Mega-urbanização reacende polémica sob ameaça judicial
de 264 milhões
Plano para uma vasta área situada junto à Marginal
mantém índices de construção rejeitados em 2001. Autarquia fala no risco de uma
indemnização de 264 milhões de euros. “Chantagem”, respondem os críticos
José António Cerejo / 14 fev 2014 / Público
Treze anos depois de ter sido chumbado por todos os partidos
com assento na Assembleia Municipal de Cascais, o projecto de construir uma
mega-urbanização na Quinta dos Ingleses, junto à praia de Carcavelos, volta a
estar envolto em polémica. A câmara acena com a redução do número de
habitações, relativamente à proposta de 2001, e com o risco de ter de
indemnizar os donos dos terrenos. Os adversários do projecto continuam a
condenar a destruição da “única mancha verde digna desse nome” ainda existente
na orla costeira entre Lisboa e Cascais. Os números mostram que os ganhos da
nova proposta são mínimos.
A discussão pública do novo plano de pormenor de Carcavelos
Sul, que abrange uma área de 54 hectares no interior da qual se situa o
colégio inglês (St. Julian’s), termina na segunda-feira. Ao longo de quase dois
meses, os argumentos dos defensores e dos críticos do projecto voltaram a ser
esgrimidos sem grandes novidades em relação a 2001.
De um dos lados, joga-se com a inevitabilidade de levar por
diante uma urbanização prevista desde os anos 60 e relativamente à qual os
proprietários do terreno (a imobiliária Alves Ribeiro e a St. Julian’s School
Association) terão adquirido direitos de construção inalienáveis. Do outro,
insiste-se na primazia do interesse público sobre o privado e na necessidade de
encontrar alternativas que não descaracterizem o local.
Em defesa da sua proposta, a autarquia aponta “a criação de
4500 postos de trabalho e 20
hectares de espaços verdes”, afirmando que se trata do
“mais ambicioso e sustentável projecto urbanístico que aquela zona do concelho
já conheceu”. Por outro lado, argumenta com a redução do número de fogos
previstos — 1450 no plano de 2001 e 939 no actual — e, sobretudo, agita a
indemnização de 264 milhões de euros que a empresa Alves Ribeiro pede em
tribunal, caso o actual projecto não avance.
O que não explica é como é que chega aos anunciados 4500
empregos, quando o plano de 2001, que foi fortemente contestado pela actual
maioria PSD/CDS, previa apenas 1244. E também não diz que, apesar de a área de
habitação descer de 191.441m2 para 140.821 m2 (-26,4%) o total da área de
pavimento a construir desce apenas de 226.268 m2 para 223.172 m2 (-0,14%). Isto
porque se a ocupação habitacional diminui, a área de comércio e serviços mais
do que duplica. A acreditar nos documentos em discussão, que nem sempre são
coincidentes, o índice de utilização do solo passa de 0,49 para 0,46, mas os
“espaços verdes de utilização colectiva” caem de 134.246 m2 para 107.565 m2 . De igual
modo, as áreas cedidas ao município são reduzidas de 380.595 m2 para 256.558 m2 e os
“equipamentos de utilização colectiva” passam de 94.004 para menos de metade (42.452 m2 ).
Em todo o caso, na floresta de informação disponível no site
da câmara sobre este plano, o que falta são sínteses comparativas das propostas
que os deputados municipais chumbaram em 2001 com as actuais.
Para o Fórum por Carcavelos, um movimento de cidadãos que se
destacou no combate ao plano de 2001,
a solução negociada entre a câmara e os donos do terreno
mantém, quando não agrava, os problemas da sua antecessora. Num documento ontem
divulgado, o fórum afirma que o direito de propriedade “não se pode confundir
com o direito de construir” e que o plano prevê “uma forte expansão urbana
não-fundamentada, que se configura como mais uma operação de especulação
imobiliária com ausência de qualquer estudo que garanta a viabilidade económica
e financeira da operação urbanística.” O texto chama a atenção para a
existência de centenas de habitações por vender na zona e defende que a
construção prevista, em edifícios de seis a oito pisos, é “manifestamente
desproporcionada”. O grande parque urbano anunciado pela câmara “tem afinal uma
dimensão que nem sequer atinge os quatro hectares”, diz a associação. Quanto ao
risco da indemnização, acusa: “É chantagem exercida sobre a população” .
Também o Cidadania Cascais, um outro movimento cívico com
actividade na zona, “lamenta” o facto de a câmara “não ter sabido contornar os
‘direitos adquiridos’ pelo promotor, negociando com este índices de construção
compensatórios noutro local do interior do concelho e/ou diferentes usos e
volumetrias”.
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