ENTREVISTA
“O ACP é gerido de acordo com os
interesses da família Barbosa”
HUGO DANIEL SOUSA
e PAULO CURADO 28/04/2015 - PÚBLICO
António Raposo Magalhães critica
a gestão e a forma de actuar do actual presidente do Automóvel Clube de
Portugal. Os dois vão a votos na quinta-feira.
O Automóvel Club
de Portugal (ACP) é o maior clube português em número de sócios pagantes (mais
de 190 mil) e factura anualmente cerca de 30 milhões de euros. As eleições para
a direcção estão em curso, graças ao voto por correspondência, e na
quinta-feira realiza-se o acto eleitoral presencial, possível apenas na sede em
Lisboa. António Raposo Magalhães, de 60 anos, passou quase toda a vida
profissional na área dos seguros e da banca. Agora desafia o actual presidente,
Carlos Barbosa, mostrando-se preocupado com a situação financeira do clube e
com a pouca participação dos sócios. A campanha ficou marcada por muitas
acusações e queixas ao Ministério Público, incluindo de espionagem e
irregularidades eleitorais.
PÚBLICO: Que
papel deve ter o ACP na sociedade portuguesa?
Raposo Magalhães:
O ACP deve ter um papel permanentemente participativo e colaborante com tudo o
que tenha a ver com mobilidade. O ACP não é apenas um clube de automobilistas.
É a sua base, mas também são ciclistas, motociclistas, pessoas que andam a pé e
usam transportes públicos. O ACP deve interferir no que é a mobilidade, mas
para ter esse poder interventivo deve ter uma posição de diálogo e não a
posição beligerante de hoje em dia, em que se fazem declarações públicas em que
se destrata o poder autárquico ou o Governo.
Acha que Carlos
Barbosa deu um cunho político ao cargo?
Político não
diria, mas deu um cunho pessoal de uma pessoa de relacionamento difícil. Repare
que tinha uma acção contra o presidente da Câmara do Porto por este ter dito
que gostava de contas à moda do Porto a propósito do Rali de Portugal. Quando
já tinha perdido essa acção, reuniu-se com presidente da câmara e anunciou que
tinha desistido de todas as acções e que nos próximos quatro anos vai organizar
o rali no Porto. O que é uma coisa engraçada. Está em eleições, não sabe se vai
ganhar, ou então já tem a coisa como vencida, e já assume compromissos que
extravasam o mandato.
O clube era próspero quando
chegou este presidente e que hoje tem uma situação bastante deficitária
O seu adversário
lidera o ACP há 11 anos. O senhor é menos conhecido publicamente. Como se
apresenta como a pessoa certa para liderar o clube?
Não sou eu, é uma
equipa de 15 pessoas. Aliás, um dos grandes problemas do actual ACP é que tem
sido liderado por uma pessoa e o resto, sem ofender ninguém, são figuras
relativamente decorativas. O presidente reúne-se com o presidente e decide. Não
é isso que queremos. Queremos trabalho de equipa para repor o ACP como um clube
próspero. Analisámos os balanços dos últimos 11 anos e chegámos à conclusão de
que o clube era próspero quando chegou este presidente e que hoje tem uma
situação bastante deficitária. A resposta que tivemos era que não sabemos ler
balanços, mas isto foi visto por empresas especialistas no assunto. A
prioridade é repor a saúde financeira do clube.
O ACP foi
alargando a sua actividade a mais áreas, além da tradicional assistência em
viagens. Acha que esse crescimento foi sustentado?
Quando este
presidente chegou o ACP já tinha uma mediadora de seguros. O que ele fez foi
comprar uma participação numa sociedade maior e o volume de negócios aumentou,
mas não foi esta direcção que descobriu o negócio dos seguros, nem a
assistência na saúde, embora admita que melhorou.
Tem havido troca
de acusações, queixas no DIAP. Este tipo de conflito pode prejudicar a imagem
do ACP?
