Mentiroso és tu, diz Trump ao
ex-director do FBI
Presidente norte-americano está
disposto a prestar declarações sob juramento. Garante que não pediu lealdade a
James Comey e dá a entender que não tem gravações das conversas entre os dois.
ALEXANDRE MARTINS 10 de Junho de 2017, 19:26
O duelo entre o Presidente dos Estados Unidos e o
ex-director do FBI parece cada vez mais uma daquelas zaragatas no recreio da escola,
em que dois miúdos se acusam mutuamente de serem os maiores mentirosos do mundo
enquanto um desafia o outro a ser o primeiro a tocar-lhe nem que seja só com um
dedo. Depois de James Comey ter afirmado, sob juramento, que Donald Trump está
a mentir, agora é a vez de Donald Trump acusar James Comey de ser um mentiroso
– e de afirmar que também está disposto a dizer isso sob juramento.
Nem 80%, nem 90%, nem 99%: "100%" é a percentagem
de garantia que o Presidente norte-americano deu a um jornalista durante uma
conferência de imprensa na Casa Branca, sexta-feira, quando foi questionado
sobre se está disposto a desmentir o ex-director do FBI sob juramento.
"Teria todo o gosto em dizer-lhe precisamente o que acabei de dizer",
reforçou Donald Trump, referindo-se ao novo responsável pela investigação do
FBI sobre a ingerência russa, Robert Mueller.
Poucas horas depois, a Comissão de Serviços Secretos da
Câmara dos Representantes anunciou que pediu aos responsáveis da Casa Branca
para responderem por escrito a duas perguntas: se têm alguma gravação das
conversas entre Donald Trump e James Comey e, se a resposta for sim, se por
acaso não querem enviá-las aos congressistas.
Trump não foi convidado para estar presente em nenhuma das
comissões do Congresso que estão a investigar a ingerência russa nas eleições
presidenciais norte-americanas do ano passado, e muito dificilmente os
responsáveis por essas comissões vão perguntar ao Presidente dos Estados Unidos
se quer sentar-se ali numa cadeira e ser confrontado com afirmações do director
do FBI que ele despediu.
Para além disso, é possível que os seus conselheiros e
advogados estejam a dizer-lhe neste momento que ele não devia ter dito aquilo
nos jardins da Casa Branca, ao lado do Presidente da Roménia e perante um
batalhão de jornalistas.
Só que Donald Trump tinha sido forçado a deixar de ser
Donald Trump na quinta-feira, quando foi aconselhado a ficar longe do Twitter
enquanto James Comey estava a depor na Comissão de Serviços Secretos do Senado.
Logo na sexta-feira de madrugada, escreveu um tweet: disse que Comey acabou por
lhe dar razão e chamou-lhe leaker – uma palavra que apenas serve para descrever
alguém que entrega documentos sensíveis a jornalistas, e que no Twitter de
Trump ganha uma conotação mais negativa do que ladrão.
Donald J. Trump ✔
@realDonaldTrump
Despite so many false statements and lies, total and
complete vindication...and WOW, Comey is a leaker!
12:10 PM - 9 Jun 2017
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Mas, afinal, o que é que Donald Trump disse na conferência
de imprensa na Casa Branca? Disse que não pediu a James Comey para deixar cair
a investigação ao ex-conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn, e que
também não lhe pediu lealdade. Estas duas questões são centrais na discussão
sobre se Trump poderá vir a ser um dia acusado de obstrução à justiça, o que
poderia resultar num processo de destituição – à falta de testemunhas das
conversas entre os dois responsáveis, e perante o mistério sobre a existência
ou não de gravações em áudio ou vídeo, as comissões de inquérito só podem
comparar as notas que James Comey foi tirando dessas conversas com a palavra do
Presidente dos Estados Unidos da América.
Por exemplo, quando Richard Nixon pediu a demissão para
evitar o impeachment, em 1974, havia cassetes; e quando Bill Clinton foi alvo
de pedido de destituição (posteriormente chumbado) por perjúrio e obstrução à
justiça, em 1998, havia um vestido azul manchado pelo Presidente.
E é por se sentir aos comandos deste jogo que Donald Trump
disse que não tem problemas em falar sob juramento: na mesma conferência de
imprensa em que desmentiu as duas principais acusações de James Comey, o
Presidente norte-americano alimentou ainda mais o mistério das gravações.
Numa mensagem partilhada no Twitter no dia 12 de Maio (três
dias depois de ter despedido o director do FBI), Trump disse que Comey devia
preparar-se para a divulgação de "gravações" das conversas entre os
dois, se decidisse passar informações aos jornalistas (no mundo de Trump, uma
palavra entre aspas significa que, muito provavelmente, essa palavra não
significa precisamente aquilo que significa, pelo que "gravações"
pode ser qualquer coisa entre memorandos e registos em áudio ou vídeo).
Donald J. Trump ✔
@realDonaldTrump
James Comey better hope that there are no "tapes"
of our conversations before he starts leaking to the press!
2:26 PM - 12 May 2017
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As notas das conversas entre Comey e Trump foram publicadas
pelo The New York Times no dia 15 de Maio, e na passada quinta-feira James
Comey admitiu no Senado que foi ele o responsável por essa fuga – entregou os
documentos a um amigo, que depois os leu a jornalistas.
Na sexta-feira, na conferência de imprensa na Casa Branca,
Trump disse que vai falar sobre as tais "gravações" num "período
de tempo muito curto", mas acrescentou uma frase, em resposta aos
jornalistas, que pode indicar que não existem registos nenhuns: "Quando
ouvirem a resposta, vão ficar muito desiludidos."
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