A triste história da PT
Por Luís Osório
publicado em 21 Out 2014
in (jornal) i online
O problema é a não existência de uma coluna vertebral, de uma
consciênciaética e moral
"Derrocada"
é uma palavra possível para definir o que aconteceu no último ano à PT. A
empresa-modelo, com gestores exemplares e um homem aparentemente tocado pela
divina genialidade (Zeinal Bava), passou para uma situação de tragédia para
accionistas, de incerteza para trabalhadores e incredulidade para a opinião pública.
Um naipe arrepiante, uma tempestade perfeita.
Entre quatro
paredes desenhou-se o futuro em duas casas que se julgavam à prova de bala.
Tanto o BES como a PT (e outras empresas que lhe poderão suceder), geridas e
administradas por profissionais com doutoramentos e MBA das melhores
universidades, gente estrangeirada, competitiva, inovadora e tudo o resto,
afinal eram estruturas sem qualquer identidade. Empresas que especularam com o
dinheiro de clientes e accionistas, gente que enriqueceu não em função de um
desígnio, mas em virtude do pior que tem este tempo muito virtual e nada
virtuoso.
É tema para um
outro dia, mas talvez esteja na altura de desconfiar um pouco quando ouvirmos
alguém dizer que na política devem estar os melhores, os excepcionais, os
preparados, as elites. Precisamente alguns dos que agora são as caras de uma
gestão catastrófica do BES ou da PT. O problema não é (nunca foi) a ausência de
pessoas preparadas na política ou a presença dos iluminados nas grandes
empresas - o problema é a não existência de uma coluna vertebral, de uma
consciência ética e moral em tantos dos que, na política ou nas empresas, são
líderes.
Um mundo virtual,
pois. Onde nada parece sólido e tudo é vapor. A começar na intimidade, onde os
divórcios superam os casamentos, e a acabar no dinheiro. Se dez pessoas pouco
mais que remediadas levantarem o seu dinheiro ao mesmo tempo na mesma
dependência bancária, será grande a probabilidade de não haver notas para lhes
entregar - há muito tempo que não temos dinheiro, apenas a informação de que o
temos. Não é uma nuance, é a essência dos tempos. Porque tudo o resto caminha
para aí. Nas novas guerras mata-se como num jogo de computador; caminhamos para
uma virtualidade onde a moral é vista como um arcaísmo.
Filipe Paiva Cardoso
dá números à derrocada. Quase 700 milhões de prejuízo para os accionistas
portugueses, um buraco de 53 milhões na segurança social e, ainda assim,
sabemo-lo de outros dias, cheques de indemnização e milhões depositados pelos
brasileiros da Oi na conta de Bava. Não será imoral?
Talvez hoje se
fuja da ética tanto como ontem ou na manhã anterior a todas as manhãs, não sei.
Mas a falta de seriedade é hoje um padrão, é aceite como uma circunstância e
quem faz por ser sério, em conversas de café ou de corredor, é visto como
alguém muito especial, um ingénuo que ainda acabará mal. Não é a política e os
políticos. É na política, nos táxis, em tribunais, bancos, esplanadas e lugares
onde existimos. É muitas vezes em nós, mesmo entre os muitos que permanecem
sérios, que cresce a dúvida: valerá a pena defender um mundo que não existe?
Vale, vale sempre. Mas será necessária coragem para tornar ilegal a imoralidade.
PT. Accionistas portugueses
perderam 673 milhões num ano
Por Filipe Paiva
Cardoso
publicado em 21
Out 2014 in
(jornal) i online
Portugueses que dominavam a PT perderam o controlo, os activos e 673
milhões de euros num ano. Segurança Social perdeu 53 milhões
Depois de semanas
a aguentarem-se graças aos rumores sobre novas aquisições ou fusões no sector
das telecomunicações do Brasil, as cotações da Oi e da Portugal Telecom
chocaram ontem com a realidade e ambas bateram no fundo. O que era uma fusão
para criar uma "megaoperadora luso-brasileira" virou uma absorção que
criou um "megapesadelo luso-brasileiro".
A saída de Zeinal
Bava - primeiro da PT e depois da Oi -, ajudada pela oficialização da
insolvência da Rioforte (ver texto ao lado), deram forma a este pesadelo: ontem
a PT chegou a desvalorizar 28,75%, com a acção a cair abaixo dos 87 cêntimos, o
valor mais baixo desde que a antiga operadora portuguesa entrou na bolsa, tendo
fechado a sessão nos 1,092 euros (-10%).
