Inquilinos com rendas baixas estão a
ser aliciados a deixar os centros históricos. Há menos 140 mil rendas antigas
desde 2011
Ana Margarida Pinheiro 30.05.2017 / 00:11
Há muitos proprietários a tentar esvaziar as casas para
passar a receber turistas, aproveitando a inflação dos preços das casas em
resultado, em grande parte, do boom do alojamento local. Nos bairros históricos
de Lisboa e Porto, especialmente, alguns inquilinos, mais idosos e com rendas
mais baixas, estão a ser convidados a sair para que os espaços possam ser
convertidos em alojamentos de curta duração, denuncia Romão Lavadinho,
presidente da Associação de Inquilinos Lisbonense. “Muitos inquilinos estão a
ser pressionados pelas agências imobiliárias e pelos proprietários para sair.
São pessoas que moram naqueles imóveis há 30, 40, e até 50 anos, todas com
contratos anteriores a 1990 – os contratos de arrendamento antigos”. A
Associação do Alojamento Local (ALEP) não nega a existência destas situações,
mas o presidente Eduardo Miranda assume que “o grande doente”, e origem do
problema, é o mercado de arrendamento tradicional. “Do ponto de vista do
proprietário qualquer coisa é mais atrativo do que ter rendas baixas e este é
um problema criado pelas regras de 2012 [alterações à lei do arrendamento]. É
também um problema social que tem de ser resolvido”, disse ao Dinheiro Vivo,
lembrando que convites à saída, como têm acontecido na Mouraria ou na Graça
“têm muito mais a ver com grandes obras e com proprietários que querem libertar
os espaços para venda do que com alojamento local direto”. Quem compra,
assegura, é que muitas das vezes avança para a opção de alojamento. “Muitos são
investidores internacionais”. As estatísticas não permitem saber quantas
pessoas estão a receber propostas desta natureza, mas segundo a associação que
representa os inquilinos, em 2011 havia 255 mil rendas antigas em Portugal;
agora são apenas 115 mil. “Desapareceram em cinco anos, segundo os números que
o ministério nos cedeu, 140 mil rendas antigas, o que é explicado por duas vias
– a causa natural, que é a morte dos inquilinos, ou o fim dos contratos para
que as casas fiquem livres”, confessa Romão Lavadinho. “Não sei ao certo
quantos encaixam nesta segunda causa, mas sei que são dezenas, são muitos”. Há
ainda que esteja a ser despejado diretamente, como aconteceu recentemente no
número 25 da Rua dos Lagares, na Mouraria, onde há umas semanas os inquilinos
receberam uma ordem coletiva de despejo para dar lugar a novos apartamentos
turísticos. Este caso mereceu intervenção da Câmara e pode não chegar a
avançar. A associação tem sido procurada por dezenas de inquilinos a pedir
aconselhamento, mas Romão Lavadinho admite que há pouco a fazer. “É
perfeitamente possível não aceitar propostas desta natureza, mas está sempre na
mão do inquilino. Falamos de pessoas de 70 ou 80 anos, que recebem reformas
mínimas e para quem uma indemnização entre 10 e 30 mil euros é muito dinheiro”.
Muitos acabam por aceitar os valores oferecidos “e regressam para as terras
onde têm uma casa de família”. Em Portugal existem mais de 42 mil alojamentos
locais registados. A grande maioria em Lisboa e, dentro da capital, predomina
(86%) em seis freguesias. O maior volume está em Santa Maria Maior e Misericórdia,
onde “em 2012 havia 17 500 imóveis vagos”, conta Eduardo Miranda, da ALEP,
admitindo que “o alojamento local veio ocupar 38% dos imóveis vagos”. Se se
juntar as segundas residências o número sobe para 26 mil. “Toda a discussão em
torno do alojamento local centra-se nestas seis freguesias, nas restantes 18
não é relevante”. E deixa um alerta: existe em Portugal um erro de perceção
deste negócio, causado pela enorme vaga de turistas que tem chegado a Portugal,
e que “dá a ideia de um lucro constante” que Eduardo Miranda diz ser uma
miragem. É que entre despesas de manutenção, plataformas de publicidade, e
impostos, 50% das receitas deixam de existir. “Daquilo que conhecemos, neste
momento colocar uma casa de raiz no alojamento local não é comportável.
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