Praga de escaravelhos descontrolada em Lisboa
Por Carlos Diogo Santos
publicado em 18 Fev 2014 in (jornal) i online
Sem estratégia concertada de combate à praga que desde 2007
ameaça as palmeiras em Portugal, Câmara de Lisboa já lançou críticas à inacção
do Estado e das autarquias vizinhas
A praga dos escaravelhos vermelhos que ataca as palmeiras
chegou a Portugal em 2007, mas os insectos vieram para ficar. Depois de virem
do Algarve para Lisboa, continuaram o seu percurso até ao Norte do país. Na
capital existiam no ano passado mais de 600 palmeiras sob vigilância e
tratamento, mas a batalha está ainda longe do fim. Quem o admite é José Sá
Fernandes, vereador da câmara municipal com o pelouro dos espaços verdes, que
alerta para o descontrolo desta praga e critica a falta de colaboração do
Estado e dos municípios vizinhos.
"É impossível combater a praga do escaravelho das
palmeiras se não houver o mesmo tipo de atenção de todos os intervenientes. E
Lisboa está quase isolada nesta batalha", avisou numa reunião de câmara no
fim de Janeiro. Segundo o vereador, a erradicação dos escaravelhos tem sido um
fracasso porque este combate não representa uma prioridade para o Ministério da
Agricultura.
Os insectos alimentam-se do interior das palmeiras
deixando-as secas e frágeis, mas muitas vezes podem não existir sinais
exteriores. As espécies contaminadas ficam mais vulneráveis ao vento, o que
aumenta o risco de quedas e de propagação mais veloz da praga. As acções de
recuperação das árvores - em algumas nem sequer é possível - têm custos
elevados e não são suficientes para pôr fim à reprodução descontrolada da
espécie.
Neste momento a autarquia de Lisboa tem mais de três
centenas de palmeiras em tratamento, mas teme que nem todas possam recuperar,
uma vez que o escaravelho vermelho está cada vez mais resistente aos produtos
utilizados. Citado há dias pelo blogue de notícias de Lisboa O Corvo, Sá
Fernandes adiantou mesmo que, se o Estado nada fizer, "vamos sofrer".
O i pediu no início do mês por email dados actualizados
sobre estes tratamentos e os montantes gastos pela autarquia de Lisboa ao
vereador José Sá Fernandes, mas não recebeu qualquer resposta. Foi feito um
novo contacto, por telefone, mas o autarca disse não estar disponível para
falar.
IMPACTOS E ESFORÇOS
Ao i, o entomólogo (especialista em insectos) Mário Boieiro
explicou que estas pragas são cada vez mais frequentes por haver mais pessoas a
circular entre países, acabando isso por facilitar o transporte dos insectos.
Neste caso há quem atribua à importação de palmeiras a origem da rápida
disseminação dos escaravelhos. "Algumas pragas têm impacto mais grave que
o destes escaravelhos, como foi o caso da dengue na Madeira, e por isso é
preciso agir com maior rapidez e concertar mais esforços públicos e
privados", disse.
Os escaravelhos vermelhos, originários de climas tropicais,
são considerados uma praga na Europa, sobretudo em Portugal, Espanha e Itália.
"São insectos que no seu ecossistema estavam em equilíbrio, porque têm
predadores e rivais, mas que ao chegar a um novo ecossistema, como foi o caso,
se desenvolvem descontroladamente", explicou o especialista.
Sobre o facto de não haver uma estratégia coordenada de
combate ao escaravelho, Artur Serrano, também entomólogo, assegurou ao i que
"mais vale alguma desinfestação do que nada". É isto que justifica o
investimento que tem sido feito pela autarquia de Lisboa nesta batalha que não
está a ser ganha.
O escaravelho vermelho consegue voar até dez quilómetros,
pelo que, se o tratamento for aplicado em palmeiras próximas de espécies do
mesmo tipo que estejam em terreno privado, os insectos se refugiam nas mais
vulneráveis. Não existem dados actualizados sobre o número de palmeiras
dizimadas, mas a praga já alastrou à maioria dos concelhos do país com especial
destaque, além de Lisboa, para o Porto e Setúbal.
As árvores que estão em tratamento podem ser distinguidas,
uma vez que possuem um tubo ao longo do tronco. Além de o tratamento ser caro,
os especialistas adiantam que se trata de um processo de difícil execução devido
ao formato das folhas das palmeiras. Outra das particularidades que torna o
processo complexo é não haver sinais exteriores da praga, a menos que a
destruição do interior já esteja numa fase muito adiantada.
DECISÃO EUROPEIA
As primeiras regiões em Portugal onde foi detectada a praga
foram Algarve, Lisboa e Vale do Tejo, Centro e arquipélago da Madeira. Antes,
já outros países europeus como Espanha e Itália detectaram a presença destes
insectos e estudaram as implicações sobre as palmeiras, sobretudo na espécie
das Canárias (Phoenix canariensis) . A União Europeia estabeleceu logo em 2007
medidas de emergência contra a introdução e a propagação dos escaravelhos
vermelhos (decisão 2007/365/CE).
Segundo um documento do Ministério do Ambiente disponível online,
estes insectos são naturais da Ásia e da Oceânia e a sua expansão iniciou-se
nos anos 80 e 90, pelo Médio Oriente e pelo Norte de África, sobretudo Egipto.
Chegam só mais tarde ao continente europeu. O primeiro país onde foram
detectados foi Espanha, em 1995. Apesar da proximidade, Portugal foi dos
últimos estados invadidos pela praga. O escaravelho vermelho está presente em
alguns outros países da orla mediterrânica, como é o caso de Chipre, França,
Grécia e Itália
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