terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Queixa-se do mau tempo? 2015 vai ser muito pior. El Niño regressa em força.

Queixa-se do mau tempo? 2015 vai ser muito pior. El Niño regressa em força
Por Marta Cerqueira
publicado em 19 Fev 2014 in (jornal) i online

Chuvas intensas na América do Sul e meses de seca na Austrália. El Niño surge no Pacífico mas afecta todo o mundo. Está previsto que aconteça no final de 2014, mas as consequências podem perdurar mais de um ano
Num momento em que se atravessa um dos invernos mais chuvosos dos últimos anos, é difícil imaginar o termómetro do calor a bater recordes. Não será igual para todas as regiões do planeta, mas espera-se que 2015 seja o ano mais quente desde que há registos. As previsões dos cientistas têm em conta uma média global e o culpado por este provável Verão prolongado é o fenómeno El Niño, que está de regresso já no final deste ano.

Esta é a primeira vez que a previsão é feita com quase um ano de antecedência. Um grupo de cientistas alemães publicou um estudo na revista da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos que revoluciona a forma convencional de prever o fenómeno, até aqui baseada na leitura das condições do mar e do vento. "Este novo método assenta num índice que compara a temperatura do ar na zona onde costuma ocorrer o El Niño e no resto do Pacífico, permitindo prever o fenómeno um ano antes de acontecer e, desta vez, com 76% de probabilidade", explicaram ao i Armin Bunde e Josef Ludescher, autores do estudo.

Apesar de não conseguirem ainda prever a intensidade do próximo El Niño, os investigadores acreditam que 2015 seja um ano recorde em temperaturas altas. "O fenómeno está ligado normalmente a cheias na América Central e do Sul e a secas na Austrália e na Indonésia", explicam. Além disso, as temperaturas globais poderão subir para níveis bastante mais elevados que o normal, ultrapassando as de 1998 e 2000, anos de El Niño.

O FENÓMENO O El Niño ocorre quando as águas do Pacífico ficam anormalmente quentes, provocando efeitos no clima de quase todo o mundo. O fenómeno foi originalmente reconhecido por pescadores da América do Sul, que associaram a falta de capturas à ocorrência no mar de temperaturas mais altas que o normal. Isto acontecia habitualmente por alturas do Natal e final de ano, e daí a designação, referindo-se ao Menino Jesus.

Apesar de acontecer com um intervalo médio de 3 a 4 anos, João Carlos Santos considera que existem poucas regras quando se fala de El Niño. O investigador do Centro de Investigação e de Tecnologias Agro-ambientais e Biológicas da Universidade de Trás-os-Montes avisa ser "impossível criar fórmulas de periodicidade e intensidade, até porque só a partir dos anos 80 é que se começou a ter registos mais pormenorizados da água do mar".

Essa incerteza é ainda mais marcante quando se fala de efeitos em Portugal. "As previsões para a Europa Ocidental são muito difíceis, porque existem vários factores meteorológicos que definem o clima, nomeadamente a oscilação do Atlântico Norte e as correntes de jacto, dois fenómenos difíceis de prever". João Carlos Santos explica que, para a Europa, as previsões devem ser feitas apenas com dois a três meses de antecedência para que se aproximem o mais possível da realidade.

Isabel Trigo, do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, fala de uma ligeira tendência para que, em anos de El Niño, a península Ibérica tenha um Outono e Inverno mais chuvosos e, por outro lado, o norte da Europa tenha mais frio. "Se olharmos para um todo, vemos que é essa a tendência, mas já aconteceram anos de El Niño com efeitos contrários. Não existem dois El Niño iguais nem com o mesmo impacto", acrescentou.

A investigadora esclarece que El Niño não tem acontecido com mais frequência nos últimos anos mas, quando surge, tende a ter uma maior intensidade. "Mas, por outro lado, só nas últimas décadas é que se começou a registar os fenómenos com mais cuidado." Apesar de não se ter provado ainda que as alterações climáticas influenciem a periodicidade e intensidade do fenómeno, Isabel Trigo garante que "o que acontecer à frequência de El Niño vai ter consequências no clima a nível global".

A especialista confirma que o impacto de El Niño em 2014, tal como aconteceu com os últimos, vai afectar a América do Sul com mais precipitação e, por outro lado, causar um Verão seco na Austrália, podendo agravar os incêndios florestais que normalmente afectam a região nos meses mais quentes. Apesar de haver opiniões diversas quanto à intensidade, a especialista aponta para um El Niño "moderado a intenso, com consequências que se farão sentir já no final do ano e durante 2015".



“Turistas de visita à América do Sul devem preparar os guarda-chuvas”

Armin Bunde, Investigador da Universidade Justus-Liebig, Alemanha

El Niño vai afectar as temperaturas a um nível global? Sim, 2015 pode ser o ano mais quente a um nível geral, apesar de não podermos ainda prever a intensidade do El Niño.

Quais serão as zonas mais afectadas? Se El Niño tiver uma forte intensidade, os turistas devem estar preparados com guarda--chuvas se visitarem a América do Sul, e devem levar uma quantidade extra de água se preferirem férias na Austrália.

Existem previsões para a Europa? Alguns cientistas acreditam que um forte El Niño pode levar a invernos rigorosos na Europa. Mas é uma zona difícil para fazer previsões a longo prazo.

O actual mau tempo que atinge a Europa pode ser associado a um fenómeno de El Niño ou La Niña? Essa teoria está errada. Não se pode associar o mau tempo a estes fenómenos, porque não estamos num período de La Niña.

Como é feita a previsão de um El Niño? Fazemos as medições de temperatura entre a base onde normalmente ocorre o El Niño e o resto do Pacífico, assinalando as conexões entre as temperaturas atmosféricas dentro e fora da bacia do El Niño. O aumento da força dessas conexões no ano antes de acontecer um ElNiño pode fazer prever o fenómeno.


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