Este pesadelo
está a sentir-se com especial força deste lado do Atlântico: os accionistas
portugueses da PT, donos de 28,8% do capital, já perderam mais de 733 milhões
de euros desde que a Oi absorveu a PT e seus activos em Outubro de 2013 -
negócio que não envolveu qualquer contrapartida financeira. Em troca dos
activos da PT, os accionistas desta iriam receber 38% do capital da brasileira,
valor pouco depois revisto para 26%, punindo os accionistas da PT pelos
negócios dos Espírito Santo - já considerados irrecuperáveis pelos
investidores.
PREJUÍZO: 733
MILHÕES
Além do corte na fatia a que teriam direito na empresa que herdou o MEO
entre outros activos, os accionistas da PT foram igualmente penalizados pela
desvalorização constante das suas acções desde que a fusão avançou (ver
gráfico), há sensivelmente um ano. Se na altura cada título da PT era avaliado
em cerca de 3,7 euros, a hecatombe de ontem trouxe o preço de cada título para
um valor de 1,092 euros, ou seja, uma desvalorização na casa dos 70%.
Esta destruição
de valor significou assim para a totalidade dos accionistas da antiga empresa
portuguesa a perda de 2,33 mil milhões de euros: a PT valia 3,31 mil milhões em
Outubro de 2013 e ontem já só valia cerca de 980 milhões de euros. Fazendo as
contas apenas aos accionistas portugueses, donos de 28,8% da empresa, a
desvalorização das acções chegou aos 673,4 milhões de euros - dos quais 53,2
milhões foram perdas do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.
QUEM PERDEU
QUANTO?
Entre os accionistas portugueses da Portugal Telecom, as participações
mais significativas são do Novo Banco - que ficou com os 10% antes detidos pelo
BES -, a Ongoing, através da RS Holding, a Visabeira, o fundo da Segurança
Social e a Controlinveste.
As maiores perdas
foram registadas pelo Novo Banco e pela Ongoing, que viram os seus
investimentos na operadora desvalorizar 235 milhões de euros cada - os 10% que
cada uma detinha valiam 333,6 milhões de euros em Outubro de 2013 e, dada a
cotação de ontem, agora não valem sequer 100 milhões de euros. Estas duas
empresas perderam 470 milhões de euros nos últimos doze meses só com a Portugal
Telecom.
Já a Visabeira,
dona de 2,64% do capital da PT - empresa que actualmente tem em carteira apenas
a participação de 26% na Oi -, regista perdas de 61,7 milhões de euros. A esta
junta-se o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, que viu o
investimento de 2,28% do capital que detém na antiga operadora portuguesa
desvalorizar 53,3 milhões de euros desde Outubro de 2013. Perda idêntica é
imputada à Controlinveste, que também detém 2,28% do capital da PT.
REDUÇÃO NA OI :
117 MILHÕES
Além da desvalorização de 70% da PT desde a
aprovação da fusão, os accionistas da antiga empresa portuguesa também estão a
perder milhões de euros por outra via: a redução do peso que iam ter na nova
Oi.
Quando o negócio
entre a PT e a Oi foi aprovado, em Outubro de 2013, a brasileira estava
avaliada em cerca de 3,3 mil milhões de euros, tendo os accionistas da
operadora portuguesa trocado os activos da PT por uma fatia de 38% do capital
da empresa, que resultará da integração dos activos da PT na Oi. Porém, com o
buraco dos 897 milhões de euros emprestados (e não pagos) pela PT à Rioforte, a
fatia foi reduzida de 38% para 26%.
Assim, e
recorrendo à avaliação do mercado à Oi na altura da fusão - já que a nova
empresa nunca valerá menos que a Oi -, pode avaliar-se o custo da redução da
participação em cerca de 405 milhões - valor dos 12% a que os accionistas da PT
deixaram de ter direito. Deste valor, 117 milhões foram pagos pelos
investidores portugueses com 28,8% da PT.
Caso juntássemos
a redução da participação dos accionistas da Portugal Telecom na nova Oi à
desvalorização da acção da empresa fruto da fusão com a Oi e do calote do Grupo
Espírito Santo, as perdas totais dos investidores portugueses com a Oi podiam
ser calculadas em 788 milhões de euros - isto aceitando os 405 milhões de euros
de avaliação aos 12% de redução de participação.
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