Pombos de Lisboa deixam de ser
considerados uma “praga” e passam a ser controlados em pombais contraceptivos
POR O CORVO • 26 MAIO, 2017 •
Um pequeno passo para
os humanos, um gigantesco passo para os pombos, denotando uma clara mudança
civilizacional. A partir de agora, e de forma gradual, a Câmara Municipal de
Lisboa deixará de tratar os pombos como uma praga, para passar a vê-los como animais
iguais a cães e a gatos. “A prazo, iremos acabar com a prática do abate de
pombos, reflectindo a mudança de política que estamos agora a iniciar”,
garantiu Duarte Cordeiro, vice-presidente da autarquia, na tarde desta
quinta-feira (25 de maio), no Parque Silva Porto, em Benfica, durante a
inauguração do primeiro pombal contraceptivo da capital. A entrada em
funcionamento deste projecto, tornado possível por ser um dos vencedores do
Orçamento Participativo 2016, marca uma mudança de paradigma.
Até ao final do ano,
a câmara quer criar mais sete unidades iguais à que inicia agora actividade na
Mata de Benfica, desencadeando uma nova prática de controlo da população destas
aves, assim evitando a captura e o abate. Nos pombais da futura rede municipal,
com a colaboração das juntas de freguesia e o trabalho de grupos de
voluntários, proceder-se-á à retirada dos novos ovos de pombos, ao fim de dois
ou três dias, antes da formação do embrião, evitando-se assim a reprodução.
“Este é, sem dúvida, o método mais eficaz, melhor que todos os outros que temos
vindo a aplicar. O que nos leva a ter uma maior esperança de garantir uma
convivência pacífica entre pombos e humanos”, disse Duarte Cordeiro, que
destacou a grande importância dos voluntários, inscritos no banco de
voluntariado da capital, para o eficaz funcionamento do processo.
Foi um grupo deles, aliás, quem lançou a ideia na origem do
projecto vencedor do OP 2016 inaugurado nesta quinta-feira. Orçado em 20 mil
euros, consiste num conjunto de cerca de quatro dezenas de casulos instalados
num antigo pombal existente no coração do Parque Silva Porto. Atraídos, através
de água e alimento, a esta estrutura agora reabilitada, os pombos tentarão ali
proceder à nidificação, deixando os seus ovos. E é a partir desse momento que
os voluntários – neste caso, são cinco – terão de retirar os ovos e no seu
lugar colocar ovos de plástico (foto de abertura), tentando assim enganar as
aves. Para que o processo seja eficaz, e os pombos não venham a recusar este
poiso por se aperceberem que estão a ser enganados, haverá que deixar singrar
uma ninhada por ano. Utilizando os novos pombais contraceptivos deixarão de
fazer ninhos em telhados, parapeitos e monumentos. Os ganhos patrimoniais serão
óbvios, diz a câmara.
Se tudo correr bem,
deixarão de existir razões para que tanta gente nutra um ódio particular para
com os pombos – havendo a ideia mais ou menos generalizado de que são o
equivalente a “ratos com asas”. Há, contudo, quem não pense assim. “Os pombos
também são animais sensientes, como os cães e os gatos. E este método que agora
se põe em prática é o único método ético de controlo da população que conheço.
Trata-se de uma alternativa à violência inaceitável a que os pombos têm sido
sujeitos em Lisboa, através da captura com canhão de rede e abate”, disse a O
Corvo Joana Antunes, uma das voluntárias deste pombal e autora da proposta
vencedora do Orçamento Participativo 2016 que conduziu à criação da primeira
infra-estrutura do género na cidade – que também garante tratamento veterinário
às aves que o necessitem. “Esta solução foi testada com sucesso noutros países,
como a Alemanha”, disse Inês Drummond (PS), presidente da Junta de Freguesia de
Benfica.
Alguns minutos
depois, a voluntária Joana Antunes, jurista de formação, não se deixou
constranger pela solenidade da inauguração e não perdeu a oportunidade para
denunciar o que considera ser “o massacre de pombos” perpetrado, até agora,
pela autarquia. Prática que deverá terminar com a criação desta rede municipal
de pombais contraceptivos. “Não é consentânea com os tempos actuais a forma
como a Câmara Municipal de Lisboa trata os pombos. Temos de pôr fim às capturas
com canhão de rede e abate. Será uma forma de Lisboa ficar na vanguarda do
tratamento ético de todos os animais, não apenas de cães e gatos”, frisou.
Ideia que recebeu a concordância de Duarte Cordeiro, tendo o vice-presidente da
autarquia lembrado a “viragem” iniciada na forma como os animais são tratados,
com a inauguração, há três anos, Monsanto, da Casa dos Animais de Lisboa.
Também nesse caso, a abolição do abate de cães e gatos constituiu uma novidade.
Texto: Samuel Alemão
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