"Em Novembro de 2012, já depois da entrevista de Elísio Summavielle, uma técnica superior da então Direcção Regional de Cultura de Lisboa e Vale do Tejo propôs o arquivamento do processo de classificação da avenida, por considerar que "a protecção jurídica dos imóveis individualmente classificados e a zona especial de protecção garantem uma evolução da avenida com respeito pelos seus valores patrimoniais relevantes e que o PUALZE garante uma adequada gestão da área".
Flávio Lopes e Teresa Gamboa constituiram a chamada "Via Verde", criada e apoiada por Summavielle para acelerar e "despachar" os Projectos/ CML sobre a alçada de Manuel Salgado, na sua assim chamada "Reabilitação Urbana" ... cujos resultados em termos de Salvaguarda do Património Arquitectónico estão à vista de todos ...
Foi preciso esperar mais de 20 anos para a Avenida da Liberdade ser classificada de interesse público.
Por Inês Boaventura in Público
19/06/2013
Não vingou a posição do anterior director-geral do Património Cultural, que entendia que faltava "coerência" à avenida
Mais de 23 anos depois de um despacho da então secretária de Estado da Cultura, Teresa Patrício Gouveia, ter determinado a abertura do processo de classificação da Avenida da Liberdade, em Lisboa, a artéria cuja génese remonta ao período pombalino e à criação do Passeio Público foi finalmente classificada como conjunto de interesse público.
A portaria que determina a classificação da avenida, que se divide entre as freguesias do Sagrado Coração de Jesus, São José, Santa Justa e São Mamede, foi ontem publicada no Diário da República. No documento diz-se que "o conjunto edificado, nas suas distintas e ininterruptas fases construtivas, assume valor fundamental para a história e para a identidade de Lisboa, apresentando-se como espaço público de notável carga simbólica e de projecção nacional".
"A Avenida da Liberdade representa a um só tempo a ruptura entre a cidade romântica e a cidade progressista e liberal, e a continuidade do plano iluminista da Baixa, conservando a vocação de espaço de lazer do antigo Passeio Público nas faixas centrais ajardinadas e arborizadas", acrescenta-se na portaria, assinada pelo secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier.
Mas o desfecho deste processo, iniciado em Dezembro de 1989, podia ter sido outro caso tivesse vencido a posição expressa em 2012 pelo então director-geral do Património Cultural. Na altura Elísio Summavielle, que tinha sido secretário de Estado da Cultura e, antes disso, presidente do Instituto Português do Património Arquitectónico (Ippar) e director do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar), manifestou a intenção de deixar cair o processo de classificação da Avenida da Liberdade. "Neste momento, é difícil justificar a coerência da Avenida da Liberdade como conjunto. Se há alguma coerência, ela limita-se ao alcatrão. A classificação será uma redundância anacrónica", disse, numa entrevista ao PÚBLICO, em Agosto do ano passado.
Elísio Summavielle invocou dois outros argumentos para abandonar uma intenção com mais de 20 anos: o facto de "a maior parte" daquela artéria estar "abrangida por zonas de protecção de imóveis classificados, o que lhe confere já uma protecção efectiva" e a existência, na Câmara de Lisboa, de "instrumentos de gestão territorial que garantem uma evolução mais coerente e ordenada para aquele espaço urbano", nomeadamente o Plano de Urbanização da Avenida da Liberdade e Zona Envolvente (PUALZE).
Ontem, confrontado com a classificação publicada no Diário da República, o antigo director-geral do Património Cultural afirmou que esta foi uma decisão tomada com "toda a legitimidade", mas com a qual não pode concordar. "As divergências que tinha mantêm-se. Mais de metade dos edifícios já estão descaracterizados. Como conjunto patrimonial, a avenida não tem coerência", defendeu, criticando o facto de, a partir de agora, um imóvel como o Hotel Vitória, de Cassiano Branco, passar a ser "tão importante" como um qualquer edifício sem valor patrimonial.
Questionado sobre como se permitiu que a Av. da Liberdade perdesse a "coerência" de que fala, Elísio Summavielle diz que isso aconteceu "com muita complacência por parte das autoridades". Uma atitude da qual o antigo presidente do Ippar e director do Igespar se distancia: "No meu tempo, as aberrações já estavam todas feitas, não se construiu nada de novo", garante o actual candidato à Câmara de Mafra pelo PS.
Em Novembro de 2012, já depois da entrevista de Elísio Summavielle, uma técnica superior da então Direcção Regional de Cultura de Lisboa e Vale do Tejo propôs o arquivamento do processo de classificação da avenida, por considerar que "a protecção jurídica dos imóveis individualmente classificados e a zona especial de protecção garantem uma evolução da avenida com respeito pelos seus valores patrimoniais relevantes e que o PUALZE garante uma adequada gestão da área".
No seu parecer, a arquitecta Teresa Gamboa sublinhava que "os imóveis de maior valor foram já classificados individualmente" e que "foi fixada uma zona de protecção conjunta aos imóveis classificados situados na Avenida da Liberdade e nas áreas adjacentes, com o objectivo de permitir uma visão integradora de todo esse património". Além disso, dizia, "ao longo dos últimos 20 anos, todos os projectos de arquitectura realizados no local foram acompanhados e aprovados pela entidade competente do património cultural", tendo sido substituídos "alguns imóveis quando se verificou que estes ou não possuíam valor arquitetónico relevante, ou se encontravam em muito mau estado de conservação".
Posição contrária teve a Secção do Património Arquitectónico e Arqueológico do Conselho Nacional de Cultura, que, em Novembro de 2012, se pronunciou favoravelmente à classificação, "atento o superior interesse nacional da preservação dos valores culturais, estéticos, urbanísticos, arquitectónicos, paisagísticos, sociais e históricos que o conjunto urbano da Avenida da Liberdade materializa enquanto eixo fundamental da cidade de Lisboa". Foi com base nesse parecer que a nova directora-geral do Património Cultural, Isabel Cordeiro, anunciou em 6 de Dezembro, um mês depois da sua posse, que ia propor ao secretário de Estado da Cultura a classificação ontem concretizada.
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