Fenda do icebergue gigante da
Antárctida dividiu-se em duas
A fissura num grande bloco de gelo,
na plataforma Larsen C, partiu-se em duas, assumindo a forma de uma língua de
cobra. A separação do icebergue está para muito breve, avisam os vigilantes
cientistas.
ANDREA CUNHA FREITAS 4 de Maio de 2017, 7:45
Há vários meses que o bloco de gelo é notícia, relatando-se
cada avanço da fissura na plataforma Larsen C. Actualmente, existem 180
quilómetros de uma fenda aberta no gelo da Antárctida que foi crescendo a um
ritmo impressionante nos últimos meses. O final é mais ou menos previsível: um
icebergue gigante, com cinco mil quilómetros quadrados, vai soltar-se da
plataforma. E depois?
Está quase. Desde Fevereiro que a fenda na plataforma Larsen
C parecia ter abrandado a sua progressão no gelo, mas a 1 de Maio foi observada
uma mudança no cenário branco. Uma das pontas do risco no gelo abriu-se em
duas, apresentando agora uma bifurcação semelhante à língua de uma cobra. O
“novo ramo”, que nasceu dez quilómetros antes do fim da fenda, surgiu mais
perto do mar e dirige-se para a frente de gelo, segundo os dados recolhidos
pelo cientistas do Projecto Midas, da Universidade de Swansea, no País de Gales
(Reino Unido) que acompanham a evolução da plataforma Larsen C. O ramo que
actualmente terá cerca de dez quilómetros de comprimento não aumenta o tamanho
da fenda original, mas deverá aumentar a fragilidade do bloco do gelo formando
uma ponta com duas brechas.
Em Janeiro, quando só havia uma fenda, o rasgo no gelo já
tinha cerca de 175 quilómetros, faltavam 20 para se partir. Agora, com o tal
abrandamento registado desde Fevereiro, as duas pontas quase paralelas da fenda
chegam aos 180 quilómetros. Segundo os investigadores, a abertura deste novo
ramo terá surgido quando a fissura original atingiu gelo mais macio e por isso
mais difícil de se fracturar, transferindo a pressão e tensão para outra zona
do bloco.
Segundo uma publicação dos investigadores no site do
Projecto Midas, a observação directa do novo ramo da fenda é difícil por causa
do Inverno que está actualmente instalado na Antárctida. Assim, explicam na
nota, as observações foram apoiadas nas imagens de interferometria recolhidas
pelos satélites Sentinela, da Agência Espacial Europeia. “Embora o comprimento
da fenda tenha ficado estável durante vários meses, tem crescido de forma
constante, a taxas superiores a um metro por dia. Este alargamento tem
aumentado sensivelmente desde o desenvolvimento do novo ramo, como pode ser
visto nas medições da velocidade do fluxo de gelo”, referem os cientistas.
E agora?
Quando este bloco de gelo se separar, a plataforma Larsen C
perderá mais de 10% da sua área, fazendo com que a frente de gelo fique na
posição mais recuada de sempre. “Este fenómeno vai mudar de forma fundamental a
paisagem da Península Antárctica”, dizem os investigadores dedicados ao
Projecto Midas, lembrando que a “nova configuração será menos estável”. Por
outro lado, referem que é possível que a Larsen C siga o exemplo da sua vizinha
(Larsen B), que se desintegrou em 2002, após um fenómeno semelhante ao que está
agora a acontecer.
As lições aprendidas com a desintegração da Larsen A e a
Larsen B, em 1995 e 2002, mostram também que a entrada no oceano destes grandes
blocos de gelo, que são a parte final dos glaciares, aumenta o nível do mar.
Ao Inverno que alonga as noites na Antárctida e dificulta as
observações e ao gelo macio, soma-se outro factor que pode acelerar o
inevitável desfecho da separação do icebergue. O centro de investigação British
Antarctic Survey publicou na semana passada um estudo que mostra que naquela
zona sopra actualmente um especial vento quente (foehn) que cai sobre as
montanhas da península para a plataforma de gelo Larsen C e que pode ajudar a
derrete-la. Se um dia ocorrer o colapso da Larsen C (e para confirmar se isto
acontece ainda será preciso esperar muito tempo), não será um caso inédito.
A lista de plataformas de gelo que se partiram, recuaram ou
perderam volume nas últimas décadas é longa. Faz parte do ciclo de vida dos
glaciares. Uma das explicações para este tipo de fenómenos está centrada nas
alterações climáticas. E a Península Antárctica é dos locais que têm estado a
aquecer mais depressa no planeta: desde 1950, a temperatura média anual do ar
subiu cerca de três graus Celsius. Porém, esta separação do icebergue da
plataforma flutuante de gelo poderá ter também causas naturais, uma vez que os
colapsos destas placas são frequentemente o resultado de questões dinâmicas. O
mais provável mesmo será estarmos a assistir ao resultado da força da natureza,
empurrada pela mão humana.
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