segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Para a direita radical, as medidas do Parlamento são contra-revolução. Western nations scramble to contain fallout of Ukraine crisis


Para a direita radical, as medidas do Parlamento são contra-revolução
PAULO MOURA (em Kiev) 23/02/2014 - 20:25 / PÚBLICO

No processo de tomada de decisões na Ucrânia revolucionária há uma luta feroz entre os radicais de direita que conduziram a revolução e a oposição moderada, que muitos vêem como oligarcas corruptos.

Ouvem-se gritos do outro lado das janelas gradeadas. “É preciso fazer qualquer coisa”, diz um homem alto e gordo, com um cassetete na mão e camuflado da cabeça aos pés. “Se não atacamos agora, depois pode ser demasiado tarde”, ouve-se a boca dele a dizer, por entre o pequeno orifício da balaclava de lã que só deixa ver os dentes e os olhos.

“Vamos esperar ordens”, diz um homem de baixa estatura e machado preso ao colete à prova de bala. “Vamos esperar pela decisão do Parlamento”.

Do interior do edifício, os gritos tornam-se mais estridentes. “Os guardas estão a torturá-los”, explica um homem baixo, de capacete na cabeça, Jeugen Hmara, 34 anos, cozinheiro num hotel. “Os presos são combatentes da Maidan e estão neste momento a ser interrogados ali, por guardas afectos ao regime”, diz o cozinheiro, apontando para o edifício branco, de portões encerrados, da prisão de Lukianska. “Temos de atacar agora.”

O grupo foi para aqui enviado pela comando central da Samooborona, a organização de auto-defesa de Maidan. Recebeu uma informação segundo a qual uma horda de Titushki (designação por que são conhecidas as milícias pró-Ianukovich) se deslocava para a prisão de Lukianska. O Sotnia número 10, uma brigada que tem por missão acorrer a conflitos ou escaramuças que surjam em qualquer ponto da cidade de Kiev, foi chamado de urgência.

Alguns activistas e mirones já se tinham juntado em frente à prisão, prevendo a libertação dos detidos, que o Parlamento se preparava para aprovar. A ideia era festejar, abraçar os presos, levá-los em ombros sob aplausos e cânticos de louvor à libertação da Ucrânia. Já o propósito dos Titushka era matá-los.

Antecipando alguns problemas de comunicação e convivência entre estes dois grupos de manifestantes, o Sotnia número 10 foi enviado, no seu camião blindado, de rodas gigantes.

Não muito longe dali, o Parlamento prosseguia no seu afã legislativo. Nomeou Oleksander Turchinov, que na véspera assumira as funções de presidente do próprio Parlamento, como Presidente interino do país até às eleições, marcadas para 25 de Maio. Turchinov é um dos líderes do partido Pátria, chefiado por Iulia Timoshenko, libertada no sábado por ordem deste mesmo Parlamento.

Continuou ontem a tomar decisões, em maratona parlamentar revolucionária. Extinguiu o estatuto de língua oficial para o russo em regiões de população maioritariamente russófona, alterou algumas regras quanto à possibilidade de procedimento criminal contra detentores de cargos públicos, e deveria decretar a libertação de mais uns tantos presos políticos.

É por isso que se espera em Lukianska, mas a decisão tarda. Segundo alguns responsáveis, presentes no local, do partido Patriotas da Ucrânia, um subgrupo integrado na organização de extrema-direita Sector Direito, os deputados não se entendem sobre quem devem libertar.

Os responsáveis do Patriotas da Ucrânia dizem estar em contacto com os seus amigos do partido de direita com representação parlamentar Svoboda, segundo os quais cada partido só quer libertar os presos da sua cor política. Aos outros, considera-os criminosos de delito comum.

