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O Mundo suspenso
pela imprevisibilidade de Trump …
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Donald Trump reinventa a sua
presidência com acções militares
O Presidente dos Estados Unidos, que
segundo as sondagens é o mais impopular de sempre, reverteu numa semana toda a
sua política externa.
Rita Siza
RITA SIZA 15 de Abril de 2017, 7:30
Dizem os amigos do Presidente dos Estados Unidos, Donald
Trump, que as suas opiniões costumam ser fortemente influenciadas pela posição
da última pessoa com quem falou e lhe apresentou o argumento mais convincente
que ouviu. Nos últimos dez dias, Trump falou com vários líderes mundiais – o
último foi o Presidente da China, Xi Jinping, com quem estabeleceu uma “boa
ligação” –, com os dois generais que escolheu para o Pentágono e o Conselho
Nacional de Segurança, James Mattis e H.R. McMaster, e também com a filha
Ivanka, agora oficialmente integrada nos quadros da Casa Branca.
Depois de conversar com a filha, o Presidente autorizou um
ataque dos Estados Unidos, com 59 mísseis Tomahawk, contra a base aérea síria
de al-Shayrat, em retaliação pelo massacre com armas químicas de “crianças
inocentes e lindos bebés” da província de Idlib, atribuído ao regime de Bashar
al-Assad. Depois de se despedir de Xi Jinping, convidado de honra do resort
Trump da Florida, os EUA movimentaram um porta-aviões para as águas da
península coreana, numa manobra destinada a temperar os impulsos do líder da
Coreia do Norte Kim Jong-un, que anda a ameaçar um novo ensaio nuclear. E na
sexta-feira, deu luz verde ao Pentágono para experimentar, pela primeira vez na
história, a “mãe de todas as bombas” na remota província de Nangarhar, no
Afeganistão, para destruir os túneis por onde se movimentavam militantes do
Daesh.
As decisões do Presidente norte-americano, que lhe valeram
os primeiros elogios e aplausos em Washington, representaram uma reversão total
da política externa que enunciou e prometeu aos seus apoiantes e financiadores
durante a campanha eleitoral. Trump, na sua versão nacionalista e
isolacionista, tinha jurado seguir uma única linha quando chegasse à Casa
Branca: com ele, seria a “América primeiro”. Mas esse slogan, impresso em
milhões de bonés vermelhos distribuídos entre as suas hostes, parece tão
esquecido como a construção do muro na fronteira com o México para conter
imigrantes.
Não foi só a política de não-intervenção militar no Médio
Oriente que caiu por terra numa semana. Trump fez um volte-face completo
noutras das promessas de campanha que animaram a sua base eleitoral. A NATO,
cuja utilidade questionou, deixou de ser obsoleta. A China, que pretendia
declarar como “manipuladora de moeda”, tornou-se aliada na pressão à Coreia do
Norte. A relação privilegiada com Vladimir Putin, que o Presidente sempre
acreditou ser possível, parece agora uma quimera. “De momento, não estamos a
dar-nos nada bem com a Rússia. Devemos mesmo estar no ponto mais baixo de
sempre do nosso relacionamento”, admitiu Trump na sexta-feira.
As reviravoltas, que aproximaram a agenda da Casa Branca da
cartilha republicana mais convencional, apanharam os comentadores e analistas
de surpresa – mesmo aqueles que escreveram tratados sobre a natureza
“imprevisível”, “inconsistente” e “volátil” de Trump (o próprio prefere
descrever-se como “flexível”). Muitos perguntam-se sobre o que justifica a
repentina mudança de 180 graus na postura do Presidente.
Mas mais importante do que saber isso, é perceber que nova
postura é essa. “Os desenvolvimentos da última semana levantam questões
legítimas sobre as posições do Presidente: afinal, em que é que Trump acredita,
tendo em conta que o que está a dizer agora é o oposto de tudo o que disse ao
longo da campanha”, perguntava o analista da CNN, Chris Cilliza. A resposta a
essa pergunta é fundamental para perceber as intervenções do Presidente e
prever as políticas da sua Administração: mais ortodoxa, mais centrista, mais
intervencionista…
Segundo o veterano repórter Mike Allen, a nova versão 2.0 do
Presidente “é o resultado do desejo instintivo de Donald Trump de declarar
vitória, depois de uma série de desaires” e também a confirmação da nova
dinâmica entre as duas facções instaladas na Casa Branca: são os moderados,
representados por Ivanka e o marido Jared Kushner, ou o conselheiro económico
Gary Cohn, que estão agora em ascendência, com o anterior guru da campanha, e
principal conselheiro da Casa Branca, Steve Bannon, a perder importância. “O
que estamos agora a ver é a manifestação da personalidade assente no improviso
do Presidente, que age com base em estímulos novos e imediatos”, interpretou um
dos muitos “oficiais” da Casa Branca que falam com os jornalistas sob
anonimato.
Ao lado do rei da Jordânia, no jardim da Casa Branca, Donald
Trump explicou que não é um dogmático mas um pragmático, e que “quando o mundo
muda, eu mudo com ele”. Poderia ser uma justificação, só que a nova postura do
Presidente não surge em reacção a nenhuma alteração significativa no tabuleiro
geopolítico – nada mudou na guerra da Síria, no funcionamento da NATO ou na
actividade económica da China para forçar o Presidente norte-americano a
contradizer tão dramaticamente as suas anteriores posições.
Alguns comentadores arriscam algumas explicações para a
mudança abrupta de Trump. Há quem diga que tem a ver a sua inexperiência e
impreparação, evidentes quando confessou a sua surpresa ao vislumbrar a
“tremenda complexidade” da reforma da saúde ou a ouvir as explicações de Xi
Jinping sobre o desafio da Coreia do Norte: “Ao fim de dez minutos percebi que
não é fácil.” Outros lembram que desde que Trump tomou posse, só conseguiu um
sucesso: a entrada do juiz Neil Gorsuch no Supremo Tribunal. Com a marca dos
cem dias a aproximar-se, e as sondagens a mostrar que Trump é o Presidente mais
impopular de sempre, a Administração precisa de assinar medidas que elevem o
seu estatuto de “vencedor”. E nada mais eficaz do que uma campanha militar
avassaladora para calar as críticas.
No entanto, o Presidente (que já registou a recandidatura)
corre um enorme risco ao desviar-se tanto do seu guião eleitoral, e que é
perder a boa-vontade da sua base de apoio – os eleitores e os legisladores do
Congresso. Como lembrava à Associated Press um consultor republicano que
aconselhou Donald Trump durante a campanha, os políticos que abandonam
rapidamente as suas promessas costumam pagar um custo pesado: a factura pode
chegar já no próximo ano, nas eleições intercalares para o Congresso.
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