O pai, o filho, a maçonaria e as
suspeitas
PAULO PENA
01/05/2014 – PÚBLICO
Há uma coincidência rara nos percursos de João Rosado Correia, pai, e João
Alberto Correia, filho.
João Correia é
arquitecto, maçon, professor e influente nos corredores da política
governativa. O seu pai também era. Também ele se chamava João.
João Rosado
Correia, o pai, que faleceu em 2002, foi ministro do Equipamento Social, nos tempos
do bloco central, um Governo que juntou PS e PSD, sob a liderança de Mário
Soares. E também viu o seu nome envolvido num escândalo.
No dia 15 de
Agosto de 1987, dois anos após a sua saída do Governo, a sua foto aparecia na
primeira página do Expresso: “Ex-ministro trouxe dinheiros de Macau para o PS”.
A história tem todos os ingredientes de uma narrativa negra, e envolve queixas
de extorsão, vinganças políticas e muitos detalhes que o correr do tempo se
encarregou de soterrar.
Rosado Correia,
revelava o Expresso, estava no aeroporto de Hong Kong quando foi interceptado
por António Vitorino, à época governante em Macau, que o intimou a devolver
três milhões de patacas (300 mil euros) que tinha em seu poder. A partir daqui
as versões divergem. Fonte próxima de Vitorino, citada pelo Expresso, garantia
que o dinheiro provinha de uma "extorsão" sobre empresários
macaenses.
Rosado Correia
dizia que o dinheiro era fruto de uma "colecta de fundos" de que fora
encarregado pelo PS. E acusava Vitorino, indirectamente, de ter impedido o
dinheiro de chegar ao partido, de procurar "estrangular
financeiramente" a direcção do PS, na altura presidida por Vítor
Constâncio. Duas versões opostas e nunca esclarecidas. Até porque o caso nunca
foi alvo de nenhuma acusação.
O empresário
chinês da construção Ng Fok confirmou ter dado o dinheiro. O Expresso cita
fontes do Governo de Macau que garantem que, como contrapartida, lhe seria
perdoada uma multa. Para complicar tudo, umas versões falam de uma mala com
dinheiro, outras de cheques. Segundo Vitorino, o dinheiro foi apreendido.
Segundo Rosado Correia, o dinheiro acabou por chegar a Lisboa. Aparentemente, a
dívida foi mesmo perdoada.
E João, pai,
escapou a uma acusação. Mas não voltaria à ribalta política.
João Alberto
Correia, o filho, também frequentou o Terreiro do Paço, mas apenas como
director-geral de Infra-Estruturas e
Equipamentos do Ministério da Administração Interna. Também ele acabou por
sair, entre suspeitas.
Mas não se ficam
por aqui as coincidências. Nos nomes, nos episódios, na formação em
Arquitectura, no berço alentejano, na militância socialista. E em algo mais
misterioso.
João, pai, foi
grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, o maior ramo maçónico português. O
filho é membro de uma loja com peso histórico, a 25 de Abril. A sua nomeação
para o Ministério da Administração Interna deve-se a outro maçon, também do
GOL, Rui Pereira, na altura ministro, que se orgulhava, numa entrevista à SIC,
de nunca ter sido "proposto ou nomeado para nenhum cargo por um
maçon".
A maçonaria é um
ponto central na vida de João, filho. Integrou o conselho editorial da Revista
de Segurança e Defesa, tal como consta do seu currículo, com um restrito grupo
de maçons influentes, como Ângelo Correia e o próprio António Vitorino, que há
18 anos acusara o seu pai.
Mas o ex-líbris
da família é a Fundação Convento da Orada, fundada em 1988 – pouco depois do
escândalo de Macau – por João, pai, e presidida entre 2006 e 2008 por João,
filho. Com sede em Monsaraz, a fundação detém uma universidade, a Escola
Superior Gallaecia, que funciona em Vila Nova de Cerveira, e onde João, e
vários familiares, integram o corpo docente.
João Alberto
Correia tem 49 anos, e é o mais velho de seis irmãos . É doutorado em
Arquitectura pela Universidade de Salford, Reino Unido. Ao contrário do pai,
não assina com o título "professor doutor arquitecto". Mas tem
interesses muito variados, que não se resumem à arquitectura.
Foi adjunto de
Conde Rodrigues, quando este ocupou a Secretaria de Estado da Justiça. Dirigiu
cursos na extinta – e também polémica – Universidade Independente. Integrou a
Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária. Foi membro da
Associação Nacional de Jovens Empresários. E também, em simultâneo, sindicalista
do Sindep. Durante sete anos presidiu a um pouco conhecido Instituto para o
Desenvolvimento Sustentável.
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