Em frente à prisão, como não se confirma a chegada das milícias Titushki, o Sotnia número 10 recebe ordens para retirar. É isso que diz ao megafone o seu líder, dirigindo-se já para o camião. Porém, nem todos concordam. Gera-se discussão, vários activistas de capacete, balaclava e escudo de ferro aduzem argumentos. Um homem esguio, de nariz comprido, olhos verdes, farda de camuflado, lenço palestiniano ao pescoço e as palavras “Slavonia Brotherhood” bordadas no boné, levanta a voz: “Se Iulia Timoshenko foi libertada imediatamente, sem que a decisão tivesse passado por um tribunal, então estes presos também terão de sair. São tão presos políticos como ela. Só porque talvez não beneficiem da simpatia do actual líder do Parlamento, não é motivo para que não lhes sejam aplicados os mesmos critérios. Se a decisão é política para uns, tem de ser para todos.”

O homem que tão eloquentemente expôs o seu ponto de vista chama-se Ieroslav Babich, tem 38 anos e é advogado. Mostra o cartão da ordem dos causídicos da Ucrânia, para confirmar. De momento não está a exercer, porque se dedica a 100 por cento à causa de Maidan.

“Deixei de acreditar no sistema jurídico, tornei-me extremista”, diz ele. Depois conta que fez parte do grupo de advogados que representou os três presos políticos que se encontram ali, na prisão de Lukianska. A defesa não foi bem-sucedida, foram condenados a seis anos de prisão efectiva. Recorreram para o Supremo Tribunal, que ainda não tomou decisão alguma, apesar de os réus já estarem a cumprir pena há dois anos e meio.

Os condenados são Igor Mosichuk, Vladimir Shpara e Sergei Bevz, que eram líderes autárquicos na cidade de Vasilkovskoi, eleitos pelo partido Patriotas da Ucrânia. Segundo Ieroslav, os três autarcas inviabilizaram a construção de um casino, empreendimento de um poderoso homem de negócios da região, com a cumplicidade do chefe da polícia. Este, que se preparava para receber subornos de milhões, decidiu vingar-se contra os três políticos, forjando provas de que estariam envolvidos na preparação de um acto terrorista. Nas suas casas foram encontradas armas e explosivos, que os incriminaram em tribunal. O caso, ocorrido em 2011, foi empolgado pelos media leais ao regime, sob o título de “Terroristas de Vasilkovskoi”.

Ieroslav, que já se tinha aproximado do partido Patriotas da Ucrânia desde 2008, aceitou a defesa destes arguidos. Ficou responsável em concreto pelo caso de  Vladimir Shpara. Mas “o tribunal nunca foi justo nem decente. Os juízes não queriam ouvir nem considerar as provas, tudo estava decidido desde o início”, conta. “Por isso decidi desistir. Agora faço justiça como extremista. Estou aqui, e vou libertar aqueles três homens, com estas armas que tenho na mão.”

Ieroslav Babich é agora militante do Patriotas da Ucrânia, cujo símbolo é uma suástica ligeiramente distorcida. São os caracteres “NI” cruzados, que significam Nazi Idea, diz Ieroslav, para logo corrigir, “Nacional Idea”. O Patriotas da Ucrânia tem no seu programa a proibição imediata do Partido Comunista e do Partido das Regiões, do ex-presidente Viktor Ianukovich.

“Nós achamos que o que está a ser feito no Parlamento neste momento é contra-revolução”, diz Ieroslav. “As pessoas que arriscaram, que estiveram dispostas a dar a vida por este país durante a luta de Maidan é que deviam estar agora no poder, a dirigir a Ucrânia. O novo Presidente, Oleksander Turchinov, nunca o vi nas barricadas. O que estamos a assistir é aos oligarcas a reposicionarem-se, tentando obter cargos, à custa da revolução de Maidan. Eu acho que quem devia agora ser chamado ao poder são os que realmente fizeram a revolução, o Sector Direito.”

Andrei Lazovi, um dos líderes do Sector Direito, pega agora no megafone para exortar todos os presentes a dirigirem-se ao Parlamento, para exigirem a libertação de todos os presos políticos e a marcação não apenas de eleições presidenciais, mas também de eleições legislativas a 25 de Maio.

Após alguma discussão, concluem que não são suficientes para fazer ouvir a sua proposta, e decidem levá-la ao palco da Praça da Independência. Lazovi fica incumbido de conseguir tempo de antena no palco da Maidan. Quando os milhares de pessoas que enchem a praça de manhã à noite o ouvirem, correrão para o Parlamento com a nova exigência.

