Arrendamento. Oferta
desajustada à procura arrasta pessoas para as periferias
SÓNIA PERES PINTO
19/04/2017 07:05
Associação do setor
admite que os atuais preços praticados no mercado de arrendamento são
insustentáveis para a maioria dos portugueses e diz que, para rendas estarem a
valores aceitáveis, os proprietários têm de deixar de ser taxados da forma como
são
Os portugueses
procuram casas para arrendar na ordem dos 600 euros, bem longe da média de
oferta praticada no mercado nacional, cujos valores são praticamente o dobro e
que poderão até triplicar consoante a zona da cidade, principalmente se
estivermos a falar de Lisboa. Na capital, o valor médio de oferta está fixado
nos 1104 euros – ainda que haja zonas onde se praticam valores superiores, como
Parque das Nações ou a Baixa – para uma procura que se situa entre os 397 e os
600 euros. O cenário repete--se no Porto, que apresenta uma média de oferta de
1056 euros – com valores superiores no chamado triângulo dourado: Avenida dos
Aliados, Mouzinho da Silveira e Clérigos – para uma procura que varia entre os
260 e os 461 euros. Os números foram avançados ao i pelo presidente da APEMIP,
Luís Lima.
E os exemplos são
mais que muitos. Por um T2 em Lisboa que se arrendava normalmente por 700 euros
ao mês, os senhorios pedem agora 1200 ou 1300 euros. Esta realidade poderá ser
ainda pior se o contrato de arrendamento tiver uma cláusula que autorize o
subarrendamento. Daí que a oferta para arrendamento tradicional seja cada vez
mais escassa.
O responsável admite
que são os jovens os mais penalizados por esta inflação de preços que se tem
praticado nos últimos anos. “Se considerarmos o valor médio de oferta em Lisboa
ou no Porto, chegamos rapidamente à conclusão de que a maior parte dos jovens
portugueses não têm, de todo, condições para suportar rendas daquela dimensão,
sendo habitual juntarem-se em apartamentos, arrendando quartos. No entanto,
esta é uma situação que, por vezes, sai da esfera dos jovens para se estender a
pessoas adultas, e por vezes, em situações mais complexas, até a famílias”,
alerta.
Morar no centro é um
sonho Esta situação é também reconhecida pelas mediadoras que atuam no mercado
nacional. De acordo com o CEO da Century 21, Ricardo Sousa, os preços dos
imóveis que estão a ser praticados nas grandes cidades – tanto no arrendamento
como na compra – estão a empurrar os portugueses para a periferia. E dá
exemplos: o valor médio dos imóveis em venda na área metropolitana de Lisboa
está acima dos 250 mil euros, enquanto o valor médio da procura a que estão a
ser feitas transações ronda os 148 mil euros. “Está aqui um gap enorme, e isto
está a fazer com que se assista a uma deslocação das famílias para os mercados
periféricos da cidade, o que é visível em todo o território nacional. Se o
poder de compra não aumentou – até, pelo contrário, tem diminuído –, a sua
capacidade de compra ou de arrendamento mantém-se”, diz.
Esta tendência faz
com que uma pessoa que tenha apenas 500 euros para gastar num arrendamento ou
150 mil euros para a compra de casa vai ter obrigatoriamente de se afastar de
Lisboa ou do Porto e optar pelos mercados mais periféricos. “Arrendar uma casa
por 500 euros na cidade de Lisboa não passa de um sonho, não existe essa
oferta. O mesmo acontece no Porto. Precisamos de ir para Gaia, Maia, Odivelas,
Loures, etc.”, acrescenta o responsável.
Também Miguel
Poisson, diretor-geral da ERA Portugal, confirma esta tendência e explica que
esta crescente procura se iniciou sobretudo a partir de 2014, por um lado
devido à dificuldade — que já se vinha sentindo desde 2008 — em conseguir
crédito à habitação e, por outro lado, devido à oferta turística proporcionada
pelo fenómeno do alojamento local.
Esta falta de oferta
e valores muito elevados ganham ainda novos contornos quando falamos do mercado
de arrendamento, uma vez que tanto a construção nova com a da reabilitação se
destinam não só ao segmento de luxo, mas principalmente ao turismo, pois muitos
dos imóveis e edifícios que estavam destinados à utilização residencial têm
vindo a ser convertidos em alojamento local ou edifícios turísticos, como
hotéis e hostels.
“A oferta de
arrendamento acaba por diminuir substancialmente, o que faz com que os imóveis
que ainda tenham como destino o arrendamento tradicional apresentem valores
mais altos e inflacionados”, garante Ricardo Sousa.
Solução Perante este
desequilíbrio entre oferta e procura, a APEMIP tem vindo a monitorizar o
mercado de arrendamento e chegou a apresentar ao anterior governo estudos a
comprovarem essa discrepância não só entre os valores de oferta e de procura
como também na distribuição do stock disponível para arrendamento no mercado,
uma vez que há zonas em que a procura é superior à oferta, e outras, como Faro,
em que a oferta é superior à procura (oferta a rondar os 11% para uma procura
na ordem dos 2,1%).
De acordo com Luís
Lima, o valor atual das rendas é um dos principais entraves à dinamização do
arrendamento, uma vez que supera em muito o que se pagaria, por exemplo, pela
prestação do crédito à habitação. No entanto, para que as rendas possam estar a
valores aceitáveis, os proprietários têm de deixar de ser taxados da forma que
são, diz. “A fiscalidade sobre o imobiliário é brutal. Neste panorama, no
arrendamento, os senhorios são taxados pelo rendimento e pela posse. Os
impostos aplicados sobre quem coloca os seus imóveis no mercado, bem como a
falta de mecanismos que garantam a segurança de que os inquilinos cumprem com
as suas obrigações, fazem com que os preços sejam mais elevados do que o
suportável pelas famílias”, revela ao i.
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