sábado, 1 de junho de 2013

"A teoria dos vasos comunicantes é, no fundo, a teoria da economia bloqueada, dos vasos estagnados."

O fracasso, modo de usar (sem rectificar)


A um Governo que não rectifica políticas pouco mais resta do que rectificar orçamentos
Editorial / Público
Governar, diz-se, é a arte do possível. Por oposição à vontade de sonhar ou de confundir desejos com realidades. Por isso, Passos Coelho insiste que a razão continua a estar do lado do Governo. Critica os pessimistas que estão sempre à espera que algo corra mal. E para o caso de as previsões voltarem a falhar, lembra que o executivo não tem maneiras mágicas de escrutinar o futuro. Como se o rigor fosse, no fim de contas, obra do acaso ao alcance de bolas de cristal e não da matemática pura e dura. Mas aí estão as contas do rectificativo. Para nos dizer que, em Maio, as contas feitas para este ano não batem certo e precisaram de ser corrigidas. Nada de excessivamente novo: a derrapagem nas contas não é de agora. Álibi perfeito, houve o chumbo do constitucional. Mas o que as contas mostram é que o impacto da recessão está a custar mais do que a consequência das normas orçamentais chumbadas pelos juízes do Palácio Ratton. Nada de demasiado novo, uma vez mais. Mais antiga do que a macroeconomia, a teoria dos vasos comunicantes mostra-se de novo válida. O dinheiro que é carregado nos impostos que sobem desaparece engolido pelo desemprego que cresce - bem como as despesas sociais a ele associadas - e pelo consumo que diminui. A teoria dos vasos comunicantes é, no fundo, a teoria da economia bloqueada, dos vasos estagnados. A austeridade torna-nos mais pobres e quanto mais pobres ficamos mais austeridade geramos. Governar, diz-se, é a arte do possível, por oposição à vontade de sonhar. Mas o que dizer quando governar é a arte passiva de ver uma situação deteriorar-se sem nada fazer para a rectificar? O Orçamento rectificativo mostra que estamos perante um Governo que consegue apenas repetir os mesmos erros, sem os corrigir. Ou sem que lhe reste mais do que rectificar as suas próprias contas. Sem que seja preciso ter uma bola de cristal para saber que estão, à partida, erradas.

"Mas o que as contas mostram é que o impacto da recessão está a custar mais do que a consequência das normas orçamentais chumbadas pelos juízes do Palácio Ratton. Nada de demasiado novo, uma vez mais. Mais antiga do que a macroeconomia, a teoria dos vasos comunicantes mostra-se de novo válida. O dinheiro que é carregado nos impostos que sobem desaparece engolido pelo desemprego que cresce - bem como as despesas sociais a ele associadas - e pelo consumo que diminui. A teoria dos vasos comunicantes é, no fundo, a teoria da economia bloqueada, dos vasos estagnados."

