Liberdade com pulseira
electrónica
Por Luís Rosa
publicado em 19
Maio 2014 – in (jornal) i online
Apesar da saída da troika, o essencial continua por fazer: a reforma do
Estado e adequar as despesas aos recursos
Parece que
voltámos a ser livres. Com a saída da troika, no sábado, estamos numa espécie
de liberdade condicional com pulseira electrónica directamente ligada ao
terminal da Comissão Europeia em Bruxelas. Nos últimos dias, vários dirigentes
europeus, como o director do Fundo Europeu de Estabilização Financeira,
recordaram que Portugal tem de continuar as reformas para baixar a dívida
pública que ameaça ultrapassar os 130% do PIB, e o défice de forma a cumprir o
Pacto de Estabilidade e o tratado orçamental. É uma evidência a que nenhum
partido responsável, como o PS voltou a recordar este fim-de-semana no seu
manifesto eleitoral, poderá fugir. Daí a liberdade condicional com as ameaças
de um segundo resgate pelo meio.
Três anos depois,
conseguimos cumprir os objectivos e mandar a troika embora. Com enormes custos
e sofrimento para os portugueses mas com a credibilidade reposta e um início de
um crescimento económico sustentável. Esse é o resultado global positivo mas há
dois pontos em que os críticos anti-troika têm absoluta razão: houve falhas
clamorosas nas previsões do défice, taxa de desemprego, do PIB e o empréstimo e
a intensidade da austeridade contribuiram para um aumento exponencial da
dívida, em vez de contribuir para a sua redução. Mas essas falhas não
significam que Portugal tivesse outra alternativa ao empréstimo da troika. Não
tinha. Só quem acredita em bruxas e fantasmas pode deixar-se convencer com a
argumentação PEC IVde José Sócrates de que Portugal em 2011 não estava a
caminho da bancarrota. Os desesperados políticos que tentam rescrever o seu
lugar na História merecem a nossa condescendência e piedade mas não a aderência
à sua fantasia.
A política da
troika obrigou a aplicar mudanças bruscas, em três anos, que poderíamos ter
feito de forma muito mais cómoda nos últimos 15 anos – e não o fizemos
exclusivamente por culpa própria. Diminuição drástica do investimento público
quando poderíamos não ter contratado mais de 20 PPP como fizemos nos anos do
governo Sócrates, flexibilização das leis laborais quando poderíamos ter mudado
as nossas rígidas leis de forma mais serena, privatização de empresas públicas
que poderiam ter sido feitas em condições muito mais favoráveis para o Estado,
reorganização da organização administrativa da Justiça, Educação e Saúde quando
os problemas decorrentes da desertificação do interior e da baixa taxa de
natalidade remontam aos anos 90, entre muitos outros pontos.
Mas o essencial
continua por fazer: reformar o Estado social e administrativo e adequá-los à
riqueza gerada pelo país. Essa é uma tarefa que a base social de apoio do
governo esperava que já tivesse sido iniciada. À parte de medidas casuísticas,
nada foi feito. Porque além do tempo de emergência financeira, o governo deixou-se
condicionar pela narrativa chantagista da esquerda sobre uma acusação
fantasiosa de neo-liberalismo, seja lá o que isso for, e não aplicou o programa
que se impunha: reformar o Estado para reduzir a carga fiscal e aplicar o
programa de ajustamento com um enfoque essencial na redução da despesa. Ao
optar por sucessivos aumentos de impostos, o governo enganou os seus eleitores
e falhou de forma clamorosa.
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