Pequeno apontamento do nível de “conteúdos”
da campanha eleitoral em Lisboa
OVOODOCORVO
Monárquicos recomendam "saia
larga ou calças" a Assunção Cristas
14.05.2017 14:53 por Lusa
http://www.sabado.pt/portugal/detalhe/monarquicos-recomendam-saia-larga-ou-calcas-a-assuncao-cristas
Assunção Cristas assinou com o MPT e o PPM um acordo de
coligação para a candidatura autárquica a Lisboa
Assunção Cristas assinou este domingo com o MPT - Partido da
Terra e o PPM (Partido Popular Monárquico) um acordo de coligação para a
candidatura autárquica a Lisboa, com o vice-presidente do partido monárquico a
defender que, para trabalhar, usa-se saia larga ou, se necessário, calças.
O vice-presidente do PPM, Gonçalo da Câmara Pereira, começou
por elogiar a "experiência académica, social e política" da
presidente do CDS-PP, Assunção Cristas, mas considerou que, "acima de
tudo", a candidata é "uma mulher casada, que provou, como a maioria
das portuguesas pode trabalhar e ter filhos", já que "não descurou o
trabalho e não descurou a casa".
Depois de assinar o acordo de coligação com o CDS-PP, MPT e
o PPM, na sede do CDS-PP, o vice-presidente do partido monárquico pretendeu
estabelecer uma analogia entre a mulher e a cidade, afirmando que Lisboa é,
neste momento, "agradável à vista e fotogénica, mas de espartilho e saia
travada". "Com dificuldade em respirar e andar, não trabalha e vive
da foto", disse.
"Como mulher, a dr.ª Assunção Cristas sabe bem que,
para se trabalhar, não se pode usar espartilho nem a saia travada, a saia tem
de ser larga e, se necessário, vestir calças, calças que ultimamente não se
sabe onde andam, custam a ver", afirmou Gonçalo da Câmara Pereira, após a
assinatura do acordo, na sede do CDS-PP, Lisboa.
O vice-presidente do Partido Popular Monárquico criticou o
mandato de atual presidente da Câmara, Fernando Medina, afirmando que
transformou a cidade numa "cidade de ócio", com muitas bicicletas e
"corridinhas em fato de treino", limitando a circulação automóvel de
quem trabalha e vive na capital.
Na sua intervenção, Assunção Cristas disse que a candidatura
conta com o apoio daqueles partidos, mas também "é aberta a simpatizantes
e conta com independentes", com o objectivo de "pôr fim a dez anos de
governação socialista".
"Pensar numa Lisboa do século XXI, é uma Lisboa que
olha em primeiro lugar para aqueles que são mais pobres e em situação de maior
carência, que estão na Lisboa esquecida e abandonada por dez anos de governação
socialista", disse.
E, em resposta ao vice-presidente do PPM, Assunção Cristas
disse que tem "calçado botas e calças de ganga muitas vezes, para estar
nos bairros sociais junto das pessoas que não conhecem visitas por parte do
executivo camarário, exceptuando da polícia quando é para os pôr fora das suas
casas".
Além da área social, Cristas disse ainda dar prioridade à mobilidade,
afirmando que os que vivem e trabalham na cidade "não se conseguem mexer
nem à superfície nem debaixo de terra", devido ao trânsito e aos problemas
dos transportes colectivos.
Questionada pelos jornalistas, Assunção Cristas não divulgou
os termos do acordo assinado no que respeita ao peso de cada partido na
composição das listas e remeteu para mais tarde a divulgação do nome da
coligação.
Pelo MPT - Partido da Terra, José Inácio Faria afirmou que o
seu partido foi dos primeiros a apresentar candidatura própria, que retirou
face ao convite do CDS-PP e elogiou a candidatura de Assunção Cristas como
"de coragem, séria" e "a única viável neste momento".
"Os problemas de Lisboa com as obras, o turismo que
afastou os lisboetas da cidade" foram alguns dos pontos críticos
identificados pelo dirigente do MPT, considerando que a candidatura para
terminar com "dez anos ininterruptos de governo socialista é para
ganhar".
Espartilho e saia travada ou botas e
calças de ganga
E, pergunto eu, quem é que esta gente
julga que é? Presumem que governar uma cidade é dar pão aos pobres, como se dá
milho aos pombos?
