A força dos çapulcu é combaterem Erdogan no seu território.
Por Paulo Moura, em Istambul / Público
10/06/2013
A zona da Praça Taksim sempre foi radical. É o bairro dos artistas, dos boémios, dos ateus, dos revolucionários.Construção de monumento islâmico poria ordem no antro dos çapulcu
Hoje em dia, Sinan considera-se um çapulcu. Com orgulho. Para o provar, traz umas calças de ganga todas rasgadas e uma t-shirt com a estátua da liberdade a ser estrangulada. "Sou um çapulcu. Toda a gente aqui à volta é çapulcu".
Foi isso que o primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, disse que eles eram, num discurso. Eles, os que se manifestam na Praça Taksim contra a construção de um centro comercial no parque Gezi, e a favor da demissão dele, Erdogan. Mas, no fundo, referia-se à "fauna" de Taksim, Beyoglu e Pera. Çapulcu quer dizer, em turco, algo como "bandido", "vadio". O significado não é muito preciso, mas uma coisa é certa: não é nada de bom.
Num dos discursos recentes, Erdogan chegou mesmo a clarificar: "Esses que se autodesignam como jornalistas, ou artistas...". Essa gente. Os çapulcu.
O primeiro-ministro, que todos reconhecem ser um homem muito poderoso (demasiado, dizem ser o problema), tudo o que toca transforma em ouro. Bastou pronunciar a palavra para ela se transformar numa coisa boa. Çapulcu é agora um emblema, uma palavra de ordem. E uma arma. Se até aqui havia muitos sectores da sociedade sem a consciência do que os unia, agora perceberam. Fazem parte de um grupo.
Os manifestantes construíram barricadas nos acessos à Praça Taksim, para que os veículos da polícia não consigam entrar. Mas não em todos. Estrategicamente, algumas ruas estão abertas, embora bloqueadas nos seus acessos mais adiante. Estão abertas para que os çapulcu possam circular.
O principal eixo deste movimento é a Rua Istiklal (que significa Independência). Segue durante um quilómetro e meio, só para peões (3 milhões por dia, em fins-de-semana normais), até à praça de Karakoy. Forma um conjunto com todas as ruelas perpendiculares e adjacentes, um bairro cosmopolita, artístico, tradicional e... radical.
Nos últimos dias, toda a zona se tornou o palco da enorme manifestação permanente. As pessoas não se mantêm na Praça Taksim e no Parque Gezi: circulam pela Istiklal e arredores. As manifestações de grupos profissionais ou outros desfilam pelas ruas, os grupos de música ou percussão tocam nas esquinas. A manifestação nunca está quieta. À primeira vista, parece que os grupos seguem pela Istiklal em direcção à praça, para ficarem lá. Mas, pouco depois, vemo-los voltarem para trás, e de novo para a frente.
Sinan teve uma educação muçulmana. Como quase toda a gente no país, aliás. Mas depois foi evoluindo para formas mais pragmáticas de ver o mundo. "Não acredito em Deus", diz ele hoje. "Sou um materialista". Com a vida, que não tem sido fácil, Sinan aprendeu a acreditar apenas naquilo que pode confirmar e compreender. Se alguma lhe tem sido útil, é a lógica. "Se Deus existe, então por que criou os gays, quando a homossexualidade é banida pelo Corão? Não faz sentido".
Sinan tem 29 anos, um corpo franzino e olhos pequenos e vivos, um emprego num hotel de luxo, quatro namoradas e uma vida boémia. "Nunca me deito antes das seis da manhã. E gosto de beber álcool. Há anos que escolhi este estilo de vida".
Olhando em redor, vê-se que não é um excêntrico. Às três da manhã, a Istiklal está tão cheia como às três da tarde. Os bares estão cheios, os restaurantes abertos, servindo refeições a qualquer hora. Música em alto volume soa de todos os lados, vendedores de rua apregoam e tocam apitos e cornetas, multidões de bêbados vagueiam de um lado para o outro.
Os bairros de Taksim, Beyoglu e Pera são um mundo com regras próprias. As ruas não têm trânsito e estão pejadas de lojas, umas luxuosas, outras miseráveis, umas modernas, outras tradicionais. Há cafés com mesas ao ar livre, outros com decorações temáticas, ou de design, restaurantes de todas as culinárias e etnias. Abundam as lojas de antiguidades e velharias, as que vendem pósteres antigos e postais. Há centenas de livrarias e alfarrabistas, perfumarias, milhares de barbearias, cheias de espelhos e reluzentes instrumentos antigos.
Há bancas com livros nas ruas, carrinhos de supermercado com livros, caixotes, pilhas de livros. Há gatos a passear ou a dormir em cima dos livros, velhos a fumar narguilés em bancos junto às portas, outros a jogar jogos antigos, em tabuleiros sebentos. Há galerias de arte, lojas de quadros e molduras, homens a vender mexilhões com limão, outros com expositores de artesanato no chão, pulseiras e brincos de prata, tocadores de flauta e concertina, acrobatas, barbudos com um macaco ao ombro ou uma salamandra gigante.
"As pessoas que vivem aqui são laicas, radicais, artistas. Têm um estilo de vida próprio, diferente do que se pratica no resto da Turquia", diz Ahsen, de 26 anos, designer. Ela mora aqui, num andar minúsculo da rua Mis Sokak, perpendicular à Istiklal. ? ?As manifestações contra o Governo são sempre nesta zona. Isto é como se fosse um país à parte, ninguém obedece às normas dominantes. É por isso que Erdogan quer construir cá o seu "templo". Quer acabar com este antro de çapulcu".