“Amanhã o Parlamento será obrigado a votar a nossa proposta”, diz Lazovi ao megafone. “Amanhã estaremos aqui à mesma hora para abraçar os nossos companheiros libertados.”


Agora é preciso lutar por uns minutos no palco da Maidan, a tribuna do novo poder. O espaço onde se digladiam os grupos da vanguarda da revolução, com o Sector Direito, de extrema-direita, à frente, e a oposição política, vista por aqueles como uma corja de oligarcas oportunistas. O palco é última instância de decisão da Ucrânia libertada, mas não é a Maidan, diz Ieroslav. “O palco já foi transformado em festa, em discoteca, tomado pelos traidores da Maidan. Temos de os tirar de lá. Não podemos ir para casa. A revolução continua”.


Western nations scramble to contain fallout of Ukraine crisis
Interim government signals that it will push for European integration as Russia recalls ambassador for 'consultation'
Ian Traynor in Brussels and Shaun Walker in Kiev

Western governments are scrambling to contain the fallout from Ukraine's weekend revolution, pledging money, support and possible EU membership, while anxiously eyeing the response of Russia's president, Vladimir Putin, whose protege has been ousted.

Seemingly the biggest loser in the three-month drama's denouement, the Kremlin has the potential to create the most mischief because of Ukraine's pro-Russian affinities in the east and south, and its dependence on Russian energy supplies.

Acting president Oleksander Turchinov said on Sunday night that Ukraine's new leaders wanted relations with Russia on a "new, equal and good-neighbourly footing that recognises and takes into account Ukraine's European choice".

But the tension between the Kremlin and the interim government was underlined when Russia recalled its ambassador to Ukraine on Sunday for "consultations" and to "analyse the situation from all sides", the foreign ministry said.

European Union foreign policy chief Catherine Ashton will travel to Ukraine on Monday, where she is expected to discuss measures to shore up the ailing economy.
With the whereabouts of the former president Viktor Yanukovych still uncertain, the Ukrainian parliament legitimised his downfall, giving interim presidential powers to an ally of Yulia Tymoshenko, the former PM who was released from jail on Saturday. Oleksandr Turchinov said the parliament should work to elect a government of national unity by Tuesday, before preparations begin for elections planned for 25 May.

Yanukovych appeared on television from an undisclosed location on Saturday night, claiming he was still president and comparing the protesters to Nazis, but he continued to haemorrhage support on Sunday; even the leader of his parliamentary faction said he had betrayed Ukraine, and given "criminal orders".

Western leaders, while welcoming the unexpected turn of events in Kiev, are worried about the country fracturing along pro-Russian and pro-western lines. They are certain to push for a new government that is as inclusive as possible to replace the collapsed and discredited administration of Yanukovych, who vanished within hours of signing an EU-mediated settlement with opposition leaders on Friday.

"France, together with its European partners, calls for the preservation of the country's unity and integrity and for people to refrain from violence," said Laurent Fabius, the French foreign minister.

British chancellor George Osborne said early on Monday that the UK was standing ready to help the country through schemes set up by the IMF and European Union.

"It's very, very early days, early hours, but the people of Ukraine seem to have demonstrated their wish to take their country into the future, to have stronger links with Europe, and I don't think we should be repelling that, we should be embracing that," he said speaking to journalists in Singapore.

"We should be there ready to provide financial assistance through organisations like the IMF, and of course a lot of this will take the form of loans and the like, but there will be good investments in the economy of Ukraine".

Putin, preoccupied with the closing ceremony of the Sochi Olympics, has not yet commented publicly on the violence of the past week and Yanukovych's flight from the capital. Angela Merkel phoned him on Sunday to press for assurances on Russia's reaction. Susan Rice, the national security adviser to Barack Obama, warned that Moscow would be making a "grave mistake" if it sent military aid to Ukraine.
"There are many dangers," said William Hague, the foreign secretary. "We don't know, of course, what Russia's next reaction will be. Any external duress on Ukraine, any more than we've seen in recent weeks … it really would not be in the interests of Russia to do any such thing."

