Dilma procura novo estilo político para satisfazer anseios populares.
Manifestações são apoiadas por 75% dos brasileiros, cansados dos seus políticos. Organizações da sociedade civil querem participar no esforço da Presidente para fazer "um novo pacto" social
"Volta, Lula", ouve-se dizer cada vez mais no Brasil.
A Presidente Dilma Rousseff teve uma semana negra, com as manifestações que não
pararam mesmo depois de ela ter prometido "um novo pacto" com a sociedade.
Procura agora um novo estilo político, que passa pela constituição de um
gabinete de crise, enquanto as manifestações continuam, em São Paulo, no Rio de
Janeiro e noutras cidades, mais fraccionadas, por assuntos diferentes.
Agora, 32 organizações da sociedade civil escreveram à Presidente,
pedindo-lhe um lugar à mesa na reunião que anunciou no discurso que fez
sexta-feira à noite, no qual prometeu juntar-se com governadores e prefeitos das
principais cidades brasileiras e com os líderes das manifestações que deixaram
os políticos sem saber como reagir. Entre os signatários estão a Central Única dos Trabalhadores, a maior central sindical brasileira, o Movimento dos Sem-Terra, a União Nacional dos Estudantes, a União Nacional do Negro e o Conselho Indigenista Missionário, noticia o jornal Estado de São Paulo. Querem participar do diálogo para "encontrar saídas para enfrentar a grave crise urbana" nas grandes cidades.
Dilma Rousseff é conhecida como uma gestora distante dos políticos, distante do Congresso, que decide sozinha. Esta abertura aos governadores e políticos locais é já uma inversão na sua forma de actuar - e esta disponibilização das organizações da sociedade civil para trabalhar com a Presidente terá sido combinada com Lula da Silva, adianta ainda o Estado de São Paulo.
Disponibilizam-se para ajudar Dilma Rousseff a definir uma nova agenda política que vá de encontro às múltiplas exigências dos manifestantes - e, segundo uma sondagem da revista Época, 75% dos brasileiros apoiam as manifestações.
É um apoio esmagador para uma movimentação social que começou por causa da subida do preço dos transportes públicos. Mas não tão surpreendente se se levar em conta o quanto os brasileiros se sentem impacientes com os políticos que os representam, como diz José Álvaro Moisés, director do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo. "Todas as pesquisas de opinião mostram a enorme desconfiança e insatisfação com as instituições de representação, em particular os partidos e o Congresso Nacional", explica, por email.
A emoção de Milton
"Por último, está a questão da corrupção, percebida como perpassando todos os níveis da administração pública, e da qual foi protagonista em anos recentes o partido do Governo, o PT - daí o clamor e revolta de milhões de brasileiros", adianta o investigador, para explicar por que é que este movimento está a gerar tanto apoio.
O cantor e compositor Milton Nascimento, em entrevista à agência noticiosa EFE, disse estar emocionado com os protestos. "As pessoas nas ruas sabem do que necessitamos. Sabemos há séculos. A exploração, a corrupção e a omissão... tudo segue igual, desde que estas terras foram ocupadas. Só que agora ocorreu o que os políticos não esperavam: o povo está passando da conta e, mais importante, vai cobrar caro."
O trabalho que Dilma e os restantes políticos brasileiros têm pela frente, para tentarem reencontrar-se com os interesses do povo brasileiro, é vasto. "Nos três últimos anos, a economia brasileira cresceu a níveis irrelevantes (em 2012, foi menos de 1%), a inflação voltou e superou a meta estabelecida pelo Governo [6,5% para 2013], e os serviços públicos têm um custo fiscal (impostos) de tipo escandinavo [36% do PIB, diz a revista The Economist], mas resultados de tipo nigeriano", sublinha José Álvaro Moisés.
Desinteresse pelos políticos tradicionais.
Presidente do Supremo agrada a manifestantes
Os brasileiros que participam nas manifestações estão
dispostos a ir votar? Um estudo Datafolha mostra que 87% apoiam a democracia, e
50% dizem que saíram à rua para protestar contra a corrupção, mas iriam votar.
Embora não nos candidatos habituais. Quem lidera as preferências para a
Presidência da República (as eleições são já em 2014) é Joaquim Barbosa,
presidente do Supremo Tribunal Federal (30%). Em segundo lugar, está a
ex-senadora Marina Silva (22%), que está a organizar uma nova formação política,
a Rede Sustentabilidade, com a qual tentará voltar a disputar as presidenciais
de 2014. Mas a verdade é que a abstenção tem aumentado no Brasil: nas eleições
municipais de Outubro do ano passado, 37 milhões dos 141 milhões de eleitores
não foram votar. Além disso, 3,3 milhões foram às urnas mas não votaram em
ninguém. Essa tendência, diz o jornal O Globo, regista-se sobretudo entre os
mais jovens, dos 16 aos 18 anos, para quem o voto é facultativo, e entre os
maiores de 70 anos.
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