Rui Moreira vê em Cavaco Silva
“dificuldade em interpretar as inquietações dos portugueses
Autarca do Porto repete que Rui Rio poderá ser um bom primeiro-ministro,
mas não agora
Patrícia Carvalho
/ 23 out 2014 / PÚBLICO.
O presidente da
Câmara do Porto, Rui Moreira, defende que é necessário “que se pense com muito
cuidado sobre qual o papel do Presidente da República no futuro”. Isto porque,
neste momento, afirmou ontem o autarca no Fórum da TSF, no dia em que celebrou
um ano de mandato, “até esse órgão de soberania é questionado pelos
portugueses”. Moreira poupou Passos Coelho e repetiu elogios comedidos a Rui
Rio, mas não disse nada de favorável sobre Cavaco Silva.
Moreira até
considerou que o Presidente “tem feito o seu melhor”, mas as coisas não estão a
correr bem. “O senhor Presidente da República tem tido alguma dificuldade em
interpretar as inquietações dos portugueses”, afirmou o autarca do Porto,
defendendo que a situação actual “é preocupante”. Tanto mais, disse, que a
Presidência da República parece ter caído de um patamar de credibilidade que
sempre conseguira manter. “Este era sempre um órgão de soberania
extraordinariamente respeitado pelos portugueses, e agora até esse órgão de
soberania é questionado pelos portugueses.”
O autarca foi
mais benevolente com o primeiro-ministro, defendendo que este tem tido “uma
tarefa muito difícil”. “Não julgo que seja legítimo pensar que os governantes
estão para fazerem mal”, afirmou, argumentando que Passos Coelho, no momento em
que chegou ao poder, foi confrontado com “uma equação [...] de um país em
situação de emergência”. O único erro que Moreira admitiu apontar ao governante
foi o de não ter feito, na altura, “um diagnóstico real aos portugueses”. “Estávamos
metidos num caldeirão infernal”, disse.
Em resposta ao
jornalista da TSF, Rui Moreira garantiu que o anterior presidente da Câmara do
Porto Rui Rio “não é um fantasma” que paira sobre a câmara e a cidade e repetiu
que este “tem condições para ser primeiro-ministro”. Mas, talvez influenciado
pelas últimas notícias, com Rui Rio a demarcar-se de qualquer movimento para a
realização de eleições primárias no PSD ou da preparação de uma eventual
candidatura à liderança do partido, Moreira afirmou: “Com os actuais
constrangimentos e no actual calendário político, não me parece que [a
candidatura de Rio] seja um cenário possível, mas quem sou eu para fazer
premonições sobre o futuro do doutor Rui Rio?”.
Aos portuenses,
deixou a garantia de que não irá abandonar a presidência da câmara – “eu não
sairei daqui para outro cargo, não terei qualquer papel na política nacional, a
nível partidário ou do Governo” – e não se mostrou preocupado com uma eventual
saída de António Costa da Câmara de Lisboa, considerando que, nesse caso, ele
será substituído por Fernando Medina, “um homem do Norte”, pelo que não antevê
qualquer problema de relacionamento com a autarquia da capital.
As quase duas
horas que Moreira esteve no ar a responder a perguntas do jornalista da TSF e dos
cidadãos chegaram ainda para fazer uma curta análise ao novo partido anunciado
por Marinho e Pinto, o Partido Democrático Republicano.
Recusando chamar
“populista” ao ex-bastonário da Ordem dos Advogados, o autarca considerou que o
novo partido “responde mais a uma inquietação da cidadania do que a uma
alternativa”, o que pode ser preocupante: “Se os cidadãos votam contra qualquer
coisa e não a favor, então a democracia está doente.”
Ditadura das tricas
Por Luís Osório
publicado em 23 Out 2014
in (jornal) i online
Rui Rio começa a perder o comboio por estar tão ansioso por apanhá-lo
A um ano das
legislativas, ou menos, se a pedido de várias famílias o Presidente as marcar
para antes das praias de Agosto, agitam-se os tabuleiros de jogo. Agora, tão
importante como as contas do país, é a sobrevivência política dos que antevêem
que provavelmente Passos perderá o lugar de primeiro-ministro.
Custou a chegar
ao poder. Não só ao líder do PSD como a vários dos seus fiéis que antes dele
não tinham tido a possibilidade de o saborear. Recordo que a vitória de Passos
foi criticada por elites que viam nos novos tempos sinais preocupantes de
decadência da qualidade da classe política. Distintas figuras torceram o nariz
e os novos protagonistas, sedentos de uma vingança de classe, ocuparam lugares
que antes lhes estavam interditos.
Não é uma
crítica. Antes acontecera no PS com Guterres ou Sócrates, ou no PSD com Cavaco.
Não é sequer um exclusivo português. A política é um campo aberto onde os
exércitos combatem por lugares, mediocridades, atenções e migalhas – de vez em
quando também por convicções.
O que não é o
caso. A notícia assinada hoje por Pedro Rainho no i mostra-nos que as peças no
PSD se começaram a movimentar para que as portas do palácio do poder não se
fechem se porventura forem penalizados em eleições. Uma injustiça, clamam. O
partido não pode virar as costas ao primeiro-ministro, seria uma traição, uma
cobardia, e por aí fora… É uma resposta a Rui Rio, que começa a perder o
comboio por tão ansioso estar por apanhá-lo. A disponibilidade para ser
vice-primeiro-ministro de António Costa é pragmática, mas o PSD é um partido
pragmático quando isso lhe garante a primeira ou única fatia do poder, não
quando tem de ficar com a metade do bolo que já não tem recheio.
É normal que as
tropas leais a Passos Coelho se posicionem no terreno para defender o líder, e
com isso defenderem-se a si próprias. A luta será feroz, muitos perderão os
nervos e a compostura pelo caminho, amigos deixarão de o ser, o trivial. Infelizmente
nestas coisas há sempre um senão: o país será prejudicado e entrará numa
ditadura de tricas.
Com barulheira e
dispersão as coisas nunca correm bem. Se tivéssemos duas bocas e apenas um
ouvido, seria uma prova do que a natureza de nós esperava: mais conversa e
menos escuta. Mas a providência fez-nos o favor de indicar o sentido. Ofereceu-nos
uma língua e duas orelhas, o que nos poupou a trabalhos, pois,
independentemente de leituras sagradas ou profanas, torna-se evidente que
devíamos privilegiar a escuta sobre o palavreado. Porém, somos especiais. Não
gostamos de coisas fáceis. Adoramos complicar e afastar-nos do que deveria ser
o centro das preocupações.
As tropas estão
então no terreno. De um lado os partidários de Passos, do outro os de Rio. Começaram
a ser tocados os tambores. Mas longe dos olhares há quem espere pelo início da
“mortandade” para surgir como alternativa vencedora. Se António Costa ganhar, o
PSD profundo quererá voltar a conspirar na oposição com um líder que não tenha
hostilizado Passos nem queira servir de bengala a António Costa, um líder de
transição.
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