Extrema-direita e eurocépticos estão com dificuldades para
se organizarem no novo Parlamento Europeu
Isabel Arriaga e Cunha (Em Bruxelas)
26/05/2014 - PÚBLICO
Funcionamento do Parlamento Europeu não ficará comprometido,
se os grupos parlamentares pró-europeus se aliarem.
Apesar de terem entrado em força no Parlamento Europeu (PE)
em resultado das eleições europeias de domingo, os partidos de extrema-direita
e eurocépticos radicais estão a enfrentar grandes dificuldades para se
organizarem, de modo a poderem pesar de alguma forma entre os 751 deputados dos
28 países da União Europeia (UE).
Embora o novo PE – que arranca a 1 de Julho – seja mais
heterogéneo do que o cessante, o seu funcionamento não estará comprometido,
desde que os grupos parlamentares pró-europeus se aliem para conseguir as
maiorias parlamentares necessárias para a aprovação da legislação comunitária.
Nenhuma maioria será possível sem uma aliança entre o PPE
(centro-direita, que se mantém o maior grupo com 214 deputados) e os
socialistas (189 eleitos). Os dois grupos acumulam em conjunto 403 votos, mais
do que os 376 necessários para constituir uma maioria absoluta.
Os liberais – por enquanto com 66 deputados – deverão
associar-se para reforçar esta maioria, de modo a colmatar a eventual cisão de
alguma delegação nacional nalguma decisão específica, o que acontece com
frequência. Se os 52 verdes se juntarem, o PE contará com uma maioria
pró-europeia mais do que confortável de 521 deputados.
A ser assim, os extremistas e eurocépticos não terão grande
poder de obstrução do trabalho do PE, mas poderão, em contrapartida, gerar uma
boa dose de ruído susceptível de fazer hesitar os partidos rivais pró-europeus
dos respectivos países na votação de alguma medida vista como excessivamente
“europeia”.
É neste contexto, aliás, que Daniel Gros, director do centro
de reflexão europeu CEPS, acredita que os extremistas/eurocépticos vão
conseguir pressionar os partidos ao centro para alterarem de alguma forma,
mesmo que marginal, as regras da livre circulação de cidadãos, embora sem pôr
em causa o princípio em si, para acabar com o “turismo dos subsídios” dos
europeus mais pobres nos países mais ricos que se tornou uma causa popular
entre os antieuropeus.
Este poder de pressão será tanto maior quanto os dois grupos
de deputados antieuropeus – extremistas liderados pela francesa Marine Le Pen,
de um lado, eurocépticos radicais do britânico Nigel Farage do outro –
conseguirem constituir grupos políticos de pleno direito para poderem
beneficiar de tempo de palavra, financiamento e apoio parlamentar reforçado.
Certo, para já, é que Le Pen, líder do partido francês
Frente Nacional (FN), não se juntará a Farage, líder do UKIP, que defende a
saída do Reino Unido da UE, e que recusa ser associado a movimentos vistos como
racistas. Os dois partidos foram os mais votados nos respectivos países,
elegendo 24 deputados cada num total nacional de 74 eleitos.
Os dois líderes estão, aliás, em plena “caça” a uma série de
partidos estreantes ou repetentes que hesitam sobre qual grupo integrar, de
modo a poderem cumprir os limiares de 25 deputados originários de sete países
da UE que são necessários para a constituição de um grupo político e até 23 de
Junho, a data- limite para poderem arrancar com a nova legislatura.
Ao contrário de Farage, que tem a sua própria bancada
parlamentar (EFD) no PE cessante – embora ainda não seja seguro que a consiga
manter –, os partidos de extrema-direita nunca conseguiram formar um grupo
político, o que os obrigou a integrar um agrupamento de deputados classificados
como “não inscritos”, sem qualquer tipo de estrutura ou coesão interna, o que
os tornou praticamente inaudíveis.
Nem Le Pen, nem Farage têm neste momento qualquer garantia
de conseguir preencher o limiar de países exigido, embora a francesa enfrente à
partida maiores dificuldades do que o britânico.
Só os 24 eleitos da Frente Nacional preenchem praticamente a
quota do número de eleitos para a formação de um grupo.
O problema é que por enquanto só os partidos de cinco países
estão dispostos a juntar-se a Le Pen: Áustria (FPÖ, o mais votado), Bélgica
(Vlaams Belang), Holanda (PVV de Geert Wilders) e Itália (Liga do Norte, que
deverá saltar do grupo de Farage para o de Le Pen) – o que garante um total de
38 deputados.
Farage está exactamente com o mesmo problema. Além dos 24
eleitos pelo seu UKIP, conta para já com mais cinco deputados originários da
Lituânia, Grécia, Holanda e República Checa, num total de 29. Tal como Le Pen,
faltam-lhe partidos de dois países para preencher a quota.
Quatro partidos antieuropeus permanecem indecisos sobre que
grupo integrar: o de Le Pen, o de Farage ou o dos conservadores britânicos
(ECR), o único dos três que preenche todos os limiares necessários para se
manter, com 59 eleitos de dez países diferentes. E que incluem os sete eleitos
pelo recém-criado partido eurocéptico alemão que quer acabar com o euro (AfD) e
que Farage também está a tentar conquistar.
Três dos partidos indecisos – da Finlândia, Suécia e
Dinamarca – têm dito que gostariam de permanecer juntos. Dos três, os
dinamarqueses e os finlandeses já declararam formalmente que nunca se juntarão
a Le Pen e hesitam entre Farage e os conservadores britânicos.
A dúvida que permanece tem sobretudo a ver com as intenções
dos suecos e de um quarto partido populista indeciso, da Polónia.
Confirmado está, por outro lado, que os sete deputados
originários de partidos assumidamente nazis – um alemão, três gregos e três
húngaros – não integrarão o grupo de Le Pen, que tem procurado afastar-se das
teses mais radicalmente anti-semitas ou anti-islâmicas defendidas pelo seu pai
e fundador da Frente Nacional, Jean-Marie Le Pen. Estes sete deputados ficarão
assim relegados para os “não inscritos”, que por enquanto somam 25 membros.
Cerca de 21 deputados originários de formações que não estão
actualmente representadas no PE e que poderão ainda vir a integrar algum dos
actuais grupos incluem os 17 deputados do partido populista italiano de Beppe
Grillo, e o partido português MPT, de Marinho e Pinto, que está a ser abordado
tanto pelos verdes como pelos liberais
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