Não é bonito, nem
é o que os sócios mais podem desejar. Mas quando estamos a lidar com uma lista
que está instalada, que nomeia os sete membros da comissão eleitoral, quando
esses sete membros são funcionários do clube e dependem hierárquica e
salarialmente do actual presidente e candidato da lista, quando todos os
requerimentos que colocamos ao clube são sempre decididos em prejuízo da lista
A, quando o presidente da comissão eleitoral é candidato pela lista B, quando
não nos dão informação sobre quantas revistas enviadas aos sócios foram
devolvidas, é muito difícil ter uma relação saudável. Temos uma grande
desconfiança desde o princípio.
Tem feito
acusações de irregularidades, porque há sócios que receberam apenas o boletim
de voto de uma das listas, mas a outra lista diz que o problema se limitou a
cerca de 100 casos e que na maioria dos casos a beneficiada até era a sua
lista…
Não é verdade.
Acho que isto foi um erro processual e que não foi intencional. Mas nas
primeiras semanas só houve notícia de duplicação na lista B e só depois
apareceram esporádicas de duplicação de boletins da lista A. Até falámos com as
empresas que estão a fazer este trabalho e explicaram-nos que foi um erro. Nós
conhecemos mais de uma centena de casos. Estão a querer tornar um facto relevante
em algo irrelevante.
Mas genericamente
há condições para um acto eleitoral fiável e justo?
Nem fiável, nem
justo. A comissão eleitoral é afecta a uma lista. Todos os requerimentos que
temos colocado são a favor da lista B ou contra a lista A. Não há nenhuma
razoabilidade.
Vão respeitar os
resultados?
Com certeza que
sim. Mas tudo o que pudermos acrescentar à providência cautelar que
apresentámos, será feito.
É acusado de
espionagem pela lista adversária, que alega que um informático do ACP lhe
passou dados de sócios. Já admitiu que a pessoa em causa é próxima de elementos
da sua lista. Como responde a estas acusações?
O ACP tem 480
colaboradores. A partir desse momento, aconselhámos as pessoas que nos conhecem
a não nos contactarem. Esse senhor é amigo de dois membros da nossa lista, mas
nunca passou informação relevante ou irrelevante.
O senhor Carlos Barbosa dizia que
o ACP era uma paixão, mas com 21 mil euros por mês, e acrescente-lhe mais dez
mil euros de cartão de crédito, é fácil estar ali por paixão
O seu adversário
acusa-o de ter tentado recolher votos em casas de sócios…
Tivemos cerca de
100 jovens universitários, identificados com pólos da nossa lista, e que nunca
disseram que eram da comissão eleitoral, que bateram aleatoriamente à porta de
prédios. Não tinham moradas. Queríamos motivar as pessoas a votar, porque há pessoas
que mandam a revista para o lixo e não sabem que lá dentro estão os boletins de
voto. Até porque o clube 192 mil sócios com direito a voto e só entraram cerca
de 30 mil votos. É uma percentagem baixa. As pessoas participam pouco.
Que críticas faz
à gestão de Carlos Barbosa?
A principal é
financeira. Há 11 anos, o clube era próspero. Tinha 17 milhões de euros em
depósitos, um património vasto, um endividamento ridículo de 1,7 milhões. Agora
é de 14 milhões. Os depósitos desceram para menos de cinco milhões e o passivo
aumentou dez milhões em 11 anos. O resultado líquido acumulado é de 4,8 milhões
negativos. O ACP tem um universo de 480 colaboradores e a grande maioria não
leva para casa mais de mil euros. E depois este ACP recrutou directores e
pessoas da família ou afectos ao actual presidente com salários muito
superiores. O clube não tem um plano de carreiras e é gerido de acordo com os
interesses da família Barbosa.
Confrontámos o
seu adversário com as suas críticas à gestão e ele responde que não lhe
interessa ter dinheiro parado no banco. E alega que fez troca de património.
Em Braga vendeu e
foi para uma rua central, onde paga uma renda. Em Coimbra foi para um centro
comercial, onde paga renda significativa. Em Lisboa, vendeu o edifício na Rosa
Araújo e no Funchal também vendeu e foi para uma loja pequena. Contra factos
não há argumentos. O que comprou foram dois pisos no Prior Velho. Pelas nossas
contas, vendeu oito milhões em património. E o que pergunto é por que é que a
decisão de venda de património passou da assembleia geral para a direcção.
Acha que houve
falta de transparência nessas vendas?
