Hollande
e Merkel apelam à união para evitar "o fim da Europa"
ALEXANDRE MARTINS
07/10/2015 – PÚBLICO
Discurso
histórico dos dois líderes no Parlamento Europeu, num momento
decisivo: "Não precisamos de menos Europa mas sim de mais
Europa. A Europa deve afirmar-se, ou então assistiremos ao fim da
Europa."
Os líderes da
Alemanha e de França foram esta quarta-feira ao Parlamento Europeu
lançar um apelo emotivo ao fim das divisões na União Europeia, em
duas declarações a uma só voz que soaram a última oportunidade.
Para François Hollande, a forma como a crise dos refugiados e
migrantes está a ser gerida pode fazer o continente "regressar
ao tempo das fronteiras nacionais", o que equivale a dizer,
segundo o Presidente francês, que pode estar próximo "o fim da
Europa" tal como a conhecemos.
A presença no
Parlamento Europeu de ambos os líderes do eixo franco-alemão,
histórico motor da construção europeia, foi ela própria uma forte
mensagem. Foi a primeira vez que tal aconteceu desde Novembro de
1989, quando Helmut Kohl e François Mitterrand foram juntos a
Estrasburgo incentivar os seus parceiros a estarem à altura dos
acontecimentos dessa época – a queda do Muro de Berlim, que
acontecera semanas antes, e a posterior reunificação alemã, tendo
como pano de fundo o desmembramento da União Soviética.
Vinte e seis anos
depois, a Europa enfrenta novos desafios, igualmente determinantes
para o seu futuro, e foi por isso que Angela Merkel e François
Hollande decidiram fazer uma prova de vida da influência conjunta de
Berlim e Paris.
François Hollande
foi o primeiro dois dois líderes a discursar, e deixou claro que a
União Europeia só tem um futuro se não ultrapassar as suas
divergências actuais – ou seja, não ter futuro nenhum.
"Não
precisamos de menos Europa mas sim de mais Europa. A Europa deve
afirmar-se, ou então assistiremos ao fim da Europa, à nossa morte",
afirmou o Presidente francês, dirigindo-se aos líderes europeus que
defendem uma maior transferência de poderes para os governos de cada
país.
Hollande admitiu que
as instituições da União Europeia – e, naturalmente, os seus
líderes – "foram lentos a perceber que as tragédias no Médio
Oriente e em África teriam consequências para a própria Europa",
mas defendeu que agora é tempo de tentar emendar os erros do
passado.
Para isso, os países
da União Europeia devem "sair das suas conchas nacionais",
numa referência indirecta a países como a República Checa,
Hungria, Eslováquia e Roménia, que rejeitaram a imposição de um
sistema de quotas para receber cerca de 120.000 refugiados nos
próximos tempos – uma proposta aprovada em Setembro por outros 23
membros da União Europeia e com a abstenção da Finlândia.
"Temos de
enfrentar esta tragédia humanitária que é o influxo de refugiados.
A única solução é uma Europa forte", reafirmou François
Hollande.
Regras de asilo esão
"obsoletas"
Num tom semelhante,
a chanceler alemã, Angela Merkel, disse que "os esforços
nacionais isolados não são uma solução para a crise dos
refugiados", e afirmou que as regras para a obtenção de asilo
na União Europeia estão "obsoletas".
"Sejamos
honestos, o Protocolo de Dublin, na sua forma actual, está obsoleto.
A verdade é que não provou ser sustentável face aos desafios nas
nossas fronteiras. Por essa razão, defendo um novo acordo que
preveja uma justa e equitativa partilha deste problema", disse
Merkel.
De acordo com o
Protocolo de Dublin, um refugiado tem de pedir asilo no primeiro país
a que chega na União Europeia, mas não é isso que tem acontecido.
Milhares de pessoas têm como objectivo chegar a países como a
Alemanha ou a Suécia, e não querem ser registadas na Grécia, que
enfrenta graves dificuldades económicas. Depois, vêem-se numa
espécie de jogo do empurra em países como a Hungria, a Croácia ou
a Eslovénia, onde muitas também não chegam a ser registadas.
O risco de uma
deriva nacionalista na Europa foi um dos temas que mais se fez ouvir
por entre as palavras da chanceler alemã, numa crítica ao
crescimento de partidos como a Frente Nacional, em França, e à
actuação do governo húngaro, de Viktor Orbán, que mandou
construir várias vedações ao longo da fronteira com a Sérvia e
com a Croácia para impedir a entrada de mais refugiados e migrantes.
Sem se referir
directamente à Hungria, Angela Merkel disse que respostas como a
construção de vedações não fazem sentido nos dias de hoje, numa
época em que "os eventos a nível global afectam a Europa, quer
se queira, quer não".
"Temos de
reconhecer que, mesmo que nos tentássemos isolar completamente,
pagando o preço de termos pessoas a sofrer nas nossas fronteiras,
isso não iria ajudar ninguém. Fechar-nos e isolar-nos na época da
Internet é uma ilusão. Não se resolveria nenhum problema, e
surgiriam outros problemas graves."
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