Surto de hepatite A não está
controlado. DGS preocupada com festivais de Verão
Surto só estará controlado depois de
50 dias sem novos casos e ainda estão a surgir cinco a oito novos doentes por
dia. Há registo de uma morte, mas não está relacionada com este surto.
ALEXANDRA CAMPOS e CLARA VIANA 5 de Abril de 2017, 7:01
Os responsáveis da Direcção-Geral da Saúde (DGS) admitiram
nesta terça-feira estar preocupados com a possibilidade de o surto de hepatite
A não estar controlado antes dos festivais de Verão, porque nestes eventos há
um aumento das práticas sexuais e as condições de saneamento são más, o que
potencia o risco de transmissão da infecção por este vírus. Desde Janeiro até
esta terça-feira foram notificados 138 casos em Portugal.
A preocupação foi sublinhada esta terça-feira numa
conferência de imprensa, em Lisboa, pelo director-geral da Saúde, Francisco
George. O responsável esteve reunido com a sua congénere espanhola, a directora
general de Salud Pública, Calidad e Innovación, Elena Andradas, para fazer o
ponto da situação sobre a hepatite A na Península Ibérica e definir estratégias
comuns para lidar com este surto.
Há uma manifestação (de "orgulho" LGBT), a World
Pride, marcada para Junho em Madrid, que está a suscitar grande preocupação.
Aguarda-se a presença de mais de dois milhões de pessoas e Espanha tem neste
momento cerca de mil casos já não dispondo de vacinas, segundo foi adiantado
também na conferência de imprensa.
No encontro com os jornalistas, a directora-geral de Saúde
de Espanha, Elena Andradas, adiantou que, desde Novembro, há mil casos
confirmados de hepatite A naquele país. “Em Espanha já não há vacinas",
sublinhou Diogo Medina, médico que integra o Grupo de Activistas em Tratamento
(GAT), e que faz parte do grupo de trabalho que está a rever as orientações
para profissionais de saúde.
Vacinas dadas noutras regiões
Portugal e Espanha estão mesmo a estudar a hipótese de
adquirir em conjunto de vacinas noutros países produtores, como a China e em
países da América do Sul. Em Portugal, as cerca de 12 mil doses disponíveis vão
passar a ser disponibilizadas, além de Lisboa (onde estão concentradas na
Unidade de Saúde Familiar da Baixa, no Martim Moniz), nas outras quatro regiões
de saúde do país (Norte, Centro, Alentejo e Algarve) e nas ilhas, disse.
Também está a ser estudada a possibilidade de serem usadas,
excepcionalmente, doses pediátricas da vacina de que o país dispõe. Tudo para
conseguir controlar o foco epidémico que foi conhecido na semana passada e que
não é exclusivo de Portugal – em 23 de Fevereiro, o Centro Europeu para a
Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC, na sigla inglesa) divulgou um balanço
("avaliação de risco") em que Portugal já figurava com pouco mais de
duas dezenas de casos, ao lado de mais 12 Estados-membros.
Desde então, os casos multiplicaram-se. A hepatite A, que
além da transmissão por via fecal-oral, também pode ser contraída através da
ingestão de água e alimentos contaminados, tem habitualmente uma evolução
benigna, os casos fatais são raros. Em Portugal, houve entretanto registo de
uma morte que não estará, porém, relacionada com este surto, como comprovaram
as análises efectuadas posteriormente, explicou Digo Medina. Todos os anos há
entre duas a três dezenas de casos de hepatite A no país, salientou.
Algumas das vacinas que fazem parte do stock nacional foram
entretanto requisitadas pela DGS às farmácias, pelo que não faz sentido que as
pessoas continuem a tentar adquirir vacinas nestes estabelecimentos, pediu o
director-geral da Saúde, Francisco George. “As vacinas têm que ser
administradas criteriosamente, à luz do princípio de que é vacinado quem
precisa de ser vacinado e não é vacinado quem não precisa”, enfatizou.
O director-geral da Saúde admite não saber quando é que este
surto estará controlado, porque o período de incubação é longo - “pode ir até
aos 50 dias”. Para que seja declarado controlado é necessário "ter um
mínimo de 50 dias sem novos casos", precisou Francisco George.
Grupos de risco
Face à escassez de vacinas e, tendo em conta a
impossibilidade de utilizar um tratamento preventivo, alternativa que chegou a
ser anunciado pela DGS (a imunoglobulina, uma solução dita de recurso por
ajudar a fortalecer o sistema imunitário e assim combater a infecção), foram
identificados três grupos a vacinar prioritariamente: as pessoas que
contactaram com doentes (os coabitantes e parceiros sexuais nos últimos 15
dias), os homens que fazem sexo com homens com práticas sexuais de risco para a
transmissão da infecção (sexo oro-anal) e também os viajantes que vão para
zonas com maior risco de contrair a infecção.
Francisco George explicou que, ao contrário do que tinha
sido afirmado, não vai ser possível utilizar a imunoglobulina disponível em
Portugal, porque esta não serve para prevenir a infecção pelo vírus da hepatite
A, pelo que este tratamento terá mesmo de ser substituído por vacinas. A DGS
está, entretanto, a rever as orientações que emitiu para conter o surto de
hepatite A.
A administração gratuita da vacina tem estado, por enquanto,
limitada a uma única unidade de saúde familiar em Lisboa (a da Baixa, no Martim
Moniz), onde desde segunda-feira foram vacinadas 25 pessoas. Dos casos
diagnosticados até esta terça-feira – com uma evolução de cinco a oito novos
infectados por dia –, cerca de metade estão concentrados na zona de Lisboa.
Diogo Medina frisa que o controlo deste surto com rapidez
vai depender, em parte dos médicos, porque estes é que receitam as vacinas.
Portugal e Espanha pertencem ao mesmo cluster. "O
começo do surto terá tido lugar com um espanhol que veio a Portugal ou um
português que foi a Espanha. Para que o surto seja declarado controlado temos
de ter um mínimo de 50 dias sem novos casos", insistiu Francisco George.
Actualmente, a média diária de novos casos oscila entre os cinco e os oito.
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