RUTE LIMA
16 de Maio de 2017, 5:41
Estava eu a sair de uma conferência alusiva à Europa e à
importância do Parlamento Europeu, maquilhada, vestindo calças justas, salto
alto, blazer cintado (sem espartilho) e um penteado lindo de morrer, quando sou
surpreendida com uma notícia que dava conta do mais puro machismo, vomitado com
orgulho pelo vice-presidente do PPM, Gonçalo da Câmara Pereira, e com a
candidata Assunção Cristas, do CDS-PP, a assistir, sorridente.
Pude ver, segundos depois, o vídeo da assinatura do acordo
coligatório entre o CDS-PP e o PPM para as autárquicas 2017. Tive vergonha,
muita vergonha. Por dois motivos. Primeiro, pela forma e tom com que Gonçalo da
Câmara Pereira alude, de forma encapotada, às mulheres e sua indumentária.
Depois, pela forma simpática e sorridente com que Assunção Cristas “embuchou”
aquelas palavras, como se ela própria de um homem se tratasse, rematando, para
piorar o cenário já por si “horribilis”, que calça botas e veste calças de
ganga para visitar bairros sociais.
Este momento só pode ter sido um take de ensaio para um
programa de humor, mas negro. As primeiras palavras, claro, vão para o
cavalheiro monárquico, mas extensíveis à candidata. Se percebesse alguma coisa
de mulheres do atual século, ao invés de as ver só a passear na Avenida, iria
perceber que a mulher atual já não quer saber, sequer, da opinião do homem para
a escolha da indumentária. Iria perceber que a mulher, após vários séculos de
luta pela igualdade plena de direitos, de luta pela exigência e alcance de
respeito enquanto mulher, mãe e trabalhadora, já não tem paciência nem admite
manifestações machistas, excêntricas, grosseiras e grotescas de devaneios
despropositados por parte de homens desajustados do atual contexto social e
politico.
É absolutamente inadmissível este tipo de desconsiderações
por parte de quem devia ter a responsabilidade única de possuir, de forma
inata, uma postura orientada para a igualdade dos direitos humanos, em especial
a de género, com a agravante de a candidata do CDS-PP aceitar de forma cúmplice
esse manifesto de machismo escandaloso, provavelmente considerando, de forma
convicta, que o seu dever é somente viver para cuidar da casa, dos filhos, do
marido, trabalhando sim, mas de saia larga como antigamente. Tive, efetivamente
e com desgosto, uma visão do inferno. Não vale tudo, não podemos perder o
Norte.
Mas logo de seguida, segundos depois, percebi porque não
acabou a candidata Assunção Cristas com aquele discurso vergonhoso (eu tê-lo-ia
feito e ainda rasgava o acordo!). A própria teve a coragem de dizer “eu tenho
calçado botas e calças de ganga muitas vezes para estar nos bairros sociais...”
e aqui eu própria quase fui vítima de uma síncope. Uma declaração minada de
preconceito, uma declaração minada de uma pseudo e ilusória superioridade
social de dar pena, de fazer chorar as pedras da calçada.
Referiu depois e ainda que “pensar numa Lisboa do século XXI
é uma Lisboa que olha em primeiro lugar para aqueles que são mais pobres e em
situação de maior carência, que estão na Lisboa esquecida e abandonada por dez
anos de governação socialista". Palavras doces proferidas por alguém que
ajudou o anterior Governo, durante quatro anos, a empobrecer os portugueses e o
país. Palavras demasiado doces para quem contribuiu até para que cidadãos dos
tais bairros sociais em que ela adora passear de botas e calças de ganga fossem
desalojados. Palavras doces para quem a caridadezinha se sobrepõe à dignidade e
à igualdade de oportunidades.
A grande tristeza destas observações indecorosas, toscas e
grosseiras é percebermos que em pleno século XXI, onde a palavra de ordem é
“incluir, pensar igual, planear igual, governar igual para cidadãos e cidadãs
que são e se querem diferentes”, tenhamos iluminados monárquicos e de direita a
quererem fazer-nos retroceder mentalmente para um mundo machista, desigual,
vergonhoso e preconceituoso.
E, pergunto eu, quem é que esta gente julga que é? Presumem
que governar uma cidade é dar pão aos pobres, como se dá milho aos pombos? Para
longe, bem longe com as vossas saias largas, com as vossas botas e calças de
ganga. Lisboa e o pais precisa, à frente dos seus destinos, de gente de
verdade.
A autora escreve segundo as normas do novo Acordo
Ortográfico
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