Descoberta doca do século XVII nas
obras do Hospital CUF, em Alcântara
Ritmo das obras de construção do
hospital teve de ser ajustado, o que pode significar um atraso na conclusão dos
trabalhos.
JOÃO PEDRO PINCHA 9 de Maio de 2017, 12:22
Foi encontrada recentemente uma doca do século XVII nas
obras de construção de um hospital na zona de Alcântara, em Lisboa. Trata-se da
doca do Baluarte do Sacramento, uma estrutura militar construída em 1652 por
iniciativa do rei D. João IV.
A descoberta não foi uma surpresa, uma vez que a doca
constava de mapas antigos daquela área. “O achado mais relevante foi também o
mais expectável”, diz Inês Mendes da Silva, coordenadora das escavações
realizadas no terreno de Alcântara. A especialista da empresa Era – Arqueologia
sublinha ao PÚBLICO que “até ao momento todos os achados arqueológicos
identificados já se achavam cartografados em plantas antigas”.
Antes mesmo de porem a doca a descoberto, os arqueólogos
tinham já detectado os destroços de pelo menos uma pequena embarcação de
madeira naquele local. “Pelas suas dimensões”, explica Inês Mendes da Silva,
“deduz-se que [a doca] seria para ser utilizada por embarcações de pequeno
porte, nomeadamente de apoio ao comércio local” e que “terá estado em uso até
meados do séc XIX”.
Foi nessa época que se aterrou toda aquela zona e a cidade
se expandiu ainda mais para junto do rio. Até há poucos meses, quando começaram
as obras de construção do futuro Hospital CUF Tejo, a área teve sucessivas
ocupações. A última, que aliás foi motivo de controvérsia aquando da aprovação
do projecto do hospital, foi de serviços da Câmara Municipal de Lisboa,
entretanto deslocalizados para os Olivais. “A doca apresentava algumas
afectações decorrentes da implantação de diversas infra-estruturas entre os
séculos XIX e XX”, continua a arqueóloga, mas ainda assim tinha um estado de
conservação geral “razoavelmente bom”.
Esta estrutura portuária foi erguida aquando da construção
de dois baluartes na zona, que tinham como finalidade defender Lisboa e a
entrada do estuário. A ribeira de Alcântara, que corre – hoje subterraneamente
– perto deste local, “não constituía um limite suficientemente eficaz para a
defesa da capital depois da Restauração da Independência em 1640”, refere Inês
Mendes da Silva. É por isso que, em 1650, “D. João IV dá ordens para a
elaboração de um projecto geral de fortificação que vai definir as fronteiras
da cidade até ao século XIX”. Os baluartes do Sacramento e do Livramento foram
erigidos dois anos depois.
Por causa desta descoberta, a obra do hospital viu-se
obrigada a “ajustar o seu ritmo aos necessários procedimentos de preservação”,
disse ao PÚBLICO fonte oficial da José de Mello Saúde. Isto pode significar,
embora a mesma fonte não o explicite, que a construção do futuro Hospital CUF
Tejo poderá demorar mais do que o inicialmente previsto.
A José de Mello Saúde conta ter o novo hospital a funcionar
em 2019. O equipamento, que vai custar mais de cem milhões de euros, terá seis
pisos à superfície, três pisos subterrâneos para estacionamento e um jardim
virado à Avenida da Índia. O Hospital CUF Tejo está a ser construído no chamado
"triângulo dourado", um terreno com mais de 20 mil metros quadrados
em frente à estação de comboios de Alcântara-Mar, na esquina entre as Avenidas
da Índia e 24 de Julho.
De acordo com a José de Mello Saúde, o achado “foi
cuidadosamente avaliado, catalogado e recolhido por uma equipa de arqueólogos,
estando já a ser estudada a possibilidade de integração no projecto por uma
equipa técnica em coordenação com a DGPC.”
Essa integração nunca passará, no entanto, por uma
manutenção in situ. “Considerando a posição da estrutura arqueológica, não é
viável”, refere Inês Mendes da Silva. A arqueóloga diz que “os dados arqueológicos
resultantes dum trabalho desta natureza são sempre fundamentais para se
complementar de forma objectiva o conhecimento das pré-existências” e sublinha
que “é através deste tipo de projectos que se torna possível aceder a estes
contextos que, de outra forma, não seria possível conhecer.”
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