Completa. Vendeu
património histórico sem ter uma justificação. Ele diz que em Coimbra eram
necessários 500 mil euros em obras, mas havia dinheiro para isso e muito mais.
Tem de explicar para onde foram os 12 milhões que desapareceram. Dizem que não
sabemos ler balanços, mas a conclusão a que chegamos é que foram gastos na
gestão corrente.
Defende uma
limitação de mandatos?
Está no nosso
programa levar isso a assembleia geral. Defendo no máximo três mandatos, mas se
os sócios defenderem limitar a dois mandatos não me choca. Isso hoje não existe
e quem lá está quer lá ficar o resto da vida.
Já disse que quer
fazer uma auditoria se for eleito. Porquê?
Temos uma grande
desconfiança em relação às contas publicadas. E é um acto de boa gestão de
qualquer empresa, quer para quem entra, quer para quem sai.
Outras das
polémicas desta campanha foram as notícias não desmentidas de que Carlos
Barbosa recebe 21 mil euros mensais de empresas do ACP. Que modelo de
remuneração defende?
Um grupo empresas
que tem 480 colaboradores e factura 30 milhões de euros por anos tem de ter uma
equipa mínima a full-time. Não pode ser dirigida por um presidente que aparece
esporadicamente, um ou dois dias por semana, e por uma direcção que está
ausente. Defendo uma equipa de três pessoas a tempo inteiro e obviamente
remuneradas. Mas a assembleia geral tem de nomear uma comissão de remuneração
independente que vai decidir o valor, mas tenho a certeza que não vai ser 21
mil euros. Há anos, o senhor Carlos Barbosa fazia declarações de que o ACP era
uma paixão, mas com 21 mil euros, e acrescente-lhe mais dez mil euros de cartão
de crédito, é fácil estar ali por paixão.
Tem dito que quer
devolver o clube aos sócios. O que quer dizer com isso?
Os sócios
participam muito pouco na vida do clube. Antigamente as assembleias gerais eram
bastante participadas, porque decorriam à noite, após o horário laboral. Hoje
faz AG à segunda-feira de manhã.
O Rali de
Portugal não pode ser suportado pelo clube.
Mas o seu
adversário até diz que as assembleias são agora mais participadas…
São e sabe
porquê? Os funcionários do clube têm direito a ser sócios com isenção de
pagamento de quota e com direitos iguais aos outros. Se eu na semana anterior,
só em Lisboa, onde há 200 e tal colaboradores, disser que na segunda-feira há
assembleia geral e têm de estar na sede do clube, acha que eles não vão? E
depois o voto é de mão no ar.
O que pretende
mudar?
O voto nas
assembleias gerais tem de ser por voto secreto. A segunda coisa é ter AG a
horas que vão ao encontro das disponibilidades dos sócios. E chamá-los a vir às
delegações. E queremos instituir o voto electrónico e permitir o voto nas
delegações. Os sócios não vão à AG, não lêem os relatórios e contas. Queixam-se
que não são informados, mas também procuram pouca informação.
Como é normal,
cada candidato apresenta os seus apoiantes. No seu caso teve a particularidade
de receber o apoio dos presidentes dos três maiores clubes de futebol e de Rui
Rio, que habitualmente não está do mesmo lado de Pinto da Costa. Como
conseguiu?
São os
presidentes dos três maiores clubes desportivos do país, que têm uma
notoriedade maior do que o ACP, embora o ACP tenha mais sócios pagantes do que
qualquer um deles. O apoio é o reconhecimento dessas três figuras de que o ACP
é um grande clube, transversal à sociedade, e que se calhar merece outra visão
e outra gestão. Estou grato que isso tenha acontecido, como estou grato ao
ex-presidente da Câmara do Porto por o ter feito, independente de haver pessoas
que apoiam a lista com as quais ele não tem comunhão de ideias [noutras áreas].
O Rali de
Portugal realiza-se em Maio, pouco depois das eleições. O seu adversário diz
que se perder as eleições, a equipa dele sai a 30 de Abril e a organização da
prova passa a ser um problema da nova direcção. Teme pela realização do rali?
Não temo nada.
