Moradores da Baixa e da Sé dizem-se
saturados de tantos autocarros turísticos
POR O CORVO • 22 JUNHO, 2017 •
A circulação e o estacionamento de autocarros turísticos de
grande dimensão pelas ruas da Baixa pombalina e da zona da Sé estão a
contribuir para uma rápida degradação da qualidade de vida naquelas áreas. O
problema tem vindo a intensificar-se, nos últimos anos, à medida do crescimento
do fluxo de turistas a visitarem a capital portuguesa. Os moradores reclamam,
por isso, a actuação das autoridades municipais, dando assim continuidade a
queixas que já não são de hoje. O presidente da Junta de Freguesia de Santa
Maria Maior, Miguel Coelho (PS), reconhece-lhes razão e tem vindo a exigir
medidas à Câmara Municipal de Lisboa (CML), desde há mais de dois anos. Mas no
terreno pouco se vê. Como consequência, o PSD pede a rápida criação de um muito
prometido regulamento, que, entre outras coisas, permita “interditar o trânsito
de autocarros turísticos em algumas artérias de zonas históricas”.
A proposta dos
social-democratas, parte de uma recomendação a apresentar na próxima sessão da
Assembleia Municipal de Lisboa (AML), coincide com muitas das exigências feitas
por um grupo de residentes, que, a 6 de junho, enviou uma carta a Fernando
Medina (PS), presidente da CML, e a Miguel Coelho, denunciado tal cenário e
solicitando a tomada de medidas para o contrariar. E elas passam, sobretudo,
por “necessidade de interditar a zona da Sé a autocarros turísticos e
restringir a passagem dos mesmos na Baixa de Lisboa, assim como o seu
estacionamento em toda a área (incluindo o Rossio, onde não raro se vêem vários
autocarros estacionados em linha)”. “Vimos também alertar para o estacionamento
selvagem na zona da Sé e da Baixa e para a necessidade de maior fiscalização e
acção da polícia municipal”, acrescentam.
Dizendo compreender a
importância económica da actividade turística, os autores da carta – assinada
por mais de nove dezenas de residentes – dizem, todavia, não aceitar que a
mesma implique “infracções à lei” e “situações de perigo”, bem como o
sacrifício dos que ali habitam permanentemente. “Na generalidade das cidades
europeias cujos centros históricos atraem muito turismo, os turistas vão a pé
até aos monumentos. É incompreensível que em Lisboa se permita parqueamento de
pesados de turismo no meio da estrada à porta da Sé, inclusive obstaculizando a
respectiva visibilidade”, escrevem. “A zona não tem condições para a passagem e
muito menos estacionamento de veículos pesados; o estacionamento só pode
efectuar-se em contravenção do Código da Estrada, mas estranhamente, ao longo
de décadas, é notória a tolerância das autoridades face à ilegalidade”,
acrescentam.
Replicando o que
alguns haviam dito a O Corvo, há quase dois anos, os moradores dizem na missiva
que quem reside junto à Sé sofre, há anos, com especial acuidade. É descrito um
quadro de “inferno de trânsito e de engarrafamentos, com casos de perigo
público (quando se obrigam os veículos que sobem a Rua de Santo António à Sé a
avançar em contramão num local sem visibilidade), causados pela passagem e
estacionamento, na estrada, de enormes autocarros turísticos”. O que, notam,
faz perigar a circulação de veículos de emergência. Por causa disso, e
apontando a recente criação pela Câmara Municipal do Porto de um regulamento
para veículos turísticos, os subscritores pedem a Medina “que tome as medidas
necessárias para assegurar, desde já, o cumprimento da lei no que se refere ao
estacionamento quer de autocarros quer de carrinhas turísticas em frente à Sé e
nas imediações” e que “que interdite a entrada de pesados na zona, que é
demasiado estreita para a circulação destes veículos”.
No mesmo sentido vai
a proposta do PSD, a discutir na assembleia municipal, a 27 de junho
(terça-feira). O texto assinado pela eleita Margarida Saavedra recomenda à
câmara que “estude a possibilidade de criação de áreas de paragem exclusivas
para autocarros turísticos, de forma a que os mesmos não condicionem o trânsito
nas zonas históricas” e “estude a possibilidade de interditar o trânsito de
autocarros turísticos em algumas artérias de zonas históricas”. Mas também pede
à autarquia informações “sobre os últimos desenvolvimentos relativamente ao
anunciado Regulamento Municipal respeitante à Circulação de Veículos Afectos à
Actividade de Animação Turística, que esteve em consulta pública no início
deste ano”.
Nos considerandos à
sua recomendação, os social-democratas consideram que o crescente afluxo de
turistas se “reflecte numa pressão sobre a cidade a todos os níveis – uma
realidade inegável, e que tem causado dificuldades aos seus moradores”,
apontando a Baixa e o Chiado como áreas particularmente sensíveis. “Para além
de vários outros problemas já identificados, o transporte dos turistas para
essas zonas é um dos principais problemas com que a cidade tem neste momento de
lidar – qualquer lisboeta já se apercebeu das dificuldades que existem no
trânsito causadas pelos autocarros turísticos”, escreve Margarida Saavedra. E
acrescenta: “Em zonas como o Bairro Alto, Sé ou Rossio, os ditos autocarros
entopem o trânsito, chegando mesmo a estacionar de forma abusiva em algumas
áreas, condicionando o dia a dia de quem quer continuar a viver em Lisboa”.
Questionado por O
Corvo sobre as queixas dos moradores, o presidente da Junta de Freguesia de
Santa Maria Maior diz concordar plenamente com as mesmas e até confessa
desconhecer as razões pelas quais os autocarros continuam a circular naquelas
zonas. “Por mim, já não poderiam entrar há muito tempo. Trata-se de algo
manifestamente agressivo, quer para os residentes, quer para quem ali passa ou
até para os próprios turistas, que não podem desfrutar dos monumentos em
condições”, afirma Miguel Coelho, que considera ser este um problema “crónico”
causado por “falta de fiscalização”. O autarca assume que tem falado
“recorrentemente” com a CML sobre esta questão. Apesar disso, o problema mantém-se.
Pior, parece ter-se agravado, concede. “Isto, como está, não faz sentido. Quem
trabalha no turismo, ou arranja veículos mais pequenos ou então encontra forma
de levar as pessoas a andar pé naquela zona”, preconiza.
Texto: Samuel Alemão
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