Portugal: primeiro estranhamos e
depois conformamo-nos
Por Eduardo
Oliveira Silva
publicado em 17 Maio
2014 / in (jornal) i online
Os dados objectivos não se prestam a euforias neste dia 17 de Maio, que
apenas marca a nova forma de a troika cá estar
É difícil
imaginar a alegria e as festividades que vão por esse país fora neste dia 17 de
Maio, em que Portugal se liberta do jugo opressor da troika.
Estando a ser
preparada na sexta-feira, dificilmente nesta edição se poderá anunciar quantos
Vasconcelos terão sido já defenestrados neste novo dia de Restauração à hora a
que os leitores tomam contacto com a edição de
fim-de-semana.
Depois de tão
patriótica acção política de ajustamento, seria uma triste ingratidão a
população não acorrer ao Paço para saudar a efeméride e preferir ir para o
campo, para a praia, para o Jamor ou para a frente das televisões. Todavia, é
provável que faça isso mesmo e se marimbe para qualquer manifestação de júbilo
que não seja desportivo, mostrando uma cruel ausência de compreensão em relação
à data histórica que assinalamos. Mas percebe-se.
Na verdade, hoje
não comemoramos nada, porque Portugal não ganhou nenhuma autonomia suplementar.
Nem sequer se conseguiu concluir a 12.a avaliação com sucesso porque ela impõe
mais um conjunto escondido de sacrifícios balbuciados à pressa pelo governo
junto dos parceiros sociais.
Mesmo que se
ensaie na reunião do governo algum anúncio de prestidigitação triunfal, o que
se passa é que, como o i referia sexta-feira, caiu um balde de água fria e de
realismo em cima do executivo com os resultados do primeiro trimestre.
Depois de três
anos de troika e de 30 mil milhões de euros de austeridade, em que Portugal não
só não cresceu como teve uma contracção de 3,4% do PIB, tendo o défice
acumulado chegado a 15,3%, as pessoas vivem uma situação dramática. O país não
está melhor, apenas beneficia de uma conjuntura favorável. A economia não se
modificou, não houve desenvolvimento apesar da desvalorizarão do trabalho e a
situação social degradou-se. Cortaram-se vencimentos, pensões, regalias, postos
de trabalho públicos, gerou-se um desemprego enorme na área privada e muitos
dos mais preparados emigraram.
A necessária
reforma do Estado foi atirada para as calendas gregas e optou-se pela
multiplicação e pelos aumento de impostos. Tão responsável como os líderes
políticos da coligação, ou mais, por tamanho erro estratégico e de visão é
Vítor Gaspar, que abandonou o seu cargo e agora o país.
Exemplos não
faltam de que quase tudo está igual. Desta semana bastam dois: os juízes
continuam a ser todos muito bem pontuados quando se sabe que há situações
surrealistas protagonizadas por alguns e não se arranja um perfil para a
Autoridade Tributária, o que diz bem da degradação do prestígio do Estado e das
condições que oferece.
Tirando a venda
de grandes empresas sadias que deixaram de dar rendimento ao Estado através de
dividendos, não houve uma reestruturação significativa do sector empresarial do
Estado e a que se prepara é a fusão da Refer e da Estradas de Portugal,
susceptível de produzir o maior monstro de todos os tempos na área pública.
As mensagens de
optimismo não colam com a realidade, a ponto de estranhamente o próprio Passos
Coelho ter admitido a possibilidade de formar governo com os socialistas, o que
deixou consternado o CDS, que pode ser ele próprio a fazer o mesmo depois das
legislativas.
Já habituados a
que as mudanças nada mudem, os portugueses estão cada vez mais conformados e
indiferentes, como certamente se verá no dia 25.
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