Isso é uma chantagem deselegante, porque as pessoas que fazem o Rali de
Portugal são profissionais que têm dado muito ao desporto. São pessoas
altamente responsáveis e não acredito que, a 20 e tal dias de uma prova do
Mundial de Ralis, venham dizer aos portugueses que vão sair. São pessoas
contratadas e remuneradas. Não me parece que ACP tenha falhado com eles. É um
bluff. Isso não me preocupa dois segundos.
Manteve contactos
com a organização do Rali?
Não. Até porque
provavelmente teriam instruções para não terem contacto connosco.
Acha que o rali
deve continuar no Norte ou rodar pelo país?
O Rali de
Portugal pode ocorrer a Norte, no Sul ou no Centro. Está a jogar-se com as
emoções das pessoas. Esteve no Algarve e correu muito bem. Depois quiseram
jogar com a parte emocional, porque é verdade que os adeptos do desporto
automóvel estão muito mais a Norte do que a Sul. Em termos de paisagens, até
provavelmente há mais bonitas a Norte do que a Sul. Mas não tenho para mim que
o Rali tenha de se realizar apenas no Norte. O melhor dos mundos era rodar pelo
país, até porque a zona Centro também tem troços emblemáticos.
Há acordo para
Rali ser no Norte por quatro anos…
Falei com
câmaras, umas envolvidas no rali deste ano e outras não, e não tenho informação
de que os compromissos estejam assumidos. Para já neste momento, nenhum dos
subsídios, sejam do poder local, ou QREN, está garantido. O Rali de Portugal,
que deve custar qualquer coisa entre três e quatro milhões de euros, vai a
suporte das contas dos clubes. Depois disso, vamos ver que apoios se
recolheram, porque já vi o actual presidente dizer que cada município vai dar
100 mil euros e alguns já me disseram que nem 50 mil. É uma forma pouca airosa
de pôr pressão nos políticos. Faz lembrar a questão do apoio ao Rali no
Algarve, em que só apareceu um milhão de euros e os governantes disseram que
não havia nada assinado e que o que havia era uma declaração do presidente do
ACP a falar em dois milhões.
O actual
presidente do ACP faz agora parte dos órgãos da FIA. Acha que esses lugares são
importantes para manter o Rali de Portugal no Mundial?
Já no passado, o
senhor César Torres, também esteve na FIA. Quando se organiza uma prova do
Mundial, provavelmente tem-se lugar na FIA, por inerência de funções. Amanhã
outro presidente qualquer terá a mesma posição.
Se for eleito, o
rali continuará a ser uma prioridade?
Obviamente que
sim. Mas o rali tem de garantir à partida apoios dos organismos públicos. O
rali não pode ser suportado pelo clube. Uma das razões para as contas estarem
assim é que todos os anos o Rali de Portugal dá prejuízo.
Pode quantificar?
Este ano, pelos
valores que consegui perceber, o Rali de Portugal deve imputar um resultado
negativo nas contas do clube entre 800 mil a um milhão de euros. O Clube tem de
continuar a lutar pelo rali, mas deve ter a capacidade de angariar os fundos
necessários junto dos políticos e não o conseguirá fazer se andar
permanentemente em litígio.
Na Europa temos
assistido a um movimento de restrições à circulação automóvel nas cidades,
desde portagens a estacionamento mais caro. Que modelo de cidade defende?
O ACP tem de
participar activamente na melhoria das condições de vida nas cidades. É
evidente que os municípios estão condicionados pelas regras da União Europeia.
Aqui e ali posso discordar de algumas medidas tomadas, mas devemos encontrar
formas de diálogo com os municípios, sem atitude beligerante. É irreversível
que as cidades fiquem mais fechadas à deslocação de automóveis poluentes e se
aposte nos meios de locomoção eléctricos.
Amanhã entrevista
a Carlos Barbosa
ENTREVISTA
Carlos Barbosa e o salário de 21
mil euros: “Sou pago como os gestores de empresas”
PAULO CURADO e
HUGO DANIEL SOUSA 29/04/2015 / PÚBLICO
Actual presidente do Automóvel
Club de Portugal rebate críticas ao seu salário e à sua gestão. Instituição
estava “completamente podre”, diz.