Whether such nightmares are realised will hinge largely on the Kremlin's position and policies. Sergei Lavrov, the foreign minister, has called the protesters on Independence Square "pogromists", but it appears that Moscow is grudgingly coming to terms with the new reality. In a phone call with the US secretary of state, John Kerry, on Sunday, Lavrov accused the opposition of seizing power and failing to abide by the peace deal thrashed out on Friday.

Analysts say Yanukovych, disgraced as he is, no longer holds any use for the Kremlin, but how the Russians will react on the ground is still an open question. This also partly depends on the new Ukraine government. One of the first issues the parliament tackled this weekend was that of the language, annulling a bill that provided for Russian to be used as a second official language in regions with large Russian-speaking populations. If the new government also looks to end the lease of a Black Sea naval base by the Russian military, the response from Moscow could be more aggressive.

"It will definitely depend on how the new government behaves," said Vladimir Zharikin, a Moscow-based analyst. "If they continue with these revolutionary excesses then certainly, that could push other parts of the country towards separatist feelings. Let's hope that doesn't happen."

In Kiev, the barricades around Independence Square remained in place, though the lines of riot police have long dissipated. Thousands of people came to the barricades to pay respects to the 77 people who died last week in the bloody clashes that eventually led to Yanukovych fleeing.

As the third of three official days of mourning ended, priests continued to sing laments from the stage in the square. Between the soot-black pavements and the slate-grey sky, there were splashes of bright colour as thousands brought bunches of flowers to lay at makeshift memorials to the dead.

At Yanukovych's residence outside Kiev, a team of investigative journalists went to work on a trove of documents fished from the water; the president's minders had apparently tried to destroy them before fleeing. Thousands of people again came to see the vast, luxurious compound with their own eyes.

Tymoshenko, who has her eyes on the presidency, met the US and EU ambassadors in Kiev. She was released from prison on Saturday and went straight to Independence Square, where she promised to fight for a free Ukraine. There was ambivalence about the former PM among the protesters, with many feeling that she represents the divisive and corrupt politics of the past.

There was no clear central authority in Kiev on Sunday, with the city patrolled by a self-proclaimed "defence force", comprising groups of men wearing helmets and carrying baseball bats. Nevertheless, the mood was orderly and peaceful, and the protest representatives have been meeting with the police and security services in an attempt to restore a feeling of normality to the capital.

With the country about to turn a new page in its history, for the first time since the crisis erupted in November senior EU officials spoke of the possibility of Ukraine joining the union which, if serious, would represent a major policy shift.

"We are at a historical juncture and Europe needs to live up to its historical moment and be able to provide Ukraine with an accession perspective in the medium to long term – if it can meet the conditions of accession," said the economics commissioner, Olli Rehn, at a G20 meeting in Australia.

Until now, Brussels's policy towards Ukraine and other post-Soviet states, known as the eastern partnership, has been expressly intended as a substitute for rather than a step towards EU membership. It was the EU deal – Yanukovych's rejection of political and trade pacts with the bloc in favour of cheap loans and energy from Russia – that sparked the conflict and crisis in November.

With the likelihood of Russia's $15bn (£9bn) lifeline dissolving, the EU is under pressure to come up with funding to shore up the country's economy, on the brink of bankruptcy. "We are ready to engage in substantial financial assistance for Ukraine once a political solution, based on democratic principles, is finalised and once there is a new government which is genuinely and seriously engaged in institutional and economic reforms," said Rehn.

The EU said Baroness Ashton would travel to Ukraine on Monday. "In Kiev she is expected to meet key stakeholders and discuss the support of the European Union for a lasting solution to the political crisis and measures to stabilise the economic situation," an EU statement said.

The upshot is expected to be an IMF programme, supported by the US and the EU, although EU officials partly blame the IMF for the November fiasco by attaching strict terms to loans and prodding Yanukovych towards Moscow.


"We will be ready to engage, ready to help," said Christine Lagarde, the IMF chief who is also being tipped as a contender for a top job at the EU this year. The fund is likely to insist on major reforms and steps in an attempt to prevent the plunder of the country by Ukraine's oligarchs.

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