VIDEO do Dia / OVOODOCORVO
Como ilustração de:
“Devido à passividade das autoridades e à impunidade dos
criminosos, Lisboa é internacionalmente conhecida por ser um paraíso para estes
‘taguistas’, que viajam de propósito para sujar ainda mais. Muito mau.”
Laurinda Alves
30/4/2019, 0:02
LISBOA
Rebeldes sem causa
Laurinda Alves
30/4/2019, 0:02
Em Lisboa, os vândalos que atacam tudo o que é pedra, nova
ou antiga, e assinam de forma nojenta tudo o que foi construído ou está a ser
reconstruído, não respeitam nada nem ninguém.
Não sei que sentimentos isto provoca nos outros, mas a mim
zanga-me e repugna-me. Isto, de que falo, é a revoltante mania de sujar com
sprays indeléveis e tags horríveis, verdadeiramente repugnantes, todos os
prédios, portas e portões, monumentos, casas, ruas, esquinas, alçados e outras
paredes da cidade.
Em Lisboa, os vândalos que atacam tudo o que é pedra, nova
ou antiga, e assinam de forma nojenta tudo o que foi construído ou está a ser
reconstruído, não respeitam nada nem ninguém. A obra pode ainda estar em curso,
que eles chegam perversamente armados de sprays só para sujar e deixar a sua
ilegível assinatura.
Há ladrões que ficam conhecidos por deixar sempre um grande
cocó nas casas que assaltam, para dizerem aos donos das ditas casas que se
estão literalmente a ‘cagar’ para eles. Os vândalos dos sprays fazem pior e
mostram, literalmente, que se estão nas tintas. Não defecam nem deixam matéria
orgânica, mas o que fica do lado de fora das casas é impossível de limpar com
detergente nem se pode desinfetar e, muito menos, varrer com uma vassoura.
Deixam riscos e traços descomunais, sem arte absolutamente
nenhuma, só para sujar e chatear. Fazem pinturas que degradam e obrigam a
gastar muito dinheiro para recuperar o que estragaram. Desolam proprietários e
moradores, mas também os homens das obras e todos os que se preocupam em cuidar
e recuperar o património da cidade.
O centro histórico de Lisboa é um cenário preferencial para
estes selvagens que quotidianamente chegam só para vandalizar. Curiosamente
esta gente age e ninguém reage. Destroem o que querem e nada lhes acontece.
Aparentemente nenhum polícia, nenhuma autoridade camarária se preocupa com o
assunto.
E, no entanto, não há dia ou noite que passe sem que sejam
feitas mais tags, tantas vezes umas em cima das outras, cada vez maiores e de
cores mais berrantes, para não passarem despercebidas. A voracidade destruidora
é tal que há cada vez mais casas e prédios irremediavelmente sujos.
Absurdamente pintados, mascarrados por uma legião de rebeldes sem causa que,
ainda por cima, comprometem a arte dos que fazem belos graffitis e, esses sim,
acrescentam valor à cidade.
Não existe qualquer semelhança entre um muro ou mural bem
graffitados e uma parede ou porta sujas por delinquentes do spray. Uns fazem
arte urbana, outros produzem traços abjetos. Uns salvam pela cor, pela genialidade
do traço e pela força das mensagens; outros destroem pelo prazer de destruir.
Só por isso.
Vi o que aconteceu no dia em que os pintores estavam a
acabar de pintar de amarelo todo o largo das Belas Artes, no coração do Chiado.
No preciso momento em que pousaram os pincéis e viraram costas para os irem
lavar, o largo foi invadido por um bando furtivo que sujou várias paredes de
preto, só pelo gozo de sujar.
Um pouco mais acima, já de frente para o Bairro Alto (todo
ele atravessado por ruas tagadas, devastadas, como se sabe) estão a ser
recuperadas várias casas e prédios, mas também um palacete que faz esquina, ao
Calhariz. Ainda a obra vai a meio e já a pedra antiga, acabada de ser limpa e
recuperada, está toda escrevinhada. Passei lá num dia de particular desânimo
entre os homens que tinham estado de volta da pedra semanas a fio. Fizeram um
trabalho rigoroso e deixaram tudo impecável, mas mal acabaram de arrumar as
ferramentas já as paredes estavam um nojo. Compreendo o seu desânimo e toda a
frustração que este terrorismo gráfico gera.
Não consigo conjugar verbos mais leves, nem usar adjetivos
menos fortes porque é impossível permanecer educado perante gente capaz de
tanta alarvidade e falta de sentido cívico. Não sei quem são e gostava de nunca
me cruzar com nenhuma destas pessoas para quem a cidade, as ruas, os monumentos
e as casas servem apenas para estragar, mas também não sei porque é que as
autoridades não atuam e fingem que não vêm o que está à vista de todos. Os
polícias fazem o seu giro dia e noite, e os agentes da CML também andam por
toda a cidade, mas ninguém, absolutamente ninguém, faz rigorosamente nada.
Sabemos que o presidente da Câmara de Lisboa é um homem
viajado e cosmopolita, que visita e é visitado por outros ‘mayors’ de grandes
cidades onde não há o menor vestígio de mãos que atacam com sprays. Estou a
pensar em Chicago, por exemplo, onde ninguém se atreve a tagar uma rua, um
prédio ou uma parede só para sujar e degradar. Há, pelo mundo, muitas outras
cidades e bairros históricos preservados destes bárbaros. Cidades onde foram
tomadas medidas eficazes de prevenção, quero dizer.
Num tempo em que a cidade de Lisboa está em alta e é
visitada por milhões de turistas, numa era em que importamos tanta coisa ‘do
estrangeiro’, como se diz, confunde-me que ninguém se importe com esta forma de
delinquência contra o património da cidade. Revolta-me que não preservemos o
que é nosso, de todos. E, insisto, repugnam-me estes e outros rebeldes sem
causa, que agem exclusivamente movidos pelo prazer de destruir e fazer mal.
P.S.: Devido à passividade das autoridades e à impunidade
dos criminosos, Lisboa é internacionalmente conhecida por ser um paraíso para
estes ‘taguistas’, que viajam de propósito para sujar ainda mais. Muito mau.
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