Carlos Barbosa
lidera o Automóvel Club de Portugal (ACP) há 11 anos e recandidata-se para um
novo mandato, desta vez tendo como adversário António Raposo Magalhães. O
gestor, de 65 anos, com carreira feita nos media, diz que o ACP estava morto
quando entrou e argumenta que hoje “funciona lindamente”. Numa campanha marcada
por muitas críticas e polémica, acusa a lista adversária de espionagem e
defende que o salário que recebe está ao nível do que é praticado em empresas
com o mesmo volume de negócios (30 milhões de euros por ano) do ACP, um clube
com 190 mil sócios pagantes. Os votos por correspondência estão em curso e na
quinta-feira realiza-se o acto eleitoral presencial, só possível na sede, em
Lisboa.
Que papel deve
ter o ACP na sociedade portuguesa?
Carlos Barbosa:
Hoje em dia, o ACP é um parceiro, o que não era, da sociedade portuguesa em
tudo o que é mobilidade. Temos uma participação activa na legislação sobre
segurança rodoviária. Isso dá-me uma grande alegria, porque o ACP não era
ouvido para nada e hoje é ouvido em tudo o que está relacionado com mobilidade.
Em relação aos sócios, conseguimos transformar um clube que estava morto, a
perder sócios todos os dias, numa entidade com seis empresas e 15 unidades de
negócio, que funciona lindamente e que serve cada vez melhor os sócios, quer na
saúde, quer na assistência em viagem, em que somos número um em Portugal.
A campanha tem
sido virulenta, com queixas ao DIAP das duas partes. Acha que isto prejudica
imagem do ACP?
Desconhecemos
qualquer processo da outra parte no DIAP, mas acho que a lista opositora, com
esta campanha ignóbil, suja a imagem do ACP, porque durante dez anos os meus
adversários tiveram a oportunidade de ver que tudo o que dizem não corresponde
à verdade. Tiveram oportunidade de vir a assembleias gerais e nunca apareceram.
Falam sem saber. Falam das contas, mas não sabem ler balanços. Tudo o que o
presidente faz é escrutinado por uma série de órgãos. Não posso comprar, vender
ou alienar património sem passar por vários crivos.
Mas acusam-no de
ser centralizador…
O presidente do
ACP tem de ser interventivo, porque representa o clube exteriormente. O
presidente dá a cara, depois de as decisões serem tomadas pela direcção.
Uma das acusações
que lhe é feita é de usar o ACP como púlpito de afirmação pessoal…
Eu não preciso do
ACP para ter notoriedade nenhuma. Mas para defender os interesses dos
automobilistas, motociclistas, ciclistas e peões, é claro que me vou pôr em
bicos de pés. Outra coisa que a outra lista não percebeu é que o ACP tem
estatuto de defesa de consumidor, pelo que estamos a defender não só os sócios,
mas também os não-sócios.
Ainda sobre os
sócios, é acusado de convocar assembleias gerais para horas pouco indicadas,
como as manhãs de dias de semana…
As assembleias
gerais (AG) do ACP são à hora normal das AG de empresas. Quando eram às horas
que eles dizem [noite], a média era de 39 sócios presentes. A média que temos
agora é de 62 sócios.
Acusou a lista
adversária de espionagem, alegando que um informático lhe passou dados…
Não vou falar
desse caso, porque está em segredo de justiça. Descobrimos que uma pessoa cá de
dentro passava informações para fora. Entregámos o caso à Judiciária e à Comissão
Nacional de Protecção de Dados. Não sou eu que vou denunciar os receptores
dessa informação, mas é estranho como a outra lista andava de porta em porta a
recolher votos em nome do ACP, com camisolas e cartões do ACP. Como é que
tinham acesso às moradas? É que andavam a bater só a algumas portas.
A lista
adversária tem criticado a sua gestão, por ter alienado património.
Os dois andares
na rua Rosa Araújo, que não nos serviam para nada, foram alienados em 2006. Com
esse dinheiro, comprámos mais dois andares no Prior Velho. Em Braga, a
delegação estava num sítio pequeno e agora está no centro da cidade e
quintuplicámos o número de sócios. O edifício tinha sido comprado por 148 mil
euros e vendemos por 230 mil. Em Coimbra, o edifício estava podre. Só para
reparar, eram necessários 600 mil euros e não tínhamos capacidade financeira
para o fazer. Além disso, estava em frente à estação de comboios, sem lugar
para estacionar. Mudámos primeiro para o centro e agora para um centro
comercial. Duplicámos o número de sócios em Coimbra. O edifício tinha sido comprado por 224 mil
euros e foi vendido por 550 mil euros.
