradas cobrando
um valor dedutível na compra de livros.
A partir da próxima
quinta-feira, 23 de Julho, para entrar na Livraria Lello, no Porto,
será necessário pagar uma entrada. A pressão turística não é
uma novidade para a cidade e a Livraria Lello é um dos lugares que
não escapa aos guias turísticos. A fila à porta denuncia um
interior caótico repleto de turistas, inúmeras línguas
estrangeiras a pairar no ar e dezenas de câmaras fotográficas e
telemóveis em punho para registar os cantos e recantos de uma
livraria reconhecida cá dentro e lá fora. É para tentar controlar
um pouco este caos que os responsáveis pela Lello querem mudar as
regras de acesso.
Com as novas regras,
passam a existir duas filas de espera, de acordo com a intenção de
quem entra na livraria. De um lado, estarão os portadores do cartão
de cliente, que irá custar 10 euros, dedutíveis nas compras na
livraria ao longo de um ano e que funciona como uma “via verde”.
Na outra fila estarão os turistas e curiosos que precisarão de
pagar três euros para visitar o espaço. No entanto, se estes
visitantes decidirem aumentar as suas bibliotecas pessoais, enquanto
visitam a Lello, o valor da entrada também será deduzido – uma
possibilidade que é válida pelo prazo de um mês após a aquisição
do bilhete.
“O que estamos a
tentar criar aqui é a sensação e o conforto de uma livraria. Não
é só tirar uma selfie e ir embora”, disse José Manuel Lello, um
dos proprietários da livraria. A necessidade de tornar a Lello uma
livraria e não um espaço museológico, onde os livros são
pretridos em favor da fotografia, e de melhorar as condições de
trabalho dos funcionários, levou a que a gerência tivesse ponderado
há bastante tempo os “acessos pagos”.
Confrontado com a
ideia de um cliente ocasional se dirigir à Lello, apenas à procura
de um livro específico e ter de pagar uma quantia para o fazer, o
proprietário considera que a pessoa pode sempre telefonar antes,
consultar a página da Internet ou dirigir-se até ao “centro de
acolhimento”, em frente à Lello, do outro lado da rua. A
experiência da procura in loco poderá desta forma não existir, mas
o tempo ganho pelos portadores do cartão de “via verde” é
suficiente para o cliente ponderar adquirir outro livro, argumenta
José Lello.
O proprietário
garante que não se trata de “obrigar” a comprar, mas se a pessoa
pretender justificar o dinheiro gasto no acesso, para lá do prazer
da visita, os responsáveis pela Lello “ficariam encantados”. “Só
será uma entrada paga, se a pessoa decidir ir a uma livraria e não
adquirir um livro”.
A emblemática
escadaria vermelha no interior, que J.K. Rowling admite ter inspirado
o cenário da saga Harry Potter, está quase sempre congestionada. Se
houvesse semáforos, a circulação tornar-se-ia mais fácil.
Pára-se, sobe-se mais um degrau, espera-se não ser um intruso em
mais uma fotografia alheia e o percurso continua até ao topo.
“Quando um funcionário vem com vários livros empilhados, torna-se
complicado subir as escadas”, admite José Lello.
Maria de Céu está
de visita ao Porto e à livraria. Embora não saiba muito bem que
tipo de impacto a medida terá no estabelecimento, diz que se
voltasse não gastaria três euros na entrada. “As pessoas vêm
mais para visitar e não tanto para comprar”, afirma.
Ana e Rafael vêm do
Rio de Janeiro, estão pela primeira vez na Invicta e consideram a
medida positiva. Ambos pagariam a entrada, porque “perde-se a
livraria com a quantidade de pessoas a tirarem fotografias”.
A 23 de Julho entra
em vigor o acesso pago, com programação cultural na livraria até à
meia-noite. As entradas podem ser adquiridas na Internet ou no centro
de acolhimento.
1 comentário:
Uma casa comercial, em qualquer parte do mundo, é sempre uma 'porta aberta', antes de mais... As pessoas - potenciais Clientes, ou não - são, por natureza, 'benvindas' - comprem, ou não!... O que a 'Lello' deveria fazer, isso sim, era reservar uma parte do seu espaço - mais 'exclusiva', mais simbólica até... - e então, apropriadamente (como se fosse um espaço museológico) cobrar uma quantia - pudesse ela, ou não, ser deduzida na compra de um livro... Agora, assim, parece que se trata, apenas, de facturar o mais que se possa -- mesmo que não haja dinheiro para um 'livrinho'!... Acho, sinceramente, que faz parte não da nobreza da Cultura, ou da História, mas antes duma atitude meramente mercantil (e pindericamente 'nouveau riche', neste caso) que deve estar a fazer dar voltas na campa algum dos fundadores da 'Lello'... Independentemente de os bilhetes serem ou não alvo de cobrança de IVA (e com direito a recibo com NIF? -- mais uma longa fila?).
Já agora, quem virá a seguir? O 'Majestic'? Os 'Pastéis de Belém'? As 'Queijadas de Sintra'...? Ganhem lá juízo, por favor!
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