quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Rui Moreira vê em Cavaco Silva “dificuldade em interpretar as inquietações dos portugueses. PÚBLICO. Ditadura das tricas Por Luís Osório / Jornal i


Rui Moreira vê em Cavaco Silva “dificuldade em interpretar as inquietações dos portugueses
Autarca do Porto repete que Rui Rio poderá ser um bom primeiro-ministro, mas não agora
Patrícia Carvalho / 23 out 2014 / PÚBLICO.

O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, defende que é necessário “que se pense com muito cuidado sobre qual o papel do Presidente da República no futuro”. Isto porque, neste momento, afirmou ontem o autarca no Fórum da TSF, no dia em que celebrou um ano de mandato, “até esse órgão de soberania é questionado pelos portugueses”. Moreira poupou Passos Coelho e repetiu elogios comedidos a Rui Rio, mas não disse nada de favorável sobre Cavaco Silva.
Moreira até considerou que o Presidente “tem feito o seu melhor”, mas as coisas não estão a correr bem. “O senhor Presidente da República tem tido alguma dificuldade em interpretar as inquietações dos portugueses”, afirmou o autarca do Porto, defendendo que a situação actual “é preocupante”. Tanto mais, disse, que a Presidência da República parece ter caído de um patamar de credibilidade que sempre conseguira manter. “Este era sempre um órgão de soberania extraordinariamente respeitado pelos portugueses, e agora até esse órgão de soberania é questionado pelos portugueses.”
O autarca foi mais benevolente com o primeiro-ministro, defendendo que este tem tido “uma tarefa muito difícil”. “Não julgo que seja legítimo pensar que os governantes estão para fazerem mal”, afirmou, argumentando que Passos Coelho, no momento em que chegou ao poder, foi confrontado com “uma equação [...] de um país em situação de emergência”. O único erro que Moreira admitiu apontar ao governante foi o de não ter feito, na altura, “um diagnóstico real aos portugueses”. “Estávamos metidos num caldeirão infernal”, disse.
Em resposta ao jornalista da TSF, Rui Moreira garantiu que o anterior presidente da Câmara do Porto Rui Rio “não é um fantasma” que paira sobre a câmara e a cidade e repetiu que este “tem condições para ser primeiro-ministro”. Mas, talvez influenciado pelas últimas notícias, com Rui Rio a demarcar-se de qualquer movimento para a realização de eleições primárias no PSD ou da preparação de uma eventual candidatura à liderança do partido, Moreira afirmou: “Com os actuais constrangimentos e no actual calendário político, não me parece que [a candidatura de Rio] seja um cenário possível, mas quem sou eu para fazer premonições sobre o futuro do doutor Rui Rio?”.
Aos portuenses, deixou a garantia de que não irá abandonar a presidência da câmara – “eu não sairei daqui para outro cargo, não terei qualquer papel na política nacional, a nível partidário ou do Governo” – e não se mostrou preocupado com uma eventual saída de António Costa da Câmara de Lisboa, considerando que, nesse caso, ele será substituído por Fernando Medina, “um homem do Norte”, pelo que não antevê qualquer problema de relacionamento com a autarquia da capital.
As quase duas horas que Moreira esteve no ar a responder a perguntas do jornalista da TSF e dos cidadãos chegaram ainda para fazer uma curta análise ao novo partido anunciado por Marinho e Pinto, o Partido Democrático Republicano.

Recusando chamar “populista” ao ex-bastonário da Ordem dos Advogados, o autarca considerou que o novo partido “responde mais a uma inquietação da cidadania do que a uma alternativa”, o que pode ser preocupante: “Se os cidadãos votam contra qualquer coisa e não a favor, então a democracia está doente.”


Ditadura das tricas
Por Luís Osório
publicado em 23 Out 2014 in (jornal) i online
Rui Rio começa a perder o comboio por estar tão ansioso por apanhá-lo

A um ano das legislativas, ou menos, se a pedido de várias famílias o Presidente as marcar para antes das praias de Agosto, agitam-se os tabuleiros de jogo. Agora, tão importante como as contas do país, é a sobrevivência política dos que antevêem que provavelmente Passos perderá o lugar de primeiro-ministro.

Custou a chegar ao poder. Não só ao líder do PSD como a vários dos seus fiéis que antes dele não tinham tido a possibilidade de o saborear. Recordo que a vitória de Passos foi criticada por elites que viam nos novos tempos sinais preocupantes de decadência da qualidade da classe política. Distintas figuras torceram o nariz e os novos protagonistas, sedentos de uma vingança de classe, ocuparam lugares que antes lhes estavam interditos.

Não é uma crítica. Antes acontecera no PS com Guterres ou Sócrates, ou no PSD com Cavaco. Não é sequer um exclusivo português. A política é um campo aberto onde os exércitos combatem por lugares, mediocridades, atenções e migalhas – de vez em quando também por convicções.

O que não é o caso. A notícia assinada hoje por Pedro Rainho no i mostra-nos que as peças no PSD se começaram a movimentar para que as portas do palácio do poder não se fechem se porventura forem penalizados em eleições. Uma injustiça, clamam. O partido não pode virar as costas ao primeiro-ministro, seria uma traição, uma cobardia, e por aí fora… É uma resposta a Rui Rio, que começa a perder o comboio por tão ansioso estar por apanhá-lo. A disponibilidade para ser vice-primeiro-ministro de António Costa é pragmática, mas o PSD é um partido pragmático quando isso lhe garante a primeira ou única fatia do poder, não quando tem de ficar com a metade do bolo que já não tem recheio.

É normal que as tropas leais a Passos Coelho se posicionem no terreno para defender o líder, e com isso defenderem-se a si próprias. A luta será feroz, muitos perderão os nervos e a compostura pelo caminho, amigos deixarão de o ser, o trivial. Infelizmente nestas coisas há sempre um senão: o país será prejudicado e entrará numa ditadura de tricas.

Com barulheira e dispersão as coisas nunca correm bem. Se tivéssemos duas bocas e apenas um ouvido, seria uma prova do que a natureza de nós esperava: mais conversa e menos escuta. Mas a providência fez-nos o favor de indicar o sentido. Ofereceu-nos uma língua e duas orelhas, o que nos poupou a trabalhos, pois, independentemente de leituras sagradas ou profanas, torna-se evidente que devíamos privilegiar a escuta sobre o palavreado. Porém, somos especiais. Não gostamos de coisas fáceis. Adoramos complicar e afastar-nos do que deveria ser o centro das preocupações.

As tropas estão então no terreno. De um lado os partidários de Passos, do outro os de Rio. Começaram a ser tocados os tambores. Mas longe dos olhares há quem espere pelo início da “mortandade” para surgir como alternativa vencedora. Se António Costa ganhar, o PSD profundo quererá voltar a conspirar na oposição com um líder que não tenha hostilizado Passos nem queira servir de bengala a António Costa, um líder de transição.

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