Factura dos buracos nas ruas de Lisboa vai em meio
milhão de euros
O mau tempo trouxe novos e
mais profundos buracos às ruas da capital. A autarquia prevê reparações mas a
chuva tem impedido que as obras avancem. Até lá, circular continua a ser uma
aventura
Alexandra Guerreiro / 25 fev 2014 / Público
Se a situação já não era famosa, as chuvas dos últimos dias
pioraram tudo. Os buracos nas ruas lisboetas transformam qualquer deslocação
numa gincana. Quem por eles passa todos os dias já aprendeu a evitálos. O mais
difícil, diz o taxista Mário Rocha, é mesmo encontrar vias sem crateras. Para
as tapar, a Câmara de Lisboa garante que pretende gastar quase meio milhão de
euros em obras de manutenção, adiantando que algumas reparações já estão em
curso.
O táxi de Mário Rocha balança como uma maraca quando não
consegue evitar os buracos. No meio das vias, em rotundas, este taxista com
mais de 20 anos de experiência conhece bem onde estes espreitam.
Ao subir a Avenida Infante Santo, um buraco mete-se pelo
caminho do táxi e obriga a uma guinada no volante. “Estamos sempre a
desviarnos, mas às vezes não se consegue. A semana passada arrebentei um pneu
no Chiado”, conta. Agora a câmara já cobriu a culpada cratera junto ao Largo
Camões.
Na paragem de autocarro paralela ao Parque Eduardo VII, a
rua abateu mais com o mau tempo das últimas semanas. “Aquilo já tem anos, mas
agora piorou”, explica o taxista. A lomba acidental é grande, o que obriga os
autocarros a desviarem-se da paragem onde devem parar.
Junto a esta, o motorista abranda. “Temos de entrar devagar,
mas não complica o trabalho”, vai dizendo enquanto encosta o autocarro duplo
antes da rotunda do Marquês. A traseira fica de fora. “A parte de trás não se
consegue aproximar da paragem, só a frente” porque existe um vale acidental há
mais de dois meses naquele local. A tradição dos remendos já a conhece: “Quando
faz sol, eles arranjam.”
E há quem diga que a situação até tem melhorado. Cristina
Garcia, a viver em Tomar há oito anos, diz que nota muitas diferenças desde que
mudou de cidade. “Venho cá regularmente e reparo nas melhorias que as ruas de
Lisboa têm tido. Antes a Fontes Pereira de Melo era só buracos. Entrava-se em
modo centrifugação. Agora os remendos vêem-se e alguns dos abanões que se
sentem não tem comparação com antes”. Mas compreende que quem viva aqui não
pense o mesmo, diz.
O certo é que os buracos estão nas contas da autarquia. Ao
PÚBLICO, a Câmara de Lisboa (CML) disse que, de uma forma geral, gasta um
milhão de euros em intervenções nos pavimentos. Para responder às situações
mais urgentes evidenciadas agora pelo mau tempo, conta gastar 442.858,83 euros
(sem IVA) em obras de manutenção na zona ocidental, central e oriental da
cidade.
Alguns trabalhos já começaram e dão conta de buracos
tapados. Nesta lista que abrange 24 ruas está a Avenida Fontes Pereira de Melo.
Mas ainda a fazer. Ali mesmo ao lado, na rotunda do Marquês, um buraco
rectangular na faixa da direita faz Mário Rocha pisar o travão. “Um buraco em
plena rotunda. Toda Lisboa é um buraco”, exclama.
Com o bom tempo “retomaram-se os trabalhos de pequenas
recargas de pavimento, cujos resultados se prevêem ser visíveis a partir de
Março”, adianta a câmara. A CML pretende reparar nesta fase mais de 60 pontos
da capital, entre empreitadas de manutenção a intervenções pontuais. Nos
trabalhos de “tapa buracos” dáse prioridade aos locais onde é posta em causa a
segurança da circulação dos utentes, às vias de maior circulação viária e aos
acessos a hospitais, explica. Depois, os pontos de especial interesse
turístico.
Na Avenida Ribeira das Naus, as obras continuam a
requalificar a zona ribeirinha mas o pavimento parece esquecido. “Isto está
tudo esburacado na entrada, já há bastante tempo”, comenta o taxista.
A câmara disse ao PÚBLICO que pretendia reparar o pavimento
deste local entre 14 e 18 de Fevereiro mas a chuva trocou as voltas aos
empreiteiros. Quando o tempo o permitir, estão na calha intervenções em 20
pontos da zona oriental. Já foi adjudicada uma empreitada no valor de
111.858,83 euros que abrangerá as freguesias do Lumiar, Marvila, Beato,
Olivais, Areeiro, Alvalade, Avenidas Novas, Santa Clara e Parque das Nações. Na
zona ocidental, serão gastos 327 mil euros em 24 pontos das freguesias de
Carnide, Benfica, Belém, S. Domingos de Benfica, Ajuda, Campolide e Campo de
Ourique e Alcântara.
É precisamente em Alcântara que os automóveis encontram
maiores desafios. Na Rua Prior do Crato, a manobra a que Mário Rocha é obrigado
é maquiavélica. Só aqui, a câmara pretende avançar com obras numa área de 2000 m2 num investimento de
20 mil euros.
Na zona central, nas freguesias de Penha de França, Estrela,
Arroios, Santa Maria Maior, Santo António, S. Vicente e Misericórdia, o valor
calculado a gastar em intervenções será de quatro mil euros. Além disso, a CML
vai gastar quase 30 mil euros em materiais intervenções pontuais a cargo dos
serviços camarários.
Mas a tarefa parece interminável. Se umas ruas escapam,
outras são um flagelo. Em redor da Praça do Comércio, os pavimentos centenários
gritam a sua idade: estão velhos, gastos e esburacados. Na Infante D. Henrique,
na Rua Cais de Santarém, na Rua Cais da Lingueta, na Rua de Alfândega, na Rua
do Arsenal, da sede do município de Lisboa ao Cais do Sodré, muitas são as
irregularidades que carros e peões têm de ultrapassar.
Numa cidade em que a extensão de ruas atinge cerca de 1800
quilómetros, a autarquia descarta a possibilidade de a causa das anomalias ser
por falta de intervenções. “A manutenção de pavimentos é realizada, de forma
continuada ao longo do ano, sem interrupções. Mas as condições climatéricas
associadas à enorme extensão e idade dos pavimentos da cidade provocaram uma
degradação de algumas vias rodoviárias”.
Um argumento que não cala as queixas. Na Rua de Alcântara,
junto ao Largo do Calvário, pontificam buracos quadriculares, rectangulares,
triangulares. Os danos no pavimento são visíveis há mais de seis meses. Um dos
responsáveis do restaurante com vista privilegiada para os buracos conta que os
clientes costumam desabafar entre bicas e bitoques. “Reclamam sobre as passadeiras
apagadas ou sobre as poças que se criam nos buracos e que acabam a chover-lhes
em cima quando passa um carro. As ruas já nem são lavadas. Isto só não piora
com o mau tempo porque já não tem onde piorar”.
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