Para onde foi
esse dinheiro?
Aplicámos este
dinheiro nas outras delegações. Só a obra no Porto custou 750 mil euros. A
delegação de Aveiro caiu e fomos obrigados a refazê-la, o que nos custou 225
mil euros. No fundo, a venda de património foi uma troca. Apanhámos um
património a cair de podre.
Como vê a
situação financeira do clube, que tem sido muito criticada pela outra lista?
Estamos com um
volume de negócios de cerca de 30 milhões por ano quando em 2004 era de sete
milhões. Em 2014, tivemos um resultado líquido de 195 mil euros. O EBIDTA
(lucros antes de juros, impostos,depreciações e amortizações) dos últimos três
anos, nas contas consolidadas, é muito positivo: 529 mil euros positivos em
2012, 587 mil em 2013 e 492 mil em 2014. Eles não sabem ler um relatório e
contas. Tivemos de fazer provisões em relação a um processo que tínhamos em
tribunal com a Repsol. As nossas contas são auditadas, até porque temos de as
mostrar ao Estado porque somos uma entidade de utilidade pública.
Mas o passivo
subiu?
O que se passou é
que não me interessa ter 17 milhões de euros no banco. O dinheiro é para ser
utilizado em benefício dos sócios. Hoje tenho dois ou três milhões no banco,
mas tenho 25 delegações, todas com obras feitas. Facturo três vezes mais. Se
deixasse ficar o dinheiro no banco e a perder sócios todos os anos, o clube
tinha acabado. Era preciso reinventar o clube, que foi o que esta direcção fez,
para termos mais sócios e mais serviços.
Mas o passivo
cresceu para quase 18 milhões…
O que me
interessa é o EBIDTA. Isso é que prova a frescura do negócio. Os rácios de
autonomia financeira são superiores a 50%. É rara a empresa portuguesa que tem
isto. Financeiramente, estamos muito saudáveis. É verdade que temos um
empréstimo de três milhões de euros à Caixa, mas já pagámos um milhão e temos
um spread de 0,75%, o que é nada. E vamos concentrar os nossos serviços todos
no Prior Velho. Se olharmos para lá fora, a maioria dos clubes tem uma grande
sede fora da cidade e depois lojas no centro.
O ACP foi
alargando os serviços para áreas como os seguros e a assistência médica. Esse
crescimento foi sustentado?
Completamente.
Antigamente era tudo ao molho e fé em Deus. Não havia discriminação por centro
de custos. Separámos por unidades e fechámos algumas coisas, ou limpamos
outras, como o ACP Viagens. Agora temos seis pessoas, em vez de 28, no ACP
Viagens e ganhamos dinheiro. Antes perdíamos. É que hoje em dia a maioria das
pessoas marca viagens pela Internet. Mas como temos uma média de idades de
sócios de 60 anos, ainda há algumas pessoas que querem acompanhamento e
aconselhamento. Por isso, prestamos esse serviço aos sócios, mas é um negócio
que não interessa nada. Mas eu não inventei nada. Bastou copiar o que se passa
lá fora. Não é possível, hoje em dia, no panorama europeu, haver um clube
destes que seja um clube de amigos. Isto era dominado por uma família e agora
não é dominado por ninguém.
Que família?
Isto era
completamente dominado pela família de César Torres. Como é possível que
durante 18 anos o Rali de Portugal tenha sido feito fora do ACP e que nunca
tenha entrado um tostão de receitas, mas todos os anos o clube pagava os custos
dessa prova? De 1980 a
1997, o rali foi feito pelo César Torres e pela mulher fora do ACP sem entrar
um tostão de receitas e com o ACP a pagar todas as despesas.
Está há 11 anos à
frente do ACP, o que é um período considerável. O que lhe falta fazer que
justifique esta recandidatura?