Não há uma parede no bairro que não esteja coberta de grafitti. "Erdogan demite-te!" é a mais suave de todas. De resto, a palavra çapulcu é a mais repetida, nos muros, em bandeiras e faixas, nas t-shirts.
O monumento que o Governo quer construir no lugar do Parque Gezi é um antigo quartel de artilharia do Império Otomano, o Taksim Topçu Kislasi, que foi demolido em 1940. "A intenção dele não é inocente", acha Sinan. "Foi nesse lugar que Ataturk mandou matar seis imãs otomanos. Esse monumento é simbólico. Ele quer que a ordem islâmica volte a vigorar nesta zona".
Ahsen pensa que a decisão de Erdogan é uma prova da sua arrogância: "Quer mostrar que é sempre ele que manda, e que tem a última palavra. Não suporta que o centro de Istambul, a cidade mais importante da Turquia e uma das mais importantes do mundo, seja dominado por gente que não acredita em Deus e leva uma vida contra o Corão. Quer pôr ordem aqui. A sua ordem. Mas não vai conseguir".
Recep Tayyip Erdoğan dismisses Turkey protesters as vandals.
Turkish prime minister challenges anti-government protesters to beat his party at the ballot box as demonstrations enter 10th day
Associated Press in Ankara
guardian.co.uk, Sunday 9 June 2013 17.16 BST /
http://www.guardian.co.uk/world/2013/jun/09/recep-tayyip-erdogan-turkey-protesters-looters-vandals
Turkey's prime minister has climbed on top of a bus to give a fiery speech to thousands of his supporters, challenging increasingly angry anti-government protesters to beat his party at the ballot box after they flooded the streets for a 10th day of demonstrations.
On Sunday Recep Tayyip Erdoğan visited two cities where unrest has occurred and again condemned his detractors as a handful of looters and vandals.
In the southern city of Adana, where pro- and anti-government protesters clashed on Saturday night, Erdoğan greeted supporters before lashing out at his opponents in the polarised country.
"We won't do what a handful of looters have done. They burn and destroy …They destroy the shops of civilians. They destroy the cars of civilians," Erdoğan told supporters who had greeted him at the local airport. "They are low enough to insult the prime minister of this country."
He urged his supporters to avoid violence and predicted that his Islamic-rooted party would defeat his opponents during local elections in March. "I want you to give them the first lesson through democratic means in the ballot box," he said.
The nationwide anti-government protests were sparked by outrage over police use of force against an environmental protest in Istanbul on 31 May, and have grown into a display of discontent toward Erdoğan's government.
Many accuse the prime minister of becoming increasingly authoritarian after 10 years in power and of trying to impose his conservative, religious mores in the country, which is governed by secular laws. Erdoğan has rejected the accusations, insisting he respects all lifestyles and is the servant of his people.
He has repeatedly branded the protests as illegal efforts to discredit his government before local elections next year. He frequently refers to the 50% majority he received in the 2011 elections to dismiss the protest as attempts by a minority group to dominate a majority of his supporters.
"As long as you walk with us, the Justice and Development party administration will stand strong," Erdoğan said. "As long as there is life in my body, your prime minister and your party chairman, God willing, will not be deterred by anything."
He then travelled to the city of Mersin, where anti-protests have been held, to make a similar speech and to open new sports facilities, where he defended his government's democratic credentials, and criticised protesters for not taking to the streets to defend the rights of female students who were barred from studying at Turkish universities because of bans enforced by previous governments on Islamic-style headscarves. "What did you do for the freedom of those who couldn't go to universities?" he said.
Erdoğan was also scheduled to travel to the capital, where thousands of supporters were preparing to greet him in a show of force. The prime minister's refusal to moderate his tone caused dismay in Ankara, where thousands of protesters again gathered in a central square close to government offices, a day after police used tear gas and water cannons to oust them from the area.
"As the prime minister continues (with) his harsh style, the resistance also continues and is getting bigger," said Çağdaş Ersoy a 23-year-old student who joined the protests in Kizilay square. "He is making the resistance bigger without realizing it."
Another protester, Cihan Akburun, said: "Erdoğan should not provoke the people. We invite everyone to common sense."
Tens of thousands of demonstrators gathered in Taksim Square, Istanbul, where a violent police crackdown on a sit-in to prevent the demolition of its Gezi park triggered the unrest. The government has vowed to proceed with plans to redevelop Taksim, replacing the park with a replica Ottoman barracks. It has since reconsidered plans to build a shopping mall.
In Adana on Saturday night, a pro-government group hurled stones at marching anti-government demonstrators, the state-run Anadolu agency said. Police evacuated women and children, but the protesters continued to clash with stones and batons.
It was the second time in the past 10 days of protests that pro- and anti-government protesters had fought with one another. On Thursday, party supporters attacked about 30 protesters in the city of Rize, on the Black Sea coast.
Three people have been killed in the protests, including a police officer in Adana who fell into an underpass that was under construction while chasing demonstrators. Thousands have been injured.
Erdoğan said the demonstrators had martyred the police officer, and defended the law-enforcement officers, dismissing calls by some protesters that officers engaged in abuse be sacked. "We won't sacrifice our police to their wishes," he said. "We cannot leave the streets for anarchists and terrorists to roam." The government had previously apologised for the excessive force used to roust the environmental protesters.
Erdoğan blamed the protests on forces that were trying to prevent Turkey's rise. "There are those who cannot stomach Turkey becoming greater and stronger," Erdoğan said. "They don't want any investments in Turkey."
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