Passos dramatiza discursos sobre possibilidade de eleições antecipadas

Por Samuel Silva in Público
01/06/2013

Primeiro-ministro responde aos pedidos de demissão dizendo que o país deitaria por terra o esforço dos últimos dois anos. Protestos de taxistas marcaram início da visita a Trás-os-Montes
A queda do Governo, neste momento, faria com que o país deitasse por terra os sacrifícios feitos nos últimos dois anos. Esta foi a ideia ontem defendida pelo primeiro-ministro, reagindo aos pedidos de demissão feitos nos últimos dias por vários actores políticos. No distrito de Vila Real, onde tem raízes familiares, Pedro Passos Coelho dramatizou o discurso e sublinhou que ainda sente legitimidade para liderar o executivo.
Mário Soares questionou a legitimidade do Governo durante o congresso sobre os dois anos de intervenção da troika em Portugal que decorreu anteontem à noite, em Lisboa. A resposta foi dada poucas horas depois por Passos Coelho, à margem de uma visita de dois dias a Trás-os-Montes, dizendo que não vê motivo para que o Governo não possa continuar a liderar o país, cumprindo a segunda metade do seu mandato. "O Governo está suportado por uma maioria no Parlamento" e, portanto, continua a ter "toda a legitimidade", ao contrário do que foi sugerido pelo histórico militante socialista, defendeu.
"Mal estaria o país se, perante as dificuldades, tivesse que convocar imediatamente eleições. Estou certo que a maioria das pessoas pensa o mesmo", sustentou. Para Passos Coelho, marcar eleições antecipadas nos próximos meses "seria regressar a Março ou Abril de 2011", referindo-se ao momento em que o anterior Governo liderado pelo socialista José Sócrates pediu ajuda externa para enfrentar os problemas financeiros do país. O primeiro-ministro lembrou o "caminho de dois anos" percorrido por Portugal para responder às dificuldades, destacando a "grande resiliência" mostrada pelos portugueses ao longo desse período: "Esse esforço é reconhecido fora do país."
O chefe do Governo comentou também o incidente da manhã no Parlamento (ver pág. 11), em que um grupo de manifestantes teve que ser evacuado das galerias por insultar os deputados. Passos lembrou que a democracia "tem regras", apontando o "desespero" que diz encontrar em alguns agentes políticos pressionando a queda do executivo. O governante fez uma "recomendação" aos críticos: "Não confundam os seus desejos com a vontade do país." E disse mesmo que detecta "uma certa tentativa de levar até casa dos portugueses uma imagem de agressividade e de bloqueio da democracia" que não corresponde à realidade e não interessa ao país. "Creio mesmo que a maioria dos portugueses defende que a existência de eleições neste momento seria prejudicial ao país."
No início da visita ao distrito de Vila Real, o primeiro-ministro teve que se confrontar com uma manifestação. Chegou 10 minutos antes da hora prevista à primeira empresa que visitou em Chaves, tempo suficiente para evitar cruzar-se com os cerca de 20 taxistas que queriam fazer ver ao Governo a sua insatisfação por terem perdido o transporte de doentes hemofílicos para os bombeiros. Mesmo assim, o protesto continuou à distância e subiu de tom no momento em que a comitiva partiu para a segunda visita do dia. "Pagamos impostos, queremos os mesmos direitos", reclamaram os manifestantes.
Ao fim da tarde, Passos haveria de encontrar novo protesto, em frente ao Teatro de Vila Real, onde decorreu a gala do Prémio Douro Empreendedor. Viticultores do Douro, actores da companhia de teatro Filandorra e elementos do movimento Que Se Lixe a Troika vaiaram o primeiro-ministro, gritando "gatuno" e "Passos para a rua, a luta continua" e empunhavam faixas com palavras de ordem.
À hora de almoço, já em Pedras Salgadas, no concelho de Vila Pouca de Aguiar, Passos Coelho referiu-se aos números do desemprego relativos a Abril conhecidos de manhã. Os 17,8% apurados pelo Eurostat "não constituem nenhuma novidade" e estão dentro do previsto, atendendo a que o Governo prevê que o desemprego chegue aos 18,2% no final do ano. Prometeu, ainda assim, "fazer tudo o que estiver ao alcance" do executivo para combater os problemas de emprego do país.
O governante apontou duas vias para atacar a questão. Por um lado, é preciso reformular as políticas activas de emprego, dirigidas sobretudo aos jovens, reconhecendo mesmo que as iniciativas lançadas neste campo "até à data não tiveram o impacto que o Governo gostaria". Por outro, voltou a afirmar a intenção de apostar no investimento, à semelhança do que vem sendo feito por vários elementos do executivo nos últimos dias.
Sobre a convocação da greve geral para 27 de Junho ontem decidida pela CGTP - e à qual se deverá juntar a UGT e os sindicatos independentes -, o chefe do Governo disse respeitar as decisões dos sindicatos, mas salientou que prefere "passar uma mensagem positiva". "Nós precisamos de mais trabalho, de melhor trabalho, de sermos mais produtivos e competitivos, de criarmos condições para acolhermos o investimento", defendeu, à margem de uma visita ao parque termal das Pedras Salgadas, em Vila Pouca de Aguiar, onde a Unicer está a fazer investimentos de 7,5 milhões de euros.
De resto, foi precisamente essa mensagem positiva que ontem se esforçou por passar, visitando três empresas da região e voltando a afirmar que este é o momento para investir quando discursou perante autarcas e empresários transmontanos. Hoje, Passos Coelho marca presença na assinatura do contrato da barragem de Veiguinhas, na Câmara Municipal de Bragança, reúne-se com o Núcleo Empresarial da Região de Bragança, visita o Brigantia EcoPark e o Parque de Ciência e Tecnologia de Trás-os-Montes e Alto Douro.


Unidos no presente, mas divididos quanto ao futuro

Encontro da esquerda. Unidos no presente, mas divididos quanto ao futuro
Por Pedro Rainho
publicado em 1 Jun 2013 in (jornal) i online

Passos respondeu aos apelos para a realização de eleições com a convicção de que os portugueses "não estão interessados em refregas políticas"
Mário Soares, no palco, a entoar versos de "Grândola, Vila Morena" - um quadro que não se vê todos os dias - foi símbolo do encerramento da conferência "Libertar Portugal da Austeridade", desta quinta-feira, na Aula Magna da Universidade de Lisboa. No palco, o ex-Presidente da República (promotor do encontro) juntou o PS, o PCP e o BE para uma rejeição conjunta da política de austeridade e para pedir ao Presidente da República que demita o governo. Para Soares, Cavaco Silva será "responsável pela perda de paciência e pacifismo que temos tido até agora" se não o fizer.
Não acontecia há décadas um encontro com todos os partidos de esquerda, mas entre os líderes apenas os do BE, Catarina Martins e João Semedo, estiveram presentes. Do PS, Seguro disse apoiar a iniciativa mas não marcou presença no encontro e Jerónimo de Sousa também preferiu ficar de fora.

CAVACO VAIADO
Aos 88 anos, Mário Soares recebeu uma ovação de pé de uma plateia repleta ainda antes do discurso de abertura. Quando foi primeiro-ministro, Soares optou sempre por fazer coligações à direita. Hoje o fundador do partido quer ver o PS virar à esquerda, e não poupou críticas ao executivo de Passos Coelho. "Por patriotismo, não podemos deixar que Portugal seja fanaticamente destruído por um governo incompetente", sublinhou. A sala respondeu com uma ovação e gritos de demissão. Às referências do fundador do PS a Cavaco Silva seguiram-se vaias imediatas da sala.
O primeiro-ministro respondeu a Soares com a convicção de que "parte do povo português" não quer eleições e a queda do governo seria voltar "ao princípio". Em Vila Pouca de Aguiar, Passos Coelho garantiu que "os portugueses não estão interessados em refregas políticas", mas sim "em vencer a crise".
Do lado dos partidos, Ramos Preto defendeu "a renegociação das condições de ajustamento", enquanto Cecília Honório, do BE, apelou a "convergências populares" e rejeitou a manutenção do Memorando. Já João Ferreira, do PCP, preconizou "um governo patriótico que rejeite de imediato o programa da troika" e recupere "imprescindíveis instrumentos de soberania económica, monetária e orçamental".
Discursos que mostram que os partidos de esquerda estão longe de se entender em relação às alternativas à crise, embora estejam unidos na necessidade de demitir o governo e de travar a austeridade.

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