Não acho que 11
anos sejam muito tempo numa instituição como esta. No primeiro ano percebi como
era a situação do clube. O clube estava completamente podre. E não sabem o
trabalho que deu nestes dez anos pôr o clube como está. E ainda não está como
eu quero. Temos capacidade de dar mais uma série de serviços, porque a máquina
está a rolar. No próximo ano, vamos disponibilizar ambulâncias para o
transporte de doentes. Isso é um acrescento a um esquema de saúde. O drama foi
montar o esquema de saúde. Acusam-me de fazer publicidade este ano. Este seguro
“a idade não conta” demorou dez meses a negociar e agora temos de vender o
seguro. A publicidade faz parte do plano de negócio. Isto hoje em dia já não é
gerido como no tempo da velha senhora. Se um negócio não funciona, fecha. Se
funciona, vamos explorá-lo, como é o caso da assistência de viagem. Temos ganho
os concursos do ARC (Associação Europeia Clubes de Automóveis), que é quem
distribui pela Europa a assistência das grandes marcas. Isto demorou nove anos.
O tempo passou a correr.
O que falta então
fazer?
Na assistência em
viagem, temos grande concorrência das seguradoras, mas elas não reparam, não
desenrascam. Se alguém for com a família para o Algarve e o carro avariar no
caminho, o ACP desempana e a pessoa segue viagem. As companhias de seguros
rebocam para o concessionário. Demorámos anos a formar as pessoas. Todos os
condutores de reboques são mecânicos. Não estou aqui há muito tempo. Tudo isto
passa num ápice. Hoje temos seis empresas e 15 unidades de negócio.
Outro dos temas
polémicos desta campanha foram as notícias, não desmentidas, de que recebe 21
mil euros por mês de empresas do ACP…
Todos os
anteriores presidentes e membros da direcção recebiam ordenados. Tenho aqui
documentos que mostram salários de mil e três mil contos [5000 e 15.000 euros].
Eu nunca recebi um tostão do ACP, porque é uma instituição de utilidade pública
sem fins lucrativos. Agora das empresas que geram o que geram, recebo. Se
tivesse de pôr gestores em cada uma das seis empresas, pagava muito mais. Eu
sou pago como os gestores de empresas com a mesma facturação. Mais, foi a
assembleia geral dessas empresas que aprovou [o salário] e a comissão de
vencimentos que aprovou [o valor].
Portanto, este
modelo é para manter…
Eu passo aqui 24
horas por dia. Quem vier para cá, tem de passar cá 24 horas por dia. O passado
já não existe e mesmo assim recebiam todos. Isto hoje em dia é um grupo
empresarial e qualquer CEO que venha tem de ser pago. Temos de ter aqui pessoas
competentes. E eu só comecei a receber depois de a assembleia geral do ACP me
ter autorizado em 2008. Ou seja, só recebo desde 2010 e dos seguros só recebo
desde 2013. Foi tudo escrutinado e aprovado em assembleia geral.
A lista A tem
exigido uma auditoria independente?
Não faz sentido,
porque temos um auditor, a KPMG. Se eles têm na lista deles o presidente da
Deloitte como membro da direcção – o que acho mal –, basta ver o que a KPMG
fez. O pedido de auditoria é conversa eleitoral.
Vai mudar o
processo eleitoral depois das queixas de irregularidades que houve? Enviar um
boletim de voto por cada lista para os sócios parece um pouco anacrónico…
Pode sempre melhorar-se
o processo eleitoral. Há aqui uma questão mecânica, porque os boletins vão
encartados na revista. Os erros detectados foram comunicados à comissão
eleitoral e imediatamente corrigidos. Agora, não posso controlar uma máquina
que vai embalar 190 mil revistas, com 190 mil boletins e envelopes. Mesmo
quando concorri sozinho, havia erros. Quem me dera que o processo eleitoral
fosse melhorado, porque custa uma pipa de massa.
Quanto?
Estamos a falar
de muitos milhares de euros. Imagine o que é enviar 190 mil boletins duas
vezes.
As eleições
realizam-se pouco antes do Rali de Portugal. O timing é acertado?
Estamos aqui para
ganhar as eleições. Se eu perder as eleições, a minha equipa sai no dia 30 de
Abril e o rali é um problema da próxima direcção.
