Barcelona
suspende concessão de licenças para estudar oferta turística
RITA SIZA 05/07/2015
- PÚBLICO
Nova
autarca, Ada Colau, assinou uma moratória de um ano, para estudar e
regular a pressão turística na cidade. Com mais de sete milhões de
visitantes estrangeiros por ano, população começa a revoltar-se
contra os turistas.
Uma suspensão
temporária da concessão de licenças para a construção de hotéis
e outras actividades turísticas, assinada pela nova autarca de
Barcelona, Ada Colau, vai congelar pelo menos 45 novos projectos, já
entregues, ou em vias de o ser, para apreciação pela
municipalidade. No entanto, a medida não vai paralisar os
empreendimentos em marcha nem evitará o crescimento da oferta na
capital da Catalunha, que só nos próximos meses terá em
funcionamento 40 novos hotéis.
A autarca alega que
Barcelona, a terceira cidade mais visitada da Europa (atrás de
Londres e Paris), tem de discutir e regular a pressão que o turismo
está a provocar em certos pontos da cidade, que, com 7,5 milhões de
visitantes internacionais por ano, começa a experimentar um estado
de “fadiga” e até mesmo “irritação” com as inevitáveis
consequências da procura: as queixas mais frequentes dos habitantes
dizem respeito à subida de preços, ao lixo e barulho produzido
pelos estrangeiros, e ao seu “mau comportamento”.
Barcelona, com uma
população de 1,6 milhões de habitantes, tem na actividade
turística uma importante fonte de receitas e de emprego – o sector
responde por uma fatia de 14% do Produto Interno Bruto, e é
responsável por 120 mil postos de trabalho. “O turismo é um
activo da cidade que precisamos de cuidar, mas de forma sustentável.
[Tal como está], está a criar demasiadas tensões”, declarou Ada
Colau, para justificar a nova medida. Em muitas zonas da cidade, do
bairro Gótico às Ramblas, já começaram a aparecer faixas com
slogans que demonstram inequivocamente o descontentamento dos
moradores com a invasão estrangeira: “Tourists go home”, dizem.
Colau, que tomou
posse no passado dia 13 de Junho, encontrou 20 novos pedidos de
licenciamento para a construção de hotéis em cima da mesa. A
cidade tem, actualmente, 377 estabelecimentos hoteleiros, com um
total de 34.769 quartos e 68 mil camas, ou seja, uma média de 21,5
quartos de hotel por cada mil habitantes, que está bem acima da
média de 15 quartos por mil residentes dos oito principais destinos
europeus. E esse valor exclui a oferta adicional de pensões, hostéis
e apartamentos turísticos – que aliás já tinham sido alvo de uma
moratória firmada pelo anterior alcaide, Xavier Trias.
Em defesa da sua
decisão, que foi duramente atacada pela oposição do Partido
Popular como “um disparate, irresponsável e terrível”, Ada
Colau explicou que a moratória dos licenciamentos turísticos é uma
medida “preventiva, cautelar e provisória”, válida por um ano.
“O objectivo não é suspender mas ter tempo para elaborar um novo
plano de forma participativa, para decidir colectivamente em que
bairros é possível [a oferta turística] crescer e em que lugares
esse esforço tem de ser redistribuído”, acrescentou.
Para a autarca,
Barcelona deve evitar a todo o custo que a explosão turística (um
fenómeno que começou a sentir-se após os Jogos Olímpicos de 1992)
resulte numa perda de identidade da cidade, ou da transformação de
“umas zonas em guetos e outras em parques temáticos” – uma
situação que, considera, prejudica seriamente os moradores dos
locais em causa mas também é nociva em termos de atracção de
turistas.
Esse é um argumento
repetido por especialistas e moradores. Ouvido pela AFP, o professor
de Geografia da Universidade de Barcelona, Francesc Lopez Palomeque,
que fez parte da equipa que desenhou o plano de turismo da cidade
para os anos de 2008-13, disse que os últimos 25 anos de crescimento
acelerado do turismo contribuíram para um sentimento de “fobia”
entre a população. “O processo foi demasiado rápido e não foi
bem absorvido pela cidade”, entende. Já para o geógrafo da
Universidade Autónoma de Barcelona, Francesc Munoz, o dilema de
Barcelona é que “se nada for feito, dentro de 30 ou 40 anos poderá
ser como Veneza, uma cidade completamente especializada no turismo”.
Nas famosas Ramblas,
a florista Carolina Palles, que herdou o estabelecimento fundado pela
bisavó em 1888, lamenta que os habitantes de Barcelona já não
procurem aquela avenida, outrora um dos principais pontos de
encontros da cidade. “Agora só há restaurantes de fast-food e
lojas de souvenirs. Perdemos a nossa essência”, considerou.
No mercado histórico
La Boqueria, a AFP encontrou outras queixas contra os turistas.
Xavier Alonso, que tem uma banca de peixe, diz que apesar de o local
ser frequentado por cada vez mais gente, as suas vendas caíram para
metade nos últimos cinco anos. A razão são os turistas: “Os
clientes tradicionais deixaram de cá vir, porque não têm paciência
para as multidões de turistas, que ocupam o espaço todo e os
impedem de mover os carrinhos de compras”, refere.
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