Mas isso pode
afectar a realização do rali deste ano?
A minha equipa
sai comigo. A lista concorrente sabia que há rali três semanas depois das
eleições.
Porque defende a
realização do Rali de Portugal no Norte nos próximos quatro anos?
O Mundial de
ralis (WRC) está a expandir-se e quanto mais ralis houver fora da Europa, menos
haverá na Europa. A ideia da FIA [Federação Internacional do Automóvel] é ter
seis na Europa. Portugal está no leque dos dois melhores, juntamente com a
Finlândia. E não podemos correr o risco de sair do WRC. A FIA quer os ralis
onde haja emoção, público e especiais difíceis. Que era o que não acontecia no
Algarve. Quando regressámos ao Mundial de ralis, o Algarve era o melhor sítio
para o caderno de encargos da FIA. Recebeu-nos de braços abertos e nunca vou
esquecer o que fizeram por nós. O rali no Norte encaixa no novo caderno de
encargos. E em 2016 queremos voltar a Arganil. Faz parte da história. E como
perdemos os apoios do Turismo de Portugal, temos de ir atrás das autarquias que
nos apoiam. E o Norte foi excepcional. As 15 câmaras disseram que iam arranjar
o dinheiro, um milhão de euros. O Turismo do Norte fez uma candidatura à CCDR
para ir buscar essa verba.
A perda do apoio
do Turismo de Portugal foi um revés…
Perdi
inaceitavelmente o apoio do Turismo de Portugal (um milhão de euros). O Estado
não apoia o maior evento turístico desde o Euro 2004, que acontece todos os
anos. O Rali representa 105 milhões de euros de retorno para o país. É uma
medida desajustada e prejudica a promoção turística que se fazia lá fora.
Sobre a
mobilidade, cada vez há mais restrições à circulação automóvel nas cidades. Como
é a sua visão sobre o tema?
Todas as cidades
que recorreram a portagens, como Londres, estão arruinadas. O sistema para
controlar a entrada em Londres é mais caro do que as receitas que gera. O
problema em Portugal é que não conseguimos fazer, como nas grandes cidades
europeias, parques de estacionamento à entrada das cidades que permitem que as
pessoas usem depois os transportes públicos. Quando Ana Paula Vitorino era
secretária de Estado dos Transportes e Carmona Rodrigues presidente da Câmara
de Lisboa, nós propusemos que os lugares de estacionamento dos estádios da Luz
e de Alvalade fossem durante a semana utilizados para estacionamento para quem
tivesse um passe especial, que depois poderia usar nos transportes públicos. Até
hoje nenhum Governo quis aprovar isso. É esta política que as autarquias não
têm posto em prática. Além disso, os transportes públicos são maus. Devia haver
mais corredores BUS. Outro exemplo é o comboio da ponte. Os parques na margem
Sul do Tejo são caros. Tenho funcionários que vão ao parque e se está cheio vêm
de carro para Lisboa. Se não está, deixam o carro e vêm de comboio.
E o
estacionamento nas cidades…
Estou de acordo
que o estacionamento à superfície seja caro. Agora, quem vem trabalhar, não
pode ter carro à superfície e colocar moeda de quatro em quatro horas. Deve
estacionar debaixo de terra. Precisamos de mais parques subterrâneos e com
preços mais acessíveis. Outra coisa é que não temos policiamento aos carros
parados em segunda fila. Um carro em segunda fila representa sete minutos de
atraso no trânsito.
Surpreendeu-o que
o seu adversário tenha reunido o apoio dos três presidentes dos grandes clubes
de futebol?
Que eu saiba o
Luís Filipe Vieira retirou-se do apoio [o candidato da lista A mantém que é
apoiado pelo presidente do Benfica]. O Bruno de Carvalho perdeu as eleições
contra mim no Sporting: é normal. E o Pinto da Costa desconheço. São os apoios
da lista deles. A minha comissão de honra vale dez vezes mais do que os três
presidentes dos clubes. E à laia de graça, posso dizer que o apoio do Pinto da
Costa deve ter sido pedido por Rui Rio [igualmente apoiante de